Por Raymundo Costa – Valor Econômico
BRASÍLIA - A antecipação das eleições presidenciais é a nova carta na mesa das negociações feitas no Congresso para desatar o nó da crise política. Praticamente todas as conversas entre os partidos, governistas e da oposição, giram em torno do mesmo tema: a abreviação do mandato da presidente Dilma Rousseff. A razão é que a crise evoluiu aceleradamente nesta semana. A transição negociada, com ou sem a presidente Dilma, é a carta mais forte e está na mão do PMDB.
Na segunda-feira, a presidente organizou um jantar com o objetivo de retomar a iniciativa política e acertar os ponteiros com sua base de sustentação no Congresso. Na terça-feira, a coalizão de Dilma derrotou um requerimento do governo para adiar a votação do projeto que prevê aumentos salariais para as carreiras com teto referenciado no salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Na quarta-feira, os líderes do PDT e do PTB, partidos de pouca expressão mas representação no ministério, subiram à tribuna da Câmara para romper com o governo Dilma. A erosão da autoridade da presidente da República se dá na mesma velocidade de aceleração e aprofundamento da crise. Por puro oportunismo, no mesmo dia, o líder do PT encaminhou voto favorável ao projeto para aumentos salariais cuja votação o governo queria impedir. O líder do governo encaminhou contrariamente e teve apenas 17 votos no painel.
A base aliada de Dilma conversa uma coisa com a presidente à noite e faz outra coisa na manhã seguinte. Ao mesmo tempo, o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) fez rasgados elogios à conduta do PSDB no comando da economia, nos dois governos de Fernando Henrique Cardoso, o que soou como uma espécie de rendição do PT - alias não aceita pelo presidente do PSDB, Aécio Neves.
A pregação de Temer pela união nacional foi quase uma pá de cal na minada autoridade presidencial. Teria sido um escorregão do vice na articulação política - temeu-se por um esgarçamento nas relações com Dilma - não fosse o fato de que cada palavra foi repensada antes de ser pronunciada.
Temer disse que "alguém" precisa o unir o país. Aparentemente, deixou Dilma de fora. Só faltou entoar uma canção de Roberto Carlos que fala "esse cara sou eu". No PSDB a declaração foi vista como um "ato falho". Até agora, Temer teve o cuidado de não passar a impressão de que trama contra Dilma, a qual sempre manifesta solidariedade. Mas o vice deixou claro que o governo Dilma, da forma como é hoje, acabou.
Junte-se ao fracasso da presidente na tentativa de retomar a iniciativa política a prisão do ex-ministro José Dirceu e o agravamento dos indicadores econômicos, o resultado é que o Congresso já discute sem cerimônia o "day after" do atual governo. Entende-se que, a partir de agora, a crise só vai piorar. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também se manifesta impotente para atuar junto a Dilma. Em conversas reservadas, Lula insinuou que pode abandonar José Dirceu. Em Brasília a conversa é que se Paulo Okamotto não tiver cuidado com rigor da contabilidade do Instituto Lula, o ex-presidente também terá problemas com a Lava-Jato.
São três as saídas em discussão nos partidos, no momento. A primeira é o afastamento de Dilma pela via do Tribunal Superior Eleitoral ou do Tribunal de Contas da União. Seria o impeachment com os traumas decorrentes desse processo. A segunda saída é com Dilma no governo, mas isso significaria três anos e meio de crise econômica e política, como sucedeu no último ano do governo Sarney.
No fim de seu governo, José Sarney (1985-1990) perdeu todas as condições de governabilidade, mas tinha apenas um ano de mandato pela frente, sem expectativa de eleger um sucessor e os políticos ainda temiam pela volta dos militares. A inflação foi a 80% ao mês. Dilma está com a popularidade rés do chão, a inflação em alta mas Lula continua temido como candidato em 2018. Já foi sugerido ao PT que Lula diga não ser candidato.
A terceira opção é a que mais agrada ao PSDB do senador Aécio Neves, o candidato derrotado por Dilma em 2014: a antecipação das eleições. O Congresso em tese pode fazer, mas só numa conjunção política extremamente favorável, o que ainda não é o caso. O ideal, na avaliação feita pelos políticos aliados e da oposição, seria que a própria presidente Dilma tivesse "a grandeza" de reconhecer que perdeu as condições para governar e propor a realização da uma nova eleição ao Congresso. A pergunta é quem vai botar os guizos no gato. Dilma já demonstrou claramente que não pretende abrir mão de um dia de seu mandato.
Além disso, Dilma não entendeu ou fingiu não entender o recado dado por Temer na quarta. Ontem, Mercadante recorreu a Eliseu Padilha para informar a Temer que Dilma queria conversar. O vice já estava na base aérea, com destino a São Paulo. Atrasou a viagem e foi ao Palácio do Planalto. Dilma elogiou rapidamente a fala do vice, na véspera, para em seguida passar a desancar o Eduardo Cunha, seu esporte predileto.
No estágio atual da crise, antecipar a eleição seria a solução ideal porque o novo governo nasceria fortalecido pela vontade popular, em vez dos "arranjos por cima" tradicionalmente feitos pela elite brasileira. A solução Michel Temer desde já impõe uma pergunta nas conversas: o vice passará incólume pelas delações da Lava-Jato? E suas "relações de família" com Eduardo Cunha e o atual esquema de poder na Câmara, como ficariam?
Todos, neste momento, conversam com todos. Só um exemplo: na última segunda-feira, o ex-ministro Moreira Franco, um dos nomes mais próximos Temer e partidário da saída negociada, almoçou com o deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), uma das principais referências de Aécio na Câmara e defensor da antecipação das eleições. Aécio vê com bons olhos eleição já, o que não quer dizer que outros tucanos, como José Serra e Geraldo Alckmin, considerem que essa seja a solução ideal. Em política, há convergência quando os interesses convergem, diria o conselheiro Acácio. No momento, a única coisa com a qual todos concordam é que Dilma perdeu condições políticas de governar.
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