Ditadura ainda polariza chilenos e eleição presidencial opõe filha de general fiel a SalvadorAllende a filha de general fiel a Augusto Pinochet
O passado e o presente voltam a movimentar a vida chilena, por dois fortes motivos: os 40 anos, amanhã, do golpe que derrubou o presidente socialista Salvador Allende e marcou o início da ditadura do general Augusto Pinochet; e a campanha para as eleições presidenciais de novembro que reúnem, pela situação, a ex-presidente de centro-esquerda Michelle Bachelet, favorita, e, pela oposição conservadora, a ex-ministra do Trabalho Evelyn Matthei.
O Chile caminha, aperfeiçoa as instituições, se desenvolve, melhora as condições de vida da população, mas ainda se confronta com as consequências da violenta ditadura de Pinochet, em que mais de 3 mil pessoas desapareceram — presumivelmente mortas pelos militares — e milhares foram torturadas e perseguidas.
O país se beneficiou por terem os governos posteriores ao de Pinochet mantido as linhas gerais da política econômica liberalizante iniciada nos “anos de chumbo”. Quem vencer as eleições se tornará o sexto presidente após a redemocratização, iniciada em 1990. Os cinco primeiros pertenceram à Concertação, grande aliança de partidos de centro-esquerda e centro-direita que iniciou a delicada transição política. O atual, Sebastián Piñera, rico empresário, trabalhou no governo Pinochet e concorreu pelo partido Renovação Nacional (RN), tornando-se o primeiro presidente de direita eleito democraticamente desde 1958, e o primeiro desde o fim da era Pinochet. Hoje, não tem partido. Ele sucedeu a Michelle Bachelet.
Com a redemocratização, a sociedade civil começou sua luta para levantar os crimes da ditadura, localizar corpos dos desaparecidos e levar os culpados à Justiça, num processo lento e penoso, mas conduzido pelas autoridades de forma a evitar turbulências que pudessem pôr em risco a volta ao estado de direito. Mas, 40 anos depois, o Chile ainda tem muitos esqueletos no armário. Nos últimos dias, numa espécie de expiação, vários personagens importantes da vida do país iniciaram um mea-culpa, como o senador Hernán Larraín, da UDI: “Peço perdão pelo que tenha feito ou por ter me omitido do que devia fazer”, referindo-se à sua atuação durante a ditadura. A própria Corte Suprema de Justiça reconheceu publicamente a “omissão de responsabilidades” naquele período. A ebulição não deverá cessar no período que antecede as eleições, pois a política colocou como rivais Michelle Bachelet, filha de Alberto Bachelet, um general da Aeronáutica fiel a Allende e morto em 1974 (a própria Michelle foi sequestrada, presa e torturada); e Evelyn Matthei, filha do general da mesma arma Fernando Matthei, fiel a Pinochet e suspeito de ser responsável pelo assassinato do ex-colega. Michelle é favorita.
O confronto político-eleitoral entre descendentes de protagonistas, em posições díspares, da ruptura institucional de quatro décadas atrás serve para ajudar na consolidação da democracia no Chile e da tolerância entre opostos, marca deste regime.
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