Alberto Bombig - O Estado de S. Paulo
A divulgação pela imprensa de parte do depoimento do senador Delcídio Amaral (PT-MS) deu início a um intenso debate nos bastidores da política sobre os supostos interesses no vazamento. Segundo a revista IstoÉ, Delcídio iniciou com a Procuradoria-Geral da República negociações para fechar uma delação premiada na Operação Lava Jato. Ele citou vários nomes, incluindo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente Dilma Rousseff. Em nota, Delcídio não confirmou o conteúdo da reportagem, mas tampouco negou as informações.
Logo após a publicação do texto, na quinta-feira de manhã, Dilma se reuniu com ministros e assessores. Ao se pronunciar, no início da noite, afirmou: “Repudiamos, em nome do Estado Democrático de Direito, o uso abusivo de vazamentos como arma política”. Naquela altura, o que se especulava em Brasília era quem havia vazado parte do depoimento e a serviço de que interesses.
Conforme apurou o Estado com um senador governista, as citações a Lula e a Dilma dão a entender que o vazamento tinha intenção de prejudicar o governo e o PT. Mas ele aponta para uma possível “operação de redução de danos”. Ciente do estrago das revelações de Delcídio, o governo teria preferido abrir parte do conteúdo para se vitimizar e atacar os “vazamentos com fins políticos”.
Essa hipótese também embutiria a tentativa de “melar”, segundo termo usado pelo senador ouvido pelo Estado, a validade jurídica do depoimento de Delcídio. Em outras palavras, para o Planalto era preferível o estrago político, devidamente consumado assim que a reportagem foi publicada, ao estrago jurídico: a homologação da delação pelo ministro Teori Zavascki, responsável pela Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF).
O ponto mais intrigante é a celeridade e o domínio de informações sobre o caso do advogado-geral da União José Eduardo Cardozo, ex-titular da Justiça. Ele é citado por Delcídio em suposta tentativa de barrar o avanço da Lava Jato. Na tarde de quinta-feira, Cardozo expôs uma explicação pronta e acabada para as “motivações” de Delcídio: sair da prisão e se vingar de Dilma numa só tacada.
Para observadores dos mundos político e jurídico, Cardozo foi rápido demais na construção de uma linha de defesa que deixou a desejar em termos de consistência, por exemplo, na explicação das acusações de Delcídio de que Dilma acompanhou de perto a compra da refinaria de Pasadena (EUA) e de que participou de armações para libertar no Superior Tribunal de Justiça (STJ) empreiteiros presos. Adotou uma linha eminentemente política e partiu para a desqualificação de Delcídio, que até ser preso era líder de Dilma no Senado e privava da convivência direta com a presidente. O ministro é apontado, segundo apurou o Estado, pelo próprio Delcídio como responsável pelo vazamento – Cardozo nega.
Fora da esfera da luta política, o que Cardozo e o Planalto ganhariam com a divulgação? Os acordos de delação pressupõem, entre outros, a confidencialidade e o ineditismo das informações. Assim, os advogados dos citados por Delcídio teriam um argumento forte para uma luta judicial. No entanto, no fim da noite de quinta-feira, a jornalista Renata Lo Prete, da GloboNews, revelou que Zavascki está decidido a aceitar o conteúdo do depoimento de Delcídio, apesar do vazamento.
Do ponto de vista da oposição, conforme um deputado tucano, há suspeitas de que a divulgação possa ter partido da PGR ou de pessoas com acesso ao Supremo para evitar que o caso fosse abafado pelas autoridades em benefício do governo. Nessa hipótese, a divulgação pressionaria a Lava Jato a levar adiante a apuração do que relatou Delcídio. O problema é que ninguém, além das autoridades competentes, sabe tudo o que revelou o senador que tinha muito bom trânsito no Planalto, na Petrobrás e na própria oposição.
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