Herman Hesse foi, talvez, o grande escritor da minha mocidade. Aquele que eu mais gostava de ler. Sentia que sua literatura aproximava os homens, trabalhava para compor uma Humanidade mais sadia.
Eu não apreciava os livros de Herman Hesse tanto pelo conteúdo filosófico deles: seus textos me encantavam muito mais pelo vigoroso sopro estético que emanava de suas páginas.
Eu até hoje penso que a força da sua obra - ficcional ou não - repousa na qualidade estética de sua narrativa. Eu me recordo
bem que, aos 16 anos, meu pai me dera Sidarta para ler. Fiquei imediatamente fascinado pelo livro. Contudo, eu me lembro de ter feito alguns reparos ao excessivo idealismo filosófico de Hesse. Uma ousadia da minha parte, sem dúvida. De qualquer forma, meus comentários surpreenderam meu velho pai. E provavelmente a mim mesmo...Ou seja, a leitura de Sidarta representou um divisor de águas: eu me tornei, a partir daquele momento, um leitor um pouco mais consciente, tendendo a separar, desde então, o caráter das ideias expostas por um escritor da forma como essas mesmas ideias eram anunciadas por ele no texto. Ainda que isso não estivesse tão claro para mim naquela época quanto o está hoje.
O contato com outras obras de Hermannn Hesse reforçou isso em mim. Vale dizer, seus escritos me seduziam pela beleza do relato. O livro Caminhada, por exempo, eu li cinco ou seis vezes - e nunca me canso de admirar as descrições impactantes que o narrador-andarilho faz das paisagens alpinas e de seus camponeses, esses homens forçosamente fixados ao solo. Há nesse livro uma serenidade e - como dizer? – um intimismo quase objetivo verdadeiramente desconcertante. Uma visão de mundo que podemos encontrar ainda nos papéis memorialísticos do Autor, como Vivências e Minha vida. São obras transbordantes de humanismo e cultura, nos quais Hesse busca, de forma obsessiva, até, ligar o Ocidente ao Oriente, à maneira de um Paul Gauguin. Pacifista, homem forjado pelos ideais socialistas durante a juventude, Hermann Hesse encarava a História como um processo passível de unificação um dia. E não estava equivocado em sua busca. Afinal, o ser humano é um só.
A chave para se entender a obra de Hermann Hesse está dada, paradoxalmente, de forma clara em seus incontáveis e esplêndidos escritos. A vida interior do Autor foi tão rica quanto sua experiência exterior. Ambas, as vidas, interagem dialeticamente. Advém daí sua imensa riqueza literária, eu penso. Ou seja, escritor e homem se completam. Daí também Hermann Hesse seguir sendo também o grande escritor da minha maturidade.
Um amigo que sempre esteve a meu lado - embora eu nunca o tenha visto.
* Ivan Alves Filho é historiador e jornalista.
Um comentário:
Beleza de análise e depoimento. Deu vontade de reler Hesse e ler esses outros livros que você menciona. Parabéns, Ivan
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