segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Texto atual é 39% maior do que o aprovado em 88

Crescente Pesquisa mostra que 718 dispositivos foram incluídos e 80 retirados da versão original; última mudança ocorreu em junho deste ano

Por Tatiana Farah - Enviado especial

ÁGUAS DE LINDOIA (SP) - A Constituição chega aos 25 anos 39% maior do que quando foi promulgada, em 1988. Levantamento obtido pelo GLOBO revela que, desde a primeira emenda constitucional, em 1992, até a Emenda 73, de junho passado, foram acrescidos 718 dispositivos e retirados 80 do texto original, que já contava com 1.627 dispositivos. O saldo, de 638 dispositivos, mostra como a Carta não para de crescer.

O estudo foi realizado pelos cientistas políticos Cláudio Couto (FGV) e Rogério Arantes (USP). O documento e suas emendas foram esquadrinhados e divididos em dispositivos, uma unidade de medida, para apontar o crescimento e o perfil da Constituição. O trabalho recebeu prêmios no Brasil e no exterior e foi atualizado com as últimas emendas para O GLOBO.

— Não há dúvida de que temos uma Constituinte permanente. E isso ajuda a explicar como ela se tornou longeva — diz Couto, lembrando que o país já teve outras seis Constituições e só duas no regime democrático: a de 1946 durou apenas 18 anos.

Segundo os pesquisadores, o modelo da Constituição brasileira é marcado por dispositivos que versam sobre políticas públicas e esta é a principal explicação para que ela seja permanentemente modificada. Pela pesquisa, 30% dos dispositivos da Constituição de 88 tratam dessas políticas. Assim, a Carta é uma “grande lei ordinária do país", segundo os especialistas.

— Há um estudo que mostra um censo de todas as Constituições que vigoraram no mundo. Fizeram uma análise epidemiológica constatando que a mediana de vida de uma Constituição é de 19 anos. Então, há motivos para comemorar, porque já ultrapassamos isso. Eles analisaram ainda quais fatores explicam a longevidade e os fatores são os que temos no Brasil: uma Constituição extensa e detalhada, relativamente fácil de mudar e inclusiva, no sentido de atrair os atores a participar de sua própria reelaboração — explica Arantes.

Ele frisa que a Constituição dos Estados Unidos, que vigora desde 1787, com apenas 27 artigos, é um caso à parte:

— A Constituição americana é uma exceção até lá. Lá, quando se vai para o nível estadual, as mais duradouras são as mais prolixas. As mais parecidas com a Constituição Federal americana não duraram. Por isso, ela é completamente atípica, mesmo comparada com os outros países — explica Couto.

Ele cita ainda efeitos da Constituição no sistema político. Para Couto, uma das razões das coalizões serem maiores, desde o governo Fernando Henrique, é garantir a mobilização do Congresso em torno das emendas de interesse do governo. Por seu caráter majoritariamente de políticas públicas, que versam do sistema de Saúde ao uso de precatórios, os governos se empenham para adequar a Carta a seus projetos.

Segundo os pesquisadores, apesar das incessantes propostas de emenda constitucional no Congresso, a Constituição não foi desfigurada no que diz respeito à garantia de direitos.

— Os direitos não ficam sob risco. Se olharmos historicamente, entre todas essas emendas, nenhuma diminuiu direitos. Mesmo a da Previdência Social, que é muito mais de ajuste contábil. Ela é considerada Constituição Cidadã porque já nasceu criando direitos.

Com uma Constituição que não para de crescer, e que tem facilidade de ser modificada, eles consideram a proposta do ex-presidente Lula e do PT de uma Constituinte exclusiva para a reforma política “fadada ao fracasso”:

— Os atores envolvidos têm muito receio de embarcar nessa ideia porque, na medida em que você instala uma Constituinte, não só o tema específico como os outros poderão ser objeto de revisão e negociação. O custo pode ser muito alto dado o risco de tudo ser revisto — diz Arantes.

*A repórter viajou a convite da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs)

Fonte: O Globo

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