Andrea Jubé, Thiago Resende, Bruno Peres e Lucas Marchesini - Valor Econômico
BRASÍLIA - A avaliação do governo sobre os desdobramentos da crise política é de que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), excedeu-se ao anunciar o rompimento com o Palácio do Planalto e dessa forma perderá força política entre os deputados. Ministros e líderes governistas que participaram ontem da reunião de coordenação política não consideram que esteja em curso uma "crise institucional" e, por determinação da presidente Dilma Rousseff, já preparam uma ofensiva de articulação para resgatar aliados descontentes.
Em contrapartida, fontes palacianas não acreditam que a nova acusação contra Cunha traga alívio ao governo, que ainda enfrentará os julgamentos das "pedaladas" fiscais no Tribunal de Contas da União (TCU) e da ação de impugnação do mandato no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
"Se tudo der certo, respiramos em setembro", desabafou ao Valor uma fonte do palácio. Até porque Cunha perde força, mas segue no cargo, no comando de uma instituição e com a caneta em mãos. Apesar das especulações, não se acredita, no palácio, que Cunha se licenciará do cargo, ao qual se apegará para enfrentar e responder às denúncias. Mesmo assim, é unânime a leitura de que Cunha perde apoios entre aliados, incluindo a oposição e até setores do PMDB.
Um dos 12 ministros que participaram da reunião da coordenação disse ao Valor que "o que houve foi uma ação aloprada do Cunha, que foi muito além do razoável". Outro participante do encontro emendou que Cunha "passou do ponto e perdeu o controle da situação".
Dilma orientou os ministros a deflagrarem uma ofensiva política para ocupar espaços na Câmara, junto aos deputados de seus partidos e de seus Estados para resgatarem os que se desgarraram da base aliada.
A orientação é que, simultaneamente, a articulação política do Planalto intensifique o processo de nomeação de cargos do segundo e terceiro escalão e apresse o pagamento das emendas parlamentares, a fim de diluir o clima de insatisfação que paira sobre a Câmara.
Uma avaliação é de que o pemedebista agravou sua situação ao atirar, inclusive, contra o Ministério Público Federal e o Poder Judiciário, que comandam a investigação da Operação Lava-Jato. Na semana passada, veio a público o depoimento do lobista Júlio Camargo, da Toyo Setal, ao juiz Sérgio Moro, de que Cunha teria lhe cobrado propina no valor de US$ 5 milhões.
Paralelamente, o governo tentará afinar o diálogo com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Embora Renan tenha subido o tom no pronunciamento divulgado no domingo, a leitura de bastidores é de que o pemedebista tenta avocar para si o protagonismo no Congresso, diante do enfraquecimento de Cunha. Mas ao contrário do presidente da Câmara, Renan não rompeu com o governo nem acenou com essa possibilidade.
"A posição do presidente do Senado [Renan Calheiros] foi de um aliado colocando ponto de vista", disse o ministro da Defesa, Jaques Wagner, em entrevista coletiva ao final da reunião de coordenação. "A posição do presidente da Câmara foi de alguém que se diz fora da base do governo, esse é o ponto mais importante", definiu.
Wagner também minimizou a declaração de rompimento de Cunha, quanto aos projetos de interesse do governo que serão votados na Casa. "Foi uma decisão individual, já que ficou mais ou menos registrado que o PMDB não acompanha ele [Cunha]". Ele acrescentou que o governo continuará trabalhando com sua base de sustentação normalmente, "para aprovar, a partir do retorno do recesso, tudo aquilo que é importante".
Embora nos bastidores avalie que Cunha perde musculatura, a estratégia do governo é não polemizar com o pemedebista. O líder governista na Câmara, José Guimarães (PT-CE), afirmou que Cunha será tratado com respeito e que o governo hasteará a "bandeira branca" na volta do recesso. Para Guimarães, nem a ameaça de Cunha de entregar postos importantes nas recém-criadas CPIs do BNDES e dos Fundos de Pensão é algo grave. "Vamos encarar com naturalidade. Na CPI da Petrobras, fizeram um aranzel geral na véspera de convocarem o [ministro da Justiça, José Eduardo] Cardozo, mas no fim até a oposição reconheceu que ele se saiu muito bem".
Eduardo Cunha reagiu à fala de Guimarães de que hasteará "bandeira branca". Disse que não está com um "fuzil de guerra" em mãos. "O fato de eu ter mudado meu alinhamento político não significa que eu vá exercer a presidência da Câmara com um viés de qualquer natureza. Será independência de poderes com harmonia", retrucou.
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