• Para autor de livro sobre Collor, não há coalizão clara para impeachment nem estratégia de Dilma para superar crise política
Alexandra Martins - O Estado de S. Paulo
O sociólogo Brasilio Sallum, autor do recém-lançado livro O Impeachment de Fernando Collor, não vê saída para a crise política atual porque o governo da presidente Dilma Rousseff não tem clareza da direção a tomar nem a oposição tem "horizonte" a seguir. Para o professor da USP, os movimentos que defendem o afastamento da petista têm força para "empurrar" os partidos, mas isso é insuficiente para desencadear o processo político em si.
É possível o governo sair da crise política?
Passamos por incertezas que não têm respostas claras nem do governo nem da oposição. Paulatinamente, estamos amadurecendo. O fato de o governo tentar hoje ajustar as contas já é um enorme avanço em relação ao que antes da eleição se dizia, de que não estávamos em crise econômica, que o mundo era uma maravilha. Nós, pelo menos hoje, temos absoluta consciência de que devemos fazer alguma coisa. A crise política é grave por, no mínimo, três razões: pelo fato de a presidente ter perdido autoridade, pelo enfraquecimento da coalizão e pela baixa popularidade de Dilma. Por outro lado, as forças que se opõem a ela não têm horizonte claro a perseguir. Não sabemos a qual direção a presidente quer levar o País.
Quem se beneficiaria com um processo de impeachment?
Como não estamos vendo uma coalizão definida e clara, que trabalhe especificamente pelo impeachment, não se pode dizer que hoje haja beneficiários. Como funciona o processo? Você tem oposições, que se organizam contra o presidente, mas ao mesmo tempo se organizam em favor do vice. Na época do ex-presidente Fernando Collor, houve isso: uma coalizão entre PMDB, PSDB e PT, que se articularam contra o Collor, conseguiram maioria e atraíram ex-aliados do ex-presidente. É isso que não existe hoje.
As ruas podem hoje estimular esse movimento?
Os movimentos de rua não têm a menor condição de fazer isso hoje. As mobilizações da época do Collor foram articuladas com partidos e por uma rede de mais de 100 organizações. Os movimentos de hoje, desde os de 2013, não têm condução partidária. As ruas hoje empurram os partidos, mas não são empurradas pelos partidos. Parece que hoje a relação é inversa àquela verificada na época de Collor. Em geral, mobilizações sempre têm um cordel, são puxadas por aqueles que fazem parte do sistema político, mesmo em posição secundária. A questão é que os partidos não estão conseguindo dar direção à demanda. Os partidos estão muito desorganizados, têm alas diferentes com dificuldade de manter uma unidade, têm facções que agem de formas distintas.
Temos então só ameaças?
Há tentativas, ameaças, 'pautas-bomba'. Mas os obstáculos são muito grandes para se alcançar o impedimento. Os sinais ainda não são totalmente claros, não é um movimento que será facilmente bem-sucedido. As dificuldades jurídicas e políticas serão bastante grandes, não vejo o impeachment visível no horizonte, embora haja movimentos nessa direção.
E o peso da Operação Lava Jato nesse contexto?
O problema é que a Lava Jato mostra de um lado que as instituições estão funcionando extraordinariamente bem do ponto de vista institucional, produzindo minibombas políticas. Isso tornam difíceis as associações - as agregações, digamos - entre os políticos, porque eles são passíveis de processos. Todos os mecanismos de articulação política estão sujeitos a receberem o impacto da Lava Jato. Depois que o Eduardo Cunha foi envolvido nas investigações, a Câmara passou a ser uma fonte potencial de obstáculos.
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