Resistência de frações desses partidos com respeito à redução do peso do Estado vai contra os programas fundadores de suas agremiações
Há 29 anos, ainda na transição do regime autoritário para a democracia, políticos identificados com a socialdemocracia e o liberalismo exercitaram a ousadia na formulação de um novo projeto político para o país. Havia convergência sobre objetivos na reconstrução nacional.
O PSDB, por exemplo, apresentou-se contra o populismo personalista e o autoritarismo concentrador do poder e da riqueza. “Longe das benesses oficiais, mas perto do pulsar das ruas”, dizia no manifesto de fundação, em 25 de julho de 1988. Entre os compromissos, alinhou a reforma da administração pública “para livrá-la das práticas clientelistas e assegurar eficiência às empresas e órgãos estatais”.
Já o PFL reciclou-se na modernidade das ideias liberais, mudou o nome para Democratas (DEM), em 2007, afirmando-se na luta contra o Estado “obeso”, como definiu à época no manifesto de refundação: “Quando se incha a máquina pública faz-se a alegria de uns poucos companheiros e renegam-se a qualidade do atendimento e o respeito a milhões de cidadãos.”
Precisamente por essas razões, é absolutamente incompreensível e inaceitável a sucessão de condições que frações regionalistas desses dois partidos tentam impor ao programa de privatizações e concessões, principalmente em relação às subsidiárias da Eletrobras, como Furnas e Chesf.
No PSDB, a reação contrária à privatização da Eletrobras partiu da ala mineira, comandada pelo senador Aécio Neves, afastado da presidência do partido e investigado por corrupção.
O porta-voz do retrocesso foi o deputado Marcus Pestana, que preside o partido em Minas: “Furnas é um símbolo de Minas Gerais”.
Na sequência, insurgiu-se o deputado baiano José Carlos Aleluia, secretário nacional do DEM: “Fui contra em 1997 e sou contra outra vez a privatização da Chesf”. Logo, alinharam-se parlamentares da região Norte em defesa da retirada da Eletronorte da lista de privatizações.
É crítica, insustentável mesmo, a situação da Eletrobras. São quase cinco anos seguidos de prejuízos (acima de R$ 30 bilhões) e perdas operacionais significativas (R$ 20,5 bilhões em 2015). É o resultado de décadas de ingerência política indevida, corrupção e opacidade nos negócios desse grupo de 15 estatais e duas centenas de subsidiárias — a maioria, estabelecida à margem do controle público. Tudo agravado por Dilma e sua medida provisória.
A reação só confirma a urgência da retirada do Estado de uma área dominada por interesses de minorias privilegiadas, ávidas por empregos e remunerações extraordinárias, como se comprova na Eletronorte, e por negócios obscuros, como evidenciam os inquéritos sobre corrupção.
A oposição à privatização emergente em algumas alas do PSDB e do DEM configura uma traição de fato aos princípios fundacionais dos partidos, que deveriam representar fielmente a social-democracia e o liberalismo modernos.
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