“Atentar para as consequências. Vou recompor uma situação: os militares fizeram uma intervenção militar em 1964 e fecharam o Congresso, mas logo depois readmitiram a política, abriram o Congresso, e mais, fizeram alianças com setores sociais relevantes, inclusive com as oligarquias tradicionais, que foram selecionadas para exercer poder em muitos estados que ali estavam. E com isso, porque eles calcularam as consequências, puderam persistir por tanto tempo; eles não foram principistas. Eles agiram com seus princípios de conduzir o país à grandeza, ao crescimento, à expansão burguesa.
Essa corporação que hoje exerce esse protagonismo, a corporação dos magistrados, não tem essa percepção política e a percepção de que tem que agir de forma a atentar para as consequências de seus atos. Qual é a consequência de derrubar o presidente Temer agora, faltando pouquíssimo tempo para a sucessão presidencial? Por que não conduzir a Operação Lava Jato de forma que ela cumpra seus efeitos, mas ao mesmo tempo respeite a situação que o país vive, de instabilidade?
Nós nascemos com desequilíbrios muito fortes. Gilberto Freyre falava que o Brasil era o país que sabia equilibrar antagonismos. Mas hoje não tem poder que equilibre os antagonismos. Eles estão correndo à solta, com fúria e isso torna a institucionalidade muito débil. A Carta de 88 e a democracia brasileira, nesse sentido, estão em risco. Ou aparece uma política de moderação, ou então nós vamos ladeira abaixo.
As ruas estão em silêncio, mas se elas por ventura vierem a se manifestar – não estou dizendo que isso está no horizonte, mas é uma possibilidade –, toda uma obra que estamos tentando realizar desde a democratização do país pode ir por água baixo. Pensar e cultivar e preservar a luta contra a corrupção é necessário, isso tem que ser levado à frente, mas as consequências têm que ser sopesadas. Isso não pode ser conduzido de forma principista. Passar o Brasil a limpo é o quê? É começar desde a colonização? A escravidão foi um fato. Quando fundamos o nosso Estado-nação, o fundamos sob princípios liberais, mas ao mesmo tempo mantivemos a escravidão. Então, esse tipo de antagonismo que se manteve entre nós é muito difícil de ser equilibrado. Quem equilibrou isso foi a política, o poder moderador do Império. Os militares na República se comportaram como poder moderador.
Esse Judiciário que aí está não está se comportando como poder moderador.”
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Luiz Werneck Vianna é sociólogo e professor da PUC-Rio. Entrevista em 22/9/2017
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