O que se exige de um
juiz para ser promovido pelo presidente da República a ministro do Supremo
Tribunal Federal (STF)? Duas qualidades: reputação ilibada e apurado saber
jurídico. É o que pede a Constituição , e estamos conversados. Não. Conversados
não estamos. A reputação pode não ser tão ilibada e o saber , apenas razoável,
desde que o aspirante , digamos assim, seja um homem sensível.
ENTENDA-SE POR
sensível: capaz de atender vez por outra a favores de quem o nomeou. Ou dos que
o ajudaram a ser nomeado pedindo por ele junto ao presidente e aos seus
cupinchas. A verdade é esta: ninguém vira ministro sem contar com padrinhos
fortes. De graça, por seus belos olhos e cultura enciclopédica, vira não.
Esqueça. E é aqui que mora o perigo. Quero dizer: o problema.
COMO ESPERAR
independência de quem pediu favores para chegar a ministro e de quem deve
favores por ter chegado lá? Só há uma saída por ora: trair . De certa forma foi
o que ocorreu com alguns ministros nomeados por Lula e Dilma. Lula queria ver
os mensaleiros livres. Acabaram condenados. O advogado Antônio Carlos de Almeida
Castro, o Kakay, revelou que Joaquim Barbosa pediu a José Dirceu para reforçar
suas chances de ser ministro.
NÃO SE SABE se foi
atendido. Joaquim acabou sendo impiedoso com Dirceu e a parcela maior dos réus
do mensalão. Procedeu de acordo com sua consciência. Conforme as provas que
enxergou no processo. Existe a favor de Joaquim o fato de ele ter ido parar no
STF dois anos antes de o mensalão sacudir a República. Até então Lula parecia
mais interessado em pôr um negro no STF do que em se acautelar contra
escândalos e condenações futuras dos seus parceiros. Outros ministros chegaram
lá depois de Joaquim. E aí...
TUDO COSTUMA ser
muito delicado. Nada é dito de maneira direta. Pessoas próximas do presidente,
sem nunca sugerirem que falam em nome dele, sondam as opiniões dos candidatos a
ministro. Alguns assuntos preocupam o governo e podem lhe causar sérios
embaraços. Dependendo das respostas dos candidatos...
“DEIXA COMIGO que eu
mato no peito e chuto”, prometeu Luiz Fux ao ouvir de gente ligada a Lula
notícias da aflição dele com o julgamento do mensalão. Fux ainda não era
ministro. Pela terceira vez, estava em campanha para ser . Pedia socorro a
políticos de todas as cores — Maluf, Delfim Netto, Antonio Palocci, Dirceu e
Stédile, coordenador dos Sem Terra.
“MATO NO PEITO e
chuto” não significava necessariamente que Fux absolveria os mensaleiros se os
julgasse. Mas seus interlocutores entenderam que sim. E é bastante razoável
pensar que Fux cometeu a frase para que ela de fato assim fosse entendida. “Eu
não conhecia o processo. Ele tinha provas suficientes para condenar os réus”,
explicou-se depois.
A INTUIÇÃO DE Lula
acendeu a luz vermelha. “Como posso nomear um candidato apoiado ao mesmo tempo
por Delfim e Stédile, pessoas tão diferentes?” , perguntou Lula. E não nomeou.
Dilma nomeou. E ao comparecer à posse de Joaquim Barbosa como presidente do STF
, nem sequer olhou para Fux. Tolice! Fux tem quem olhe para ele no calçadão de
Ipanema.
HÁ PROPOSTAS EM
tramitação no Senado para mudar a maneira de escolha de ministros dos tribunais
superiores e torná-la menos contaminada pelos interesses do governo e dos
políticos. Difícil que prosperem. Não servem para o governo. Nem para os
políticos que aprovam as nomeações na esperança de colher favores futuros.
Fonte: O Globo
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