segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Esquema de Cabral teve propina paga no exterior

• Delação da Odebrecht vai revelar depósitos constantes

Novo conjunto de colaborações na Lava-Jato deverá ampliar as provas e comprometer mais envolvidos

As delações de dois ex-executivos da Odebrecht, Benedicto Júnior e Leandro Andrade Azevedo, vão revelar as contas internacionais do esquema de corrupção que seria comandado pelo ex-governador Sérgio Cabral, revela CHICO OTÁVIO. A Odebrecht participou de grandes obras do governo fluminense, como a reforma do Maracanã e a construção do Arco Metropolitano. Os investigadores da Lava-Jato acreditam que mais provas e novos personagens surgirão das delações.

Contas internacionais

• Delação da Odebrecht vai apontar depósito de propinas em bancos fora do país

Chico Otavio - O Globo

Os investigadores da Lava-Jato no Rio esperam que uma nova remessa de delações premiadas — a começar pela Odebrecht, provavelmente esta semana — amplie o conjunto de provas e os personagens envolvidos no esquema de propinas comandado pelo ex-governador Sérgio Cabral. Uma das informações mais quentes é esperada de Benedicto Júnior, ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura, e de Leandro Andrade Azevedo, ex-diretor da empreiteira no Rio: as contas internacionais do esquema, nas quais a empresa teria depositado regularmente a taxa de 5% cobrada por Cabral pelas grandes obras que executou no estado.

O ex-governador e outros nove integrantes do esquema foram presos, na quinta-feira, durante a Operação Calicute, após terem sido delatados por executivos das construtoras Andrade Gutierrez e Carioca Engenharia. Já a próxima remessa de delações, além dos mais de 60 executivos da Odebrecht, prevê acordos com Fernando Cavendish, da Delta Construções, e com Reginaldo Assunção, diretor da OAS-RJ.

A Odebrecht atuou, durante o governo Cabral (2007-2014), em praticamente todas as obras públicas importantes, como a reforma do Complexo do Maracanã e a construção do Arco Metropolitano, da Linha 4 e do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj). Orçada inicialmente em R$ 700 milhões, a obra do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014 saltou para R$ 1,2 bilhão após receber 14 termos aditivos. Se a Odebrecht, que liderou o consórcio construtor formado pela Delta e pela Andrade Guitierrez, confirmar que também pagou 5% de propina, esse valor representará um suborno estimado em R$ 60 milhões.

DOLEIRO COMO ENTREGADOR DE PROPINA
Benedicto Júnior, na presidência da Odebrecht Infraestrutura, era um dos principais interlocutores da empreiteira com o mundo político. Ele, que chegou a ser preso em março pela Operação Xepa, na 26ª fase da Lava-Jato, foi apresentado a Cabral no início do governo, em 2007, pelo então secretário estadual de Saúde, Sérgio Côrtes. Semanas depois, já frequentava a casa de Cabral no condomínio Portobello Resort, onde acabaria construindo, anos depois, uma mansão a poucos metros da casa do ex-governador.

A Odebrecht, de acordo com a força-tarefa da Lava-Jato, tinha uma estrutura profissional de pagamento de propina, o “Setor de Operações Estruturadas”, subordinado a Benedicto Júnior. Em planilha apreendida pela Xepa na casa do executivo, apareciam codinomes vinculados a repasses de valores. Os investigadores acreditam que o documento era uma espécie de contabilidade da propina. Um dos codinomes, “Proximus”, aparece relacionado a repasses de R$ 2,5 milhões por conta da obra da Linha 4 do Metrô.

As delações da Odebrecht deverão apontar o doleiro Álvaro José Galliez Novis, da Hoya Corretora de Valores e Câmbio, do Rio, que também chegou a ser preso na Xepa, como responsável pela entrega de propina da empreiteira. Na Calicute, as investigações demonstraram que Carlos Emanuel de Carvalho Miranda, preso na quinta-feira, sob a acusação de ser o coletor da propina de Cabral, trocou dólares por intermédio de Novis para uma viagem do filho.

Novis, na planilha da Odebrecht, era tratado pelos codinomes Carioquinha e Paulistinha (porque ele supostamente cuidava das propinas no Rio e em São Paulo). Na planilha apreendida na casa de Benedicto Júnior, “Proximus” teria recebido R$ 2,5 milhões em cinco parcelas de R$ 500 mil pela Linha 4 do Metrô, com o pagamento efetuado nos dias 16 de setembro, 24 e 29 de outubro, 12 e 13 de novembro de 2014, período em que acontecia no estado a eleição para a sucessão de Cabral (vencida por Luiz Fernando Pezão).

A entrega do dinheiro releva um caminho na direção do PMDB fluminense. De acordo com os documentos arrecadados pela Lava-Jato, a propina foi repassada a Olívia Vieira, na Avenida das Américas 3.500, Barra da Tijuca. Olivia Vieira era, na época, gerente da CS 986 Administração e Participações, que funcionava neste endereço. Ela tem como sócios Sandro Alex Lahmann e Gláucia dos Reis Lahmann

Sandro Alex, como sócio de outra empresa, a Lahmanno Rio Comercial Cirúrgica, foi flagrado na Operação Furacão, deflagrada contra a cúpula da contravenção no Rio, em 2007, por subornar dois agentes da Polícia Federal. Ele queria abafar um inquérito instaurado a partir relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras, do Ministério da Justiça (Coaf ), que detectou movimentação atípica no valor de R$ 8,3 milhões, entre outubro de 2003 e setembro de 2004, na agência do Banco do Brasil em Bento Ribeiro. Este dinheiro teria sido usado, segundo o relatório do Ministério Público Federal, para financiar a campanha política do PMDB.

Fernando Cavendish ainda está negociando a delação. Um dos episódios que deverão ser confirmados pelo empresário é o do anel da grife Van Cllef & Arpels, no valor de R$ 800 mil, presente de Cabral a então primeira-dama Adriana Ancelmo, pago por Cavendish durante viagem a Montecarlo, em 2011. Já a OAS reiniciou as conversas sobre a delação que haviam sido interrompidas.

Procurada, a Odebrecht não quis se manifestar sobre a delação. Os advogados de Cabral não foram localizados, mas um deles, Raphael Mattos, disse ao jornal “O Estado de S.Paulo” que a defesa ingressará com pedido de habeas corpus para Cabral esta semana. Ele explicou que a demora no ingresso do recurso se deve à complexidade do processo, que envolve pedidos de prisão feitos pela Justiça Federal do Rio e de Curitiba.

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