Por Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro | Valor Econômico
BRASÍLIA - Por interesses regionais ou medo de retaliação do governo federal, governadores de oposição ao presidente Michel Temer atuaram para ajudar a salvar o mandato do pemedebista na votação, pela Câmara dos Deputados, da denúncia de que ele cometeu crime de corrupção passiva ao supostamente negociar propina com a JBS em troca de favorecimento à empresa.
Os governadores da Bahia, Rui Costa (PT), e de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), exoneraram três secretários que retornarão à Câmara para votarem a favor do pemedebista ou faltarem. Os suplentes, que eram publicamente favoráveis ao afastamento do presidente, não poderão votar. Além disso, outros três governadores petistas fizeram "corpo mole" e mantiveram secretários que poderiam apoiar o recebimento da denúncia no lugar dos suplentes que são governistas.
Segundo o Valor apurou, houve um acordo entre os governadores para não interferir na disputa na Câmara contra o presidente Michel Temer. O movimento é diferente de quando ocorreu o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Na época, a maioria dos secretários estaduais e municipais que são deputados federais licenciados voltaram ao Congresso para votar.
A postura de agora, que considera como improvável a queda do governo na votação de hoje, é de não se colocar como oposição ao governo federal para evitar corte de repasses e investimentos nos Estados. Três governadores do PT ficarão "em cima do muro": Camilo Santana, no Ceará, Wellington Dias, no Piauí, e Fernando Pimentel, em Minas Gerais.
Santana poderia exonerar um dos secretários do PDT, que fechou questão pelo afastamento de Temer, para substituir o suplente em exercício Paulo Henrique Lustosa (PP), contrário à denúncia. A esposa de Dias, a deputada Rejane Dias (PT), é secretária de Educação no Piauí e, sem voltar à Câmara, deixará o suplente Maia Filho (PP) repetir o voto contrário denúncia - ele já se manifestou pelo arquivamento na Comissão de Constituição e Justiça. Em Minas, Pimentel tem dois secretários do PT, mas manterá no mandato Ademir Camilo (Pode), que se reuniu ontem à noite com Temer para prometer o voto contra acusação.
Além das promessas de investimentos nos Estados e disputas regionais, nos bastidores, parlamentares afirmam que o PT defende publicamente o afastamento de Temer, mas conta com a manutenção do pemedebista para ampliar o desgaste dos partidos da base aliada a ele e as chances de eleição dos petistas, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2018.
Em outros dois Estados, governadores de partidos de oposição a Temer chegaram até a atuar a favor do pemedebista. Rui Costa, na Bahia, exonerou os secretários de Desenvolvimento Urbano, Fernando Torres (PSD), e de Relações Institucionais, Josias Gomes da Silva (PT), para que os suplentes Robinson Almeida (PT) e Davidson Magalhães (PCdoB) não possam votar. Ambos eram favoráveis à denúncia.
Torres divulgou nota dizendo que "considera ilegítima a ascensão de Michel Temer à Presidência da República, mas também rechaça qualquer possibilidade de o deputado federal Rodrigo Maia (DEM) assumir o comando do Brasil". Ao Valor, ele afirmou que não votará hoje. "Não adianta trocar seis por meia dúzia. O certo é a realização de eleições diretas, por isso vou me abster", disse.
O Valor não conseguiu contato com Josias, mas ele, segundo informações de outros deputados baianos, não aparecerá para votar. Faltas e abstenções, no caso de denúncias contra o presidente da República, valem como votos a favor do governo porque é a oposição que precisa alcançar pelo menos 342 deputados para o afastamento. Quem não aparece acaba ajudando a impedir o julgamento de Temer pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Costa trabalha contra o fortalecimento do prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM), cotado para disputar o governo da Bahia no próximo ano contra a reeleição do governador e um dos principais aliados do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que assumiria em caso de afastamento de Temer.
Já Paulo Câmara, em Pernambuco, liberou o secretário de Transportes, Sebastião Oliveira (PR), para retornar à Câmara e votar pelo trancamento da denúncia. O secretário de Turismo, Felipe Carreras (PSB), contudo, continuará no cargo - o suplente que sairia com a volta dele é o deputado Fernando Monteiro (PP), aliado de Temer.
Com a troca, Sebastião Oliveira pretende agradar ao ex-deputado Valdemar Costa Neto, principal líder do PR, e manter sob seu controle o diretório local do partido, que "fechou questão" para rejeitar a acusação contra o pemedebista e punirá os dissidentes. A substituição permitirá a Paulo Câmara manter o PR sob sua órbita de influência na tentativa de se reeleger em 2018.
Oliveira ganhou o comando da legenda na votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, quando o então presidente do PR em Pernambuco, o ex-deputado e atual prefeito de Jaboatão dos Guararapes, Anderson Ferreira, votou pelo afastamento da petista, contra a ordem do partido. O hoje secretário se absteve e ficou com a legenda.
A volta do deputado licenciado garantirá mais um voto a favor de Temer, embora o governo pudesse até prescindir dessa substituição. O deputado federal Cadoca (PDT-PE) já chegou a se manifestar pela rejeição da denúncia, mas é pressionado pelo PDT a votar contra o governo. A ameaça de expulsão não tem significado muito, contudo, e o partido já considera a desfiliação dele como certa.
Além dele, o governo federal ganhará outros dois votos contra a denúncia com o retorno dos três ministros de Pernambuco que são deputados federais titulares: o das Cidades, Bruno Araújo (PSDB); o de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho (PSB); e o de Educação, Mendonça Filho (DEM). Dos cinco suplentes, dois, do PSB, são favoráveis à acusação.
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