O plano de Michel Temer (PMDB) para desestatizar a economia é pleno de propósitos corretos -e tornou-se ainda mais ambicioso.
Além de nova e extensa rodada de concessões de serviços à iniciativa privada, que inclui aeroportos como o de Congonhas, retoma-se a venda de estatais, da gigante Eletrobras à Casa da Moeda.
Passado o impacto da surpresa, surgem de pronto duas questões. A primeira, sobre o realismo das ambições de uma administração à qual resta menos de um ano e meio de vida. A segunda, acerca de como regular e financiar a infraestrutura nesse novo ambiente, mais expurgado de estatismo.
Já está em andamento, desde 2016, um programa de privatizações de resultados muito desiguais, para dizer o mínimo. Com o novo pacote, cabe perguntar se o governo não tem diante de si um prato maior do que é capaz de digerir. Há o risco de que a fome de recursos para cumprir as metas orçamentárias suscite atropelos e vendas impensadas de patrimônio.
No plano do ano passado, houve sucesso em leilões de aeroportos, negócios estabelecidos, e de linhas de transmissão de energia. Estão mais adiantadas a concessão de terminais portuários e as licitações de petróleo. No caso de estradas e ferrovias, porém, o prognóstico é lúgubre.
Além de revigorar a minguante infraestrutura nacional, tais projetos levariam dinheiro para cofres federais vazios. Serviriam também de impulso para a ainda exígua recuperação econômica.
Entretanto processos bem-feitos de privatização -seja na forma de concessão ou de venda- tomam tempo, ainda mais na floresta regulatória e judicial brasileira.
Até o momento nem mesmo se tem conhecimento das diretrizes da venda da Eletrobras, para citar o exemplo mais vistoso das pretensões oficiais. Pretende-se reduzir a participação acionária do Tesouro Nacional à minoria, mas quem controlará o conglomerado? O governo continuará como uma sombra na sociedade da empresa?
Como se planejará a expansão do setor, a preços razoáveis para os consumidores menos abonados?
Decerto que as respostas do modelo estatizante para questões do gênero têm sido péssimas. A ampliação da infraestrutura nesta década baseou-se em crédito subsidiado e endividamento público, a custos, como hoje está claro, insustentáveis. A mera mudança de orientação, porém, não é panaceia.
Há muito mais no entulho estatal. No levantamento mais atualizado, o governo federal conta 151 empresas sob seu controle; convém, no entanto, salientar as nuances desse número espantoso.
Na prática, mais de 70% desse total compõe-se de seis grandes estatais -Petrobras, Eletrobras, Banco do Brasil, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Caixa Econômica Federal e Correios- e suas subsidiárias. Qualquer tentativa de privatização nesse universo terá de enfrentar tabus políticos.
Entre as demais, destaca-se a Infraero, responsável pela administração dos aeroportos e de ineficiência crônica e notória. À medida que os terminais mais lucrativos vão sendo concedidos à exploração privada, fica a dúvida sobre como serão atendidas as áreas menos rentáveis do país.
Há empresas que, a despeito desse nome, nem sequer se mantêm com receitas próprias. São, na prática, repartições públicas dificilmente privatizáveis, como a Embrapa, de pesquisa agropecuária, e a Codevasf, responsável por projetos na área de recursos hídricos.
Restam no colo do Estado, de todo modo, estruturas que são puros escoadouros de dinheiro ou cabides de emprego, quando não focos de negócios escusos.
É incompreensível, por exemplo, a permanência da EPL, empresas de estudos de logística criadas por Dilma Rousseff (PT) a fim de planejar o famigerado trem-bala, inviável desde sempre. Ou da Valec, inepta e nascida sob o signo da corrupção, desde o escândalo da Ferrovia Norte-Sul.
Difícil sustentar que a União precisa de variadas empresas de pesquisa e produção de materiais nucleares; de administrar trens urbanos em Porto Alegre; de fabricar chips para rastreamento de gado; de gerir portos que pouco rendem além de cargos para políticos.
Definida a orientação correta, de saneamento do Estado, o governo precisa acelerar as concessões prometidas no ano passado, além de enquadrar seu programa de privatizações em um plano geral de expansão da infraestrutura.
Deve, sobretudo, demonstrar que não está a tomar decisões precipitadas -premido pela necessidade de vender ativos rapidamente para cobrir rombos em suas contas- ou meramente publicitárias.
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