Seria difícil apontar o mais pernicioso dos artifícios adotados para mascarar a deterioração das finanças públicas nos últimos anos, mas a banalização dos programas de parcelamento de dívidas com o fisco por certo figuraria entre os principais candidatos.
A arrecadação dava os primeiros sinais de enfraquecimento ao final de 2013 quando o governo Dilma Rousseff (PT) se valeu do expediente. Reabriu-se o plano lançado em 2009 –que já havia sido o quarto em um decênio– com juros e prazos privilegiados para que empresas com tributos em atraso regularizassem sua situação.
Para fazer jus aos benefícios, contribuintes correram a fazer os depósitos iniciais exigidos pelo regulamento. Com isso, os cofres da União receberam, de imediato, expressivos R$ 20 bilhões adicionais, e as contas do Tesouro Nacional fecharam no azul pela última vez.
Naquele ano, a prática alastrava-se também pelas administrações estaduais. São Paulo, por exemplo, amealhou R$ 6 bilhões com seu programa e evitou um corte dos investimentos. Em 2014, o governo federal decidiu repetir a estratégia, mas agora com resultados abaixo das expectativas.
Há razões que justificam iniciativas do gênero, ainda mais num país onde a carga fiscal é excessiva –cerca de um terço da renda nacional– e o emaranhado de impostos, taxas e contribuições é dos mais complexos do mundo.
O emprego recorrente da medida, entretanto, acaba por introduzir novos vícios no sistema tributário. Como noticiou esta Folha, dados da Receita Federal apontam que duas entre dez grandes empresas brasileiras já participaram de pelo menos três programas de parcelamento, em geral deixando um para ingressar em outro.
Para estudiosos, o vaivém tornou-se uma opção racional para boa parte dos contribuintes, em especial quando se enfrentam tribulações financeiras: em lugar do cumprimento tempestivo das obrigações, prefere-se aguardar a abertura de novas facilidades.
O fato é que, das 326 mil empresas que aderiram ao refinanciamento federal do ano retrasado, mais da metade já abandonou os pagamentos. Seja por cálculo ou mera incapacidade dos devedores, o resultado contribui para apiora na arrecadação do governo, que acumula queda real de assustadores 7% até julho.
Deve-se resistir, portanto, a propostas de novos planos especiais como as que já surgem entre associações industriais. Por excruciantes que sejam os efeitos da recessão, o caminho para superá-los começa pelo reequilíbrio dos orçamentos públicos –e passa, mais à frente, por uma reforma tributária.
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