- O Estado de S. Paulo
Quis o acaso que as coisas acontecessem no mesmo dia: a apresentação do inócuo relatório da CPI Mista da Petrobrás, de autoria do deputado petista Marco Maia, e o discurso do ex-presidente Lula em encontro do partido conclamando a militância a reagir contra a "pecha de corrupto que querem incutir (sic) na nossa testa".
Uma injustiça, pois, segundo disse aos companheiros, deve-se aos governos do PT a criação de "todos" os instrumentos existentes no País de combate à corrupção. Inclusive, falou com todas as letras, o instituto da delação premiada. Faltou acrescentar o Poder Judiciário, a Polícia Federal, o Ministério Público, o Tribunal de Contas e o Código Penal.
Sim, porque foi graças a esses "instrumentos" que ontem foram denunciados os primeiros 35 suspeitos de participação do esquema de corrupção na Petrobrás. Se dependesse das investigações no âmbito do Congresso, da influência do governo sobre os aliados e da orientação do ex-presidente Lula aos parlamentares do partido para que se lembrassem do mensalão e não deixassem a CPI prosperar, os crimes continuariam impunes.
Então não será por essa inverossímil linha de defesa que o PT conseguirá sair da sinuca em que se encontra. Em seu discurso de 45 minutos, o ex-presidente ensaiou autocrítica ao reconhecer que o partido cresceu e enveredou por caminhos erráticos; ao mesmo tempo, porém, continuou na mesma linha de não falar a respeito de quais erros foram esses e seguiu atribuindo os problemas do PT às elites, aos tucanos e à imprensa.
Convidou o partido a repensar seu papel na sociedade, lembrando como "era gostoso" o tempo em que o PT não "tinha tanto voto, mas andava de cabeça erguida". Reclamou da ausência dos jovens, dos intelectuais, das campanhas eleitorais criativas sem gastos milionários. "Nós não nascemos para isso", constatou.
Ressaltou, no entanto, que não propunha uma "volta às origens". Aliás, não propôs nada: nem rever as práticas e as alianças que afastaram tanta gente do PT, deram muitos votos e deixaram o partido de cabeça baixa, tampouco pronunciou uma palavra sobre a hipótese da opção por um marketing menos opulento. Disse e se contradisse o tempo todo.
A certa altura deu um aviso: "Quem não quiser cumprir o ritual ético nesse partido é melhor deixar o PT". Não explicou qual é o ritual e quando entrou em vigor, antes ou depois da prisão da antiga cúpula, ainda filiada ao partido.
Lula falou em "construir sonhos e utopias", fez mais uma de suas animações de auditório numa hora em que a necessidade é de soluções para problemas concretos e de uma resposta à pergunta que antigamente a militância fazia ao "comando" na esquerda: Qual é o rumo?
Autocombustão. Para quem anda rodeada de adversidades, a presidente Dilma Rousseff está comprando brigas demais e atraindo aliados de menos.
Não bastasse, ainda queima o filme do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, um auxiliar que na área política poderia lhe ser muito útil por ser mais jeitoso, ter mais crédito e trânsito no Congresso que Aloizio Mercadante, seu conselheiro predileto.
Por três vezes em menos de uma semana a presidente determinou que seu ministro se desviasse de suas funções e fosse para o front fazer a guerra: primeiro, rebatendo a afirmação de um executivo de empreiteira de que parte de propina de contratos da Petrobrás havia sido "esquentada" em forma de doação legal para o PT; depois, defendendo a legalidade das contas de campanha junto ao TSE; por último, confrontando o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Feliz ano-novo. Retiro-me por uns dias das atribulações da República. De volta em 2 de janeiro, comentando a nova posse da presidente no dia 1º.
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