- Blog do Noblat
As recentes crises econômica e política vivenciadas pelos brasileiros nos últimos anos são resultado direto de licenciosidade e irresponsabilidade com a coisa pública em níveis jamais vistos.
São desafios que demandam respostas urgentes e consistentes, por mais difícil que seja construí-las a contento dos diversos interesses em disputa e, principalmente, dos anseios da sociedade por um Brasil que funcione e dê oportunidades a todos.
Estamos a ver as vergonhas do país expostas, e cabe a nós transformar um momento tão grave como este em força motriz de mudanças efetivas.
Tenho insistido que as soluções para a economia e para a política não são excludentes; é preciso pavimentar um novo ciclo de crescimento e recuperação do emprego e da renda ao mesmo tempo em que avançam os processos e investigações em curso, assim como se desenhe um novo sistema de funcionamento dos partidos e das campanhas eleitorais.
Da mesma forma que não faz sentido ser conivente com quaisquer abusos em nome da retomada econômica, tampouco é inteligente sacrificar reformas fundamentais para uma nova dinâmica produtiva no país sob pretexto de “limpar a política” ou “mudar tudo o que está aí”.
Por trás do discurso de boas intenções pela moralidade pública, há um intuito escamoteado de preservação de benefícios indevidos usufruídos por uma pequena, porém poderosa casta de privilegiados que, em nenhum momento, se mostrou sensível ou solidária aos graves problemas fiscais do governo federal, dos estados ou dos municípios.
Não é por acaso que, quando se imaginava que avançaríamos na discussão da reforma da Previdência, voaram flechas a tentar ferir de morte a proposta mais esperada para a reorganização das contas públicas.
Sem acabar com os regimes especiais de aposentadorias e pensões e com as regras que fazem os mais ricos e escolarizados pararem de trabalhar muitos anos antes da maioria dos trabalhadores brasileiros, o governo continuará a enxugar gelo na hora de fechar suas contas – na prática, é fazer derreter a desejada construção de um caminho de crescimento sustentado para a economia de um país continental, cheio de riquezas naturais e potencial historicamente invejado por tantas nações mundo afora.
Hoje, o principal entrave à construção de um Brasil efetivamente mais justo, menos desigual e menos sujeito a crises das mais variadas formas é o patrimonialismo.
As mesmas vozes que bradam discursos moralistas e frases de efeito são as que se articulam de forma sorrateira por interesses corporativistas, cuja prioridade é aumentar os ganhos de sua classe profissional.
A destruição de quase 10% do PIB em pouco mais de dois anos, tragédia social que só será recuperada na próxima década, não comove a elite burocrática que pleiteia aumentos de dois dígitos em tempos de inflação anual abaixo de 4%, restrição orçamentária e colapso das contas públicas nos três níveis de governo!
É lamentável que muitos pretensos paladinos sejam os primeiros a apontar “legalidade” no uso de penduricalhos que, na prática, existem apenas para justificar a infração à regra constitucional do teto salarial do funcionalismo público.
Tampouco é capaz de frear o patrimonialismo destas castas o fato de que os R$ 33,8 mil pagos mensalmente aos ministros do Supremo Tribunal Federal, valor que deveria servir de limite máximo de remuneração no setor público, equivale a uma vez e meia o que o trabalhador médio brasileiro ganha ao longo de 12 meses!
Como escrevi no início desse texto, as vergonhas do Brasil estão expostas e precisam ser ainda mais reveladas, discutidas e solucionadas em nome de um país que tenha um governo mais efetivo, capaz de prover educação, saúde e segurança como é direito de todos os brasileiros.
Para isso, precisamos sem dúvida alguma de investigações sérias, processos judiciais justos e legítimos e, em caso de ilícitos comprovados após o exercício integral do direito de defesa, a devida punição a quem cometeu crimes. Mas precisamos também combater todo e qualquer privilégio pecuniário gozado às custas do suor da maioria da sociedade.
A permissividade que leva a desvios e à corrupção compromete o futuro do país tanto quanto a licenciosidade dos que colocam os interesses de sua corporação à frente do bem comum.
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José Aníbal é presidente nacional do Instituto Teotônio Vilela. Foi deputado federal e presidente nacional do PSDB
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