Primeiro, o Mais Médicos. Agora, a destinação dos royalties para educação e saúde. Aos poucos, a presidente Dilma Rousseff e sua equipe vão formatando o discurso que ela levará aos palanques daqui a nove meses, quando a condição de candidata será oficial. Alguns políticos que estiveram ontem no Planalto atentos aos discursos proferidos perante a plateia de estudantes e professores não tiveram dúvidas quando ouviram o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, dizer que a "bandeira (dos royalties para educação) era da senhora" presidente da República. Esse tema, assim como o do Programa Mais Médicos, será trabalhado para apresentação no ano que vem pelo marqueteiro João Santana.
Quando ouviram as referências de Mercadante, alguns parlamentares se remexeram na cadeira. Mais tarde, diriam à boca pequena que foi um exagero a colocação do ministro, uma vez que os movimentos sociais reivindicavam os royalties para educação desde que o projeto foi encaminhado ao Congresso, em 2009, pelo então presidente Lula. Naquela época, a distribuição estava mais equilibrada entre essas duas áreas, além de ciência e tecnologia. O governo encampou a ideia e agora Dilma, quer queira ou não, ganhou um emblema eleitoral.
A atitude de incorporar emblemas de gestão à pré-campanha não é privilégio de Dilma. Em 2002, José Serra agiu da mesma forma, ao incorporar os medicamentos genéricos ao portfólio eleitoral. É normal. O que não dá é para ficar com todos os louros para si. E, se tem algo difícil de encontrar na política, é alguma excelência disposta a exercer a generosidade de dividir as vitórias. Invariavelmente, quando algo dá certo, foi o presidente que fez e ponto. O PT é assim, o PSDB, muitas vezes, quando podia, agia assim.
Ontem, entretanto, Dilma inovou nesse quesito. Pediu licença ao líder do governo, Arlindo Chinaglia, para cumprimentar primeiramente o líder do PDT, André Figueiredo, do Ceará, relator da proposta de distribuição dos royalties para educação e saúde. Dilma há tempos não se desdobrava em agradecimentos a um parlamentar. E há um ditado que diz que, quando a esmola é demais, pobre desconfia. Pois muitos políticos saíram desconfiados diante de tantos elogios. Ficou para muitos aquela sensação de "aí tem".
Vale lembrar que não foram poucas as vezes em que o governo tirou ou vetou um projeto de lei dos parlamentares para, em seguida, colocar um de sua autoria em discussão. Foi assim, por exemplo, com a isenção de impostos sobre itens que compõem a cesta básica. O PSDB havia apresentado uma proposta nesse sentido, a presidente vetou e, depois, em 8 de março, anunciou em cadeia nacional de rádio e tevê um projeto do governo com esse teor.
Os elogios e a generosidade de dividir a aprovação dos royalties do petróleo para saúde e educação com o relator do texto, deputado André Figueiredo, têm agora objetivos que vão muito além da simples gratidão por parte da presidente. A ordem entre os petistas é de tentar manter todos os aliados empenhados na eleição da presidente Dilma Rousseff no ano que vem. E os pedetistas ameaçam seguir outros caminhos. Os senadores Pedro Taques (MT) e Cristovam Buarque (DF), por exemplo, não são propriamente os maiores cabos eleitorais de Dilma. Portanto, é preciso fazer o "balanceamento" do PDT, segurando outros aliados no partido.
Enquanto isso, nos partidos...
Em conversas reservadas, há quem diga que elogios a políticos da base não são suficientes para garantir apoios. O que os deputados querem mesmo, na hora da campanha, é a emenda individual liberada para que o prefeito fique grato e não troque de parlamentar. Os partidos, em maioria, vão querer negociar palanques estaduais para, assim, fechar o apoio a Dilma. Ou seja, não adianta a presidente ser generosa. Os aliados querem é generosidade do PT. Os petistas, por sua vez, estão enfurnados no processo de renovação do diretório e, até novembro, não têm condições de garantir nada a ninguém. A esperança de muitos é a de que não seja tarde demais quando forem sentar à mesa para discutir seriamente os palanques.
Quanto ao discurso sobre o Mais Médicos e os royalties para educação e saúde, a visão geral dos aliados é a de que Dilma acertou ao escolher esses temas para nortear o discurso de redução das desigualdades. Afinal, ficará difícil para a oposição bater no caso dos médicos, porque pode soar como a defesa de uma categoria enquanto 700 municípios brasileiros hoje não têm esses profissionais entre os moradores. No caos dos royalties, afinal, vai ficar a briga sobre a paternidade do projeto. E a história mostra que, nesse quesito, o governo sempre leva a melhor. Afinal, Lula pegou os programas de distribuição de renda do governo de Fernando Henrique Cardoso, juntou todos no Bolsa Família e hoje não adianta a tucanada dizer que eles são os pais da criança. Parece que, até aí, vale a sabedoria popular: pai é quem cria. Cabe à oposição agora criar o próprio discurso e as respectivas bandeiras. As de Dilma estão postas.
Fonte: Correio Braziliense
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