A prisão do senador petista Delcídio Amaral, líder do governo na Câmara Alta, teve sobre o PT o efeito do golpe direto que deixa o pugilista zonzo, momentaneamente sem saber onde está e o que faz. A “grande burrada” que, segundo Lula, foi cometida por Delcídio parece ter contaminado o partido e o governo, a começar pela nota oficial em que o presidente nacional da legenda, Rui Falcão, afirma que o PT “não se julga obrigado a qualquer gesto de solidariedade” em relação ao prisioneiro porque as acusações que sobre ele pesam “não têm qualquer relação com sua atividade partidária”.
Para Lula, numa atitude típica de capo mafioso, o errado não é a tentativa de Delcídio de salvar a própria pele subornando um condenado no escândalo da Petrobrás, mas o fato de ter-se deixado flagrar com a prova indesmentível da gravação em áudio de sua proposta indecorosa. Para Falcão, que quer convencer o distinto público de que o PT não tem nada a ver com a história, o condenável é Delcídio ter agido em benefício próprio.
Disso se pode deduzir que, na judiciosa opinião do alto comissário petista, se estivesse praticando o mesmíssimo delito como uma “atividade partidária”, o senador estaria automaticamente inscrito na galeria dos “guerreiros do povo brasileiro”.
Como é de seu feitio, Lula evita os jornalistas em situações críticas nas quais é pego de surpresa, mas na quinta-feira – depois de, segundo se apurou, ter dado sinal verde a Rui Falcão para se manifestar em nota oficial –, no ambiente protegido de um almoço com dirigentes da CUT e do PT, embora reticente, mostrou-se extremamente contrariado com os fatos – como era de esperar – e limitou-se a exclamações do tipo “loucura” e “absurdo”. E teria deixado claro que apenas na hipótese de Delcídio Amaral apresentar uma “defesa consistente” ele teria condições de manifestar algum tipo de apoio. Não seria, com toda certeza, com base na risível alegação do senador de que agiu “por razões humanitárias”.
A atitude de Lula é compreensível, seja porque é coerente com seu histórico de não meter a mão em cumbuca, seja porque as evidências contra o ex-líder do governo no Senado são sólidas e dificilmente contestáveis.
De qualquer modo, esse novo episódio do calvário petista dividiu o partido, principalmente porque Rui Falcão, embora tenha, como sempre, agido de acordo com Lula, não se deu ao trabalho de consultar as bancadas petistas no Congresso. Assim, submeteu os senadores do partido ao constrangimento de tomar conhecimento da nota oficial do PT por intermédio do oposicionista Ronaldo Caiado, líder do DEM, que a leu da tribuna.
A reação mais forte à atitude de Falcão partiu das bancadas petistas também porque o texto indica claramente a tendência da direção nacional de agir duramente contra Delcídio. Tudo isso deixou alarmados os deputados e senadores petistas que têm o rabo preso em investigações da PF, pela razão óbvia de que podem esperar o pior no caso de a direção do partido decidir que é hora de marcar posição clara no combate à corrupção.
É sintomática, nesse sentido, a declaração do presidente do diretório estadual do partido em São Paulo, Emídio de Souza: “Sou favorável à expulsão (de Delcídio). Não podemos ter tolerância com esse tipo de coisa”.
Se no PT a prisão de Delcídio Amaral criou perplexidade e conflito, no Planalto a reação foi de catatonia. Afinal, o que dizer quando o líder do governo no Senado é pego com a boca na botija armando um esquema criminoso de compra do silêncio de um ex-diretor da Petrobrás – seu antigo subordinado na estatal – condenado por corrupção? Nos altos escalões do governo os prognósticos são pessimistas em termos da necessária articulação com o Parlamento para, nos últimos dias da atual sessão legislativa, obter a aprovação de medidas importantes para a administração federal, entre elas a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Desvinculação das Receitas da União (DRU). Quando parecia que podia melhorar, a situação piora para o governo e o PT.
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