• Escândalo da estatal contamina a economia
- Valor Econômico
A interminável avalanche de denúncias de corrupção na Petrobras está contaminando a economia. Fontes qualificadas identificam estreitamento do mercado internacional de bônus para empresas brasileiras - " o refinanciamento de bônus está ficando apertado", disse ontem um alto executivo da área financeira.
Os fornecedores da companhia estatal - a maior contratante do país - estão estrangulados por atrasos de pagamentos e falta de horizonte sobre como estará a empresa no futuro. A indústria naval está comprometida, assim como os 220 mil postos de trabalho criados para atender às encomendas da estatal. Mesmo os bancos públicos estão regrando o crédito para os fornecedores da empresa. O destino das grandes empreiteiras está indefinido. As que tomaram recursos externos podem ser penalizadas com cláusulas de antecipação de pagamento.
Usada para financiar partidos políticos, num amplo esquema de corrupção, e para conter a inflação, a Petrobras enfrenta dificuldades de caixa. A dívida de mais de US$ 110 bilhões corresponde a quase 1/3 das reservas cambiais do país. O programa de investimentos da estatal é incompatível com a disponibilidade de recursos. E, agora, o preço internacional do petróleo despenca. Hoje, sai o balanço não auditado do terceiro trimestre, o primeiro sob a mira da Operação Lava-Jato.
O estado de hemorragia em praça pública da empresa que um dia foi motivo de orgulho nacional não encontra, no governo, respostas à altura. Os desdobramentos do caso ultrapassaram as fronteiras do país. Não há uma estratégia de contenção de danos. A paralisia do Executivo diante do escândalo é inexplicável.
Tal como um restaurante que serviu um prato com um inseto kafkiano precisa demitir os cozinheiros e comunicar à clientela que a casa está sob nova gerência, resta ao acionista controlador da Petrobras, a União, trocar a diretoria da empresa como o primeiro passo para recuperar credibilidade.
Um importante financiador de projetos no setor público e privado, ao traçar a comparação acima, ressalva que não se trata de prejulgar a presidente da Petrobras, Graça Foster, mas de reconhecer que a atual direção "perdeu as condições de conduzir a empresa estatal". A Petrobras precisa recuperar a capacidade de se defender. Para isso, demanda uma liderança que hoje não tem. Ou, como expressou uma outra fonte próxima de Dilma Rousseff: " Tem que ser feito um tumor de fixação (processo que reúne as células doentes para serem extirpadas do organismo)", separando a parte podre da parte saudável da estatal.
Isso foi dito de forma clara e contundente pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em discurso na Conferência Internacional de Combate à Corrupção, esta semana, em Brasília. "Esperam-se as reformulações cabíveis, inclusive, sem expiar ou imputar previamente culpa, a eventual substituição de sua diretoria (...)".
Na mesma hora, Dilma encomendou ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que estava no evento, uma resposta. "Não há razão objetiva para que atuais diretores da Petrobras sejam afastados", disse o ministro. "Não há nenhuma suspeita sobre essas pessoas. É injusto (...)", completou o ministro, em nome do governo.
Em um tema de tal gravidade e dimensão, não cabe colocar a amizade de Dilma e Graça Foster à frente dos interesses do país, comentou um interlocutor da presidente da República. "Isso está indo longe demais. A Petrobras vai ter um problema sério de financiamento, vai tomar uma multa gigantesca da SEC [Securities and Exchange Commission] americana, vai ter que indenizar os acionistas minoritários. E os funcionários da empresa estão descobrindo que o seu fundo de pensão, o Petros, está carregado de ações da estatal que se desvalorizam diariamente", alertou. O risco é de tudo isso cair no colo do Tesouro Nacional, que já está frágil.
O escândalo e seus desdobramentos estão tirando o sono do ex-presidente Lula. Ele não esconde a preocupação com os rumos que o caso está tomando e tem procurado se informar sobre a situação. Há poucos meses Lula enviou emissários para conversar com Renato Duque, Sérgio Gabrielli e Joao Vaccari. Ele queria saber se algum deles - o diretor, o ex-presidente da companhia e o tesoureiro do PT, respectivamente - teriam recebido dinheiro da corrupção em contas no exterior. Todos negaram. Após a prisão de Duque, foi noticiado que ele mantém conta na Suíça.
Lula também está com dificuldade de compreender o imobilismo da presidente Dilma Rousseff diante da evolução do caso. Nos dois dias em que ficou em Brasília, esta semana, o ex-presidente ouviu muitas queixas de senadores, deputados, ministros e ex-ministros, em relação ao novo governo na condução da política e no caso Petrobras.
A ele foi dito que o Palácio do Planalto precisa de um "gabinete de crise" para dar respostas rápidas às questões da Petrobras, que a diretoria da estatal já deveria ter sido trocada e que esse tema não pode ser tratado como questão pessoal entre Dilma e a presidente da companhia. O que está em jogo é um patrimônio do país e, quanto a Graça, ela já foi chamuscada pelo escândalo, disseram os aliados a Lula.
A conta começou a chegar. A dívida de R$ 9 bilhões da Eletrobras com a Petrobras é um esqueleto que surgiu por força da dramática situação da estatal. A operação que está em discussão no governo seria uma dívida a ser securitizada com garantia da União. A pergunta que fica é se esse é um primeiro passo para reequilibrar o setor elétrico e fazer com que a CDE deixe de ser um encargo do Tesouro Nacional e volte a ser o que era: uma conta a ser paga pelo consumidor. Seria importante o governo aproveitar o imbróglio e encaminhar a questão dando sinal claro de que não cabe ao Tesouro assumir mais despesas. Caso contrário, o objetivo de estabilizar a dívida pública será apenas um discurso.
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