Por Raphael Di Cunto e Thiago Resende - Valor Econômico
BRASÍLIA - Com a saída do vice-presidente Michel Temer (PMDB) da articulação política, a presidente Dilma Rousseff utilizou a proximidade com o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (PMDB), para abrir um canal direto de interlocução com os deputados do PMDB - e que passa à margem do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), seu desafeto.
Segundo o Valor apurou, Dilma reuniu-se com o líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), duas vezes desde a volta do recesso, conversou com o pemedebista por telefone sobre a CPMF (que ele foi um dos poucos no partido a defender na semana passada), o envio do Orçamento com déficit e prometeu atender as demandas da bancada pessoalmente.
A interlocução foi intermediada por Pezão em meados de agosto, logo depois da Procuradoria-Geral da República denunciar Cunha ao Supremo Tribunal Federal (STF) e Temer avisar que deixaria a articulação política. Apoiador de Aécio Neves (PSDB) na eleição presidencial de 2014, Picciani jantou com Dilma há duas semanas, que destacou o assessor especial Giles Azevedo para ouvir as insatisfações da sigla.
"No caso do PMDB eu que vou resolver", teria dito a presidente, segundo contou o líder a quatro deputados ouvidos pelo Valor.
Até agora as conversas não deram resultado prático para os deputados da legenda e os cargos e emendas continuam travados, mas os dois encontros serviram para fomentar comentários de traição a Cunha, que lhe ajudou na eleição para a liderança do partido. A bancada se divide entre a versão de que os gestos do líder são de afastamento do presidente da Câmara e a de que Picciani busca se fortalecer como interlocutor, sem ter que passar por Cunha ou Temer.
Os adversários do líder citam dois pontos de divergência com Cunha logo após as conversas com Dilma: a pedido de Temer, Picciani votou por adiar por um dia a análise de uma proposta de emenda constitucional (PEC) que o presidente da Casa queria aprovar naquele dia, e passou - ao lado de Pezão - a defender a CPMF criticada por Cunha e Temer.
Aos pemedebistas que o questionaram, o líder negou desentendimentos com o presidente da Câmara, com o vice-presidente ou com o ministro Eliseu Padilha, responsável pela interlocução com o Congresso. Cunha, sustenta Picciani, encontrou com Dilma pouco tempo depois para falar do Orçamento e Temer e Padilha "são experientes o suficiente" para entenderem que o líder da bancada pode falar diretamente com a presidente da República.
Aliados do líder lembram que ele foi eleito em fevereiro por apenas um voto para comandar a bancada, depois de uma disputa acirrada com os parlamentares do Nordeste e Sul do país, e que precisa atender aos pedidos dos colegas para se sustentar nesta posição no próximo ano ou sonhar com pretensões maiores na Câmara.
Uma das principais queixas é a demora para indicar os cargos. "O segundo mandato já tem nove meses e até agora não concluíram as nomeações. É um processo que precisa ter fim, ou não termina a instabilidade no Congresso", reclama um pemedebista. A reforma ministerial só tende a agravar este quadro, afirma, com mudanças nos ministérios.
O PMDB da Câmara não se sente representado na Esplanada. Padilha, titular da Aviação Civil, e o ministro dos Portos, Edinho Araújo (PMDB-SP), são mais próximos de Temer. E o único que teve aval da bancada foi o ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB), que mantém bom relacionamento com os correligionários, mas está engessado com o corte de 80% em seu orçamento.
Dos três, a bancada não tem dúvidas de quem rifar na reforma: Edinho Araújo. Deputado licenciado, ele teria arbitrado quase todas as decisões sobre os cargos da Pasta em favor do PMDB do Senado, que ficou com a presidência das docas do Ceará, Pará e Espírito Santo, em detrimento de indicações dos deputados.
Araújo, reclamam os pemedebistas, também disse que não mudaria os principais postos do ministério e não autorizou nenhuma indicação para as secretarias - teria ignorado até o pedido do deputado Baleia Rossi, presidente do PMDB de São Paulo, ao qual o ministro é filiado. Os deputados receberam apenas a presidência das Docas do Rio de Janeiro - Estado de Picciani e Cunha. "Se o Edinho sair na reforma ministerial já vai tarde", diz um deputado.
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