Por Raphael Di Cunto, Marcelo Ribeiro, Bruno Peres e Cristiano Zaia | Valor Econômico
BRASÍLIA - O presidente Michel Temer deve ter hoje votos suficientes na Câmara dos Deputados para se manter no cargo e impossibilitar o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), da denúncia de que cometeu o crime de corrupção passiva ao supostamente negociar propina com a JBS em troca de favorecimento à empresa, o que ele nega. A dúvida entre aliados e oposição é qual será o placar e o que isso simbolizará para a continuidade do governo.
Apesar da decisão dos partidos de oposição de não registrar o quórum até que a base tenha número suficiente para encerrar a discussão (257 deputados) a possibilidade de adiamento da votação ficou mais distante com o elevado quórum de ontem à noite, quando 449 parlamentares apareceram na sessão para votar uma medida provisória (MP). O número que aumentava ainda mais com a chegada de voos a Brasília, mas a sessão foi encerrada cedo.
Para iniciar a chamada nominal dos deputados para votar a denúncia são necessários 342 dos 513 deputados, mesmo número exigido para autorizar o STF a julgar a denúncia - que, se aceita, levará ao afastamento do pemedebista por até 180 dias. Para impedir o julgamento até que Temer deixe o Palácio do Planalto, portanto, bastam 172 votos.
Com a salvação de Temer encaminhada, governistas e oposição faziam articulações de última hora para mexer no placar. A avaliação, de ambos os lados, é de que quem obtiver a maioria terá uma vitória simbólica. Se Temer registrar o apoio de pelo menos 257 deputados, mostrará que conta com uma base suficiente para aprovar até leis complementares - embora mudanças na Constituição, como a atual reforma da Previdência, estejam longe por exigirem 308 votos.
Se não tiver a maioria, o pemedebista ficará em situação complicada para enfrentar a próxima denúncia que a Procuradoria-Geral da República (PGR) pretende apresentar até setembro com base na delação premiada dos donos e executivos da JBS. Perderia parte do apoio do mercado e de empresários, que já chegaram a sinalizar, no meio da crise política, que confiam no presidente da Câmara e primeiro na linha sucessória, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para conduzir a agenda econômica em caso de afastamento do pemedebista.
A mobilização do governo para que 11 ministros que são deputados federais titulares voltem à Câmara para votar, além do retorno de secretários estaduais para seus mandatos, influenciaram positivamente para o pemedebista. O governo divulgava ontem contar com mais de 250 votos, podendo chegar a 280. A oposição dizia contar com o apoio de 240 congressistas.
Com base em manifestações nas redes sociais e internet e já considerando o retorno dos ministros, a consultoria Bites contabilizava até ontem 184 deputados publicamente pelo trancamento da denúncia - número mais que suficiente para salvar o presidente - e 213 a favor da acusação e 116 indecisos. Nas sondagens feitas por jornais, cerca de 197 diziam votar a favor e 110 contra. Mais de uma centena escondiam seus votos para fugir da pressão de seus partidos e, principalmente, dos eleitores.
Embora os maiores partidos da base, com exceção de PSDB - que está rachado - e DEM - com maioria favorável a Temer -, tenham fechado questão pela rejeição da denúncia, são esperadas "traições". No PMDB de Temer, que tem 63 deputados, de oito a nove devem votar pelo afastamento do presidente. O número já foi maior, mas reduziu com as ameaças de expulsão e outras pressões. PR, PP, PSD e PRB também contavam dissidentes.
A sessão para analisar a denúncia está marcada para começar às 9h, mas a oposição quer iniciar a votação só à noite, quando espera maior número de pessoas acompanhando pela TV e maior constrangimento para os deputados votarem contra a denúncia ao serem chamados nominalmente aos microfones. Os partidos contrários a Temer definiram que só registrarão presença quando a base tiver votos suficientes (257) para aprovar um requerimento e encerrar a discussão - o que pode ocorrer após apenas quatro oradores.
Pelo rito definido por Maia, o relator do parecer vencedor na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), terá até 25 minutos para defender a rejeição da denúncia. O advogado de Temer, Antônio Cládio Mariz de Oliveira, terá outros 25 minutos. A oposição protesta que esse rito não está previsto no regimento e está "desequilibrado", com pouco tempo para a acusação se manifestar e quase uma hora apenas para os argumentos do investigado. Maia rebateu que, como não ocorreu acordo, apenas seguiu o regimento interno da Casa.
O governo trabalhava para o quórum mínimo ser atingido e líderes da base ligavam até para deputados favoráveis à denúncia aparecerem. A ideia é "virar a página" da denúncia. Apesar disso, o próprio Temer ensaiou discurso para o caso de não conseguir concluir a votação. "Quem tem que votar são os que querem destruir aquilo que a CCJ decidiu", disse o presidente.
Na última sessão da Câmara antes de votar a denúncia, os deputados aprovaram uma medida provisória (MP) que aumenta as multas para infrações à sanitárias em produtos de origem animal, editada como consequência de outro escândalo envolvendo frigoríficos, a operação Carne Fraca, da Polícia Federal. Apenas o texto principal, contudo, foi aprovado e as emendas ficaram para a próxima semana. A sessão acabou às 20h para que os parlamentares pudessem participar dos diversos jantares de articulação política que ocorreriam em Brasília.
O presidente Temer passou o dia reunido com deputados - 30 passaram por seu gabinete-, almoçou com a bancada ruralista após editar MP negociando dívidas do agronegócio, encontrou a bancada feminina e era esperado em jantares da base aliada. Tinha confirmado presença em pelo menos um, na casa do vice-presidente da Câmara, Fábio Ramalho (PMDB-MG), por onde passariam pelo menos 80 parlamentares.
Com a medida provisória, a base governista espera evitar insatisfações entre os ruralistas que pudessem levar a uma debandada no apoio. A própria bancada fez um levantamento e, dos 86 deputados do grupo que declaravam suas posições publicamente, apenas oito votariam contra o pemedebista. O Palácio conta que, com o afago, esse número deve até diminuir.
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