sábado, 7 de fevereiro de 2015

No Banco do Brasil, um fiel escudeiro do Palácio do Planalto

• À frente do maior banco da América Latina, Bendine seguiu recomendações do governo federal e não se importou com críticas

Murilo Rodrigues Alves - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O engenheiro Ivan de Souza Monteiro costuma seguir um ritual antes de qualquer apresentação que faça em público: fica sozinho por alguns minutos, em silêncio, não atende telefone, não responde e-mail nem mensagens. Aqueles que trabalham com ele dizem que ele faz isso porque é tímido e fica nervoso. Mas quem o assiste não pode imaginar que haja ali qualquer traço de insegurança. É bem verdade, no entanto, que ele é mais seguro e falante nas rodas que se formam depois dos eventos.

Como vice-presidente de Gestão Financeira e Relações com Investidores do Banco do Brasil, Monteiro sempre se mostrou firme. É considerado um excelente e competente executivo por seus pares no mercado financeiro e também por boa parte de seus colegas de banco. Tem crédito perante investidores.

Assim como Aldemir Bendine, que agora assume a presidência da Petrobrás, Monteiro é considerado um executivo de carreira, que tem certo trânsito político que possibilitou a ele galgar postos no BB. Entrou no banco pela agência de Santa Rita de Sapucaí, em Minas Gerais, ainda na década de 80. Nos anos 2000, teve passagens pelas filiais de Nova York e Lisboa, onde foi gerente. Chegou a diretor comercial em maio de 2009 e poucos meses depois assumiu a vice-presidência, onde esteve até esta sexta-feira, 6.

Diferentemente de Bendine, Monteiro é considerado mais técnico que político. Sua origem é a "turma do banco" no Rio de Janeiro, onde viveu quase toda sua vida apesar de ter nascido em Manaus e ter feito faculdade em Minas.

Teria uma ligação natural com o PMDB, segundo afirmam algumas fontes. Como diz um ex-colega, "ele nunca foi ligado à esquerda". "Tem um estilo Levy", em referência ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, considerado um neoliberal pelos petistas.

Mas mesmo que seja visto com esse perfil a la "Chicago Boy", Monteiro sempre buscou durante entrevistas coletivas, quando apresentava resultados do BB, ou mesmo nas teleconferências com investidores, ter uma resposta cuidadosa para qualquer questão que pudesse afrontar políticas de governo. Nunca se esquivou de perguntas, apesar de não necessariamente responder o que lhe era perguntado.

Na última coletiva, depois da apresentação do balanço, foi provocado sobre se o aumento das provisões para perdas de devedores duvidosos naquele trimestre teria sido em razão dos empréstimos a Val Marchiori, a socialite amiga de Bendine que recebeu R$ 2,7 milhões. Sem titubear, respondeu: "Esse assunto é com ele", apontando para o assessor de imprensa e se retirando imediatamente do recinto.

O governo considera que a recepção negativa com o nome de Aldemir Bendine para a presidência da Petrobrás não pode ser considerada o melhor parâmetro para medir o sucesso do executivo à frente da estatal. A equipe de Dilma Rousseff lembra que a queda de 6,94% das ações preferenciais da companhia, que são as mais negociadas, ontem, foi menor do que o impacto nas ações do Banco do Brasil quando Bendine foi anunciado como presidente da instituição financeira - em 8 de abril de 2009, as ações do BB despencaram 8,15%.

Há quase seis anos, Bendine foi escolhido pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para comandar o BB com a condição de seguir à risca uma espécie de contrato de gestão: ampliar a participação do banco no mercado de crédito, oferecer melhores condições de empréstimo e ser mais agressivo com a concorrência. O ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, também determinou que ele orientasse o setor de seguros, área em que o BB estava atrás dos concorrentes. Seu antecessor, Antonio Francisco de Lima Neto, não seguiu a cartilha do Planalto e foi retirado do cargo.

À frente do BB, Bendine seguiu todas as recomendações do governo federal e não se importou com críticas de que o banco, sob sua gestão, se tornou um braço do governo na aplicação da política econômica. "Eu resgatei um pouco esse papel do Banco do Brasil enquanto agente de desenvolvimento econômico e social. Queria dizer: ele tem um papel de governo, de fato", disse, em entrevista ao Estado em agosto de 2013.

Ele deixa o comando do maior banco da América Latina, com volume de ativos que ultrapassa a marca de R$ 1,3 trilhão. O BB aumentou a participação no mercado em meio à retração dos bancos privados. Pelos dados mais atualizados - do 3.º trimestre do ano passado -, o BB tem a maior carteira de crédito entre as instituições financeiras brasileiras, correspondente a 21,1% do mercado de crédito nacional. É maior banco da América Latina, com mais de 100 mil funcionários e mais de 60 milhões de clientes.

Office-boy. Bendine nasceu em 1963 em Paraguaçu Paulista (SP). Graduado em administração de empresas, ingressou no BB em 1978, com 14 anos, como office-boy. Antes de assumir a presidência da instituição, era vice-presidente de Cartões e Novos Negócios de Varejo.

O novo presidente da Petrobrás tem laços políticos com o PT, apesar de não ser filiado à sigla. Entre seus padrinhos, está o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, que fez carreira no sindicalismo bancário. O Palácio do Planalto, ainda com Lula, colocou Bendine à frente do BB para influenciar mais diretamente as decisões da instituição pública com o objetivo de minimizar efeitos da crise econômica. Em 2012, quando o governo iniciou uma cruzada contra o alto custo do crédito no País, o BB foi o primeiro banco a ver espaço para reduzir os juros e as taxas bancárias, sendo seguido, pelos demais concorrentes.

Nem mesmo as polêmicas em que esteve envolvido diminuíram o prestígio dele com Lula e Dilma. Uma das últimas diz respeito a empréstimo do BB, com recursos do BNDES, aprovado para a socialite Val Marchiori (mais informações na pág. A7). Ele também pagou multa de R$ 122 mil à Receita Federal ao ter sido autuado por não informar a procedência de R$ 280 mil na declaração do Imposto de Renda.

O primeiro imbróglio foi em 2012, quando disputou o poder com Ricardo Flores, presidente da Previ (fundo de pensão do Banco do Brasil) na época. Dilma ameaçou demitir ambos, mas apenas Flores e o ex-vice-presidente Allan Toledo, que se aliou a Flores, foram defenestrados e perderam o poder.

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