segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Cenário político e econômico abre espaço para 'outsider'

Carmen Munari | Valor Econômico

SÃO PAULO - A rejeição à classe política e o pessimismo do eleitorado em relação à recuperação da economia ainda garantem espaço no cenário da sucessão para um "outsider" na visão do presidente da Locomotiva Pesquisa e Estratégia, o publicitário Renato Meirelles. Meirelles ganhou fama em outro instituto, o Data Popular, onde conduziu estudos sobre a nova classe média brasileira, a nova classe C. A empresa seguinte foi criada em 2016.

Uma pesquisa do instituto, realizada entre 15 de novembro a 15 de dezembro, com 2.006 entrevistas presenciais, indicou que quase a totalidade dos entrevistados (96%) está insatisfeita com os governantes do país. Para 88%, os políticos nunca defendem os interesses da população e apenas 7% confiam nas lideranças políticas.

"A política tradicional está morrendo de maduro e fazendo de tudo para não cair", disse Meirelles. "As pessoas demandam mudança, mas não estão vendo oferta disso." Enquanto os políticos tradicionais atuam pelo "analógico", pouco permeáveis à participação popular, os brasileiros, ao contrário, já estão na era do "digital", acredita, referindo-se à maior tendência à interlocução.

Meirelles aponta o apresentador de TV Luciano Huck, que vem negando a candidatura à Presidência, como a "cara do novo" e um dos únicos que conseguem transmitir o empoderamento às pessoas, no sentido da emancipação individual.

"Huck tem a plataforma para melhorar a vida das pessoas. Representa a meritocracia com oportunidade, o que a esquerda não conseguiu". Nove em cada dez pessoas querem que os governantes deem oportunidade à população, aponta. Para o publicitário, se Huck se lançasse à Presidência capitalizaria todo o espaço do centro - hoje embolado entre vários nomes. O apresentador encerraria a polarização esquerda e direita.

"Huck está em sintonia com as demandas das pessoas", reforça Meirelles, prevendo ainda que ele herdaria os votos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se o petista não puder concorrer às eleições por questões judiciais.

Desde 2000, Huck apresenta o programa de variedades "Caldeirão do Huck" na Globo aos sábados. Um dos quadros oferece reforma para casas ou mesmo uma casa nova; outro, remodela um veículo. É preciso se inscrever para participar das promoções.

Meirelles citou outros pré-candidatos, mas sem a mesma ênfase que deposita no apresentador. O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa também é citado entre as caras novas e de centro. Para Meirelles, o ex-ministro veio de baixo e construiu a vida pela meritocracia, tendo sido o primeiro a pôr os corruptos na cadeia.


O ex-governador Ciro Gomes (PDT) pode ter méritos para divulgar. Serviu a dois presidentes (Itamar Franco e Lula), o que mostraria que ele serviu a pessoas mais do que aos partidos, afirmou. As políticas bem sucedidas de gestão da educação no Ceará em seu governo (1991-1994) e no do irmão, Cid Gomes (2007-2014) são outro ponto positivo.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, também atuou em duas gestões, de Lula e de Michel Temer. Ele pode afirmar na campanha que o programa Bolsa Família foi fruto da estabilidade econômica da qual ele participou e que permitiu o investimento no social. Agora, a estabilidade não é tão simples de incutir no eleitor. Segundo o entrevistado da Locomotiva, a inflação de 2017, que fechou em 2,95%, abaixo do piso da meta fixada pelo governo em 3%, não é vista como vantagem porque os preços não caíram, apenas aumentaram menos. "O poder de compra não subiu", afirma.

Apesar de tantos nomes, a pesquisa indica que 65% dos brasileiros votam para presidente da República por exclusão e apenas 25% por afinidade; 9% não responderam.

No mesmo patamar do desagrado aos políticos, a reação dos brasileiros indica que 89% afirmam ter xingado ou falado mal de algum representante. A agressividade diminui quando a pergunta é "O que acham de um político que fala mal de um adversário?". Para 73%, quem critica adversários não tem proposta; para 71%, só está interessado em ganhar a eleição; e apenas 17% quer alertar a população sobre seu adversário.

Outro resultado do levantamento indica que os entrevistados não enxergam nos políticos os valores que enxergam neles mesmos. Entre os que concederam entrevista, 79% se consideram confiáveis, 78% honestos, 65% trabalhadores e 56% são preocupados com os outros. Os índices são todos abaixo de dez quando se trata dos políticos. Confiáveis 7%, honestos, 8%, trabalhadores, 9% e preocupados com os outros, 7%.

"As pessoas melhoram de vida graças a si mesmas, enquanto políticos 'estão me atrapalhando'", diz Meirelles, ao tentar explicar aquele dado da pesquisa. "Eu melhoro de vida graças a mim e os políticos não param de roubar", volta a interpretar. Neste cenário, o publicitário acredita que o deputado e pré-candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSC-RJ) cresceu na intenção de voto canalizando os ódio das pessoas, pela característica "antiestablishment" que ele representa. Meirelles aponta contradição no deputado: todo militar é por vocação nacionalista, enquanto Bolsonaro surge com discurso liberal.

O levantamento também apresenta opiniões contraditórias. A democracia é o melhor regime político para 52% dos entrevistados, mas ao mesmo tempo afirmam que o Brasil seria melhor se não tivesse partido político.

A pesquisa avaliou ainda o nível de percepção mais amplo do país. Pelos resultados, existe um quase consenso de que Brasil passa por uma crise da crise, com 96% das indicações. Somam 71% os que avaliam de forma negativa a situação econômica do país e para 59% a economia estava pior em 2017 do que em 2016. A situação econômica adversa leva 84% dos entrevistados a ter medo de perder o padrão de vida, mas para 66% (maior índice) a melhora de vida depende do próprio esforço. O governo federal aparece em quinto, com 22% e o momento do país com 19%. Mas as realidades se encaixam e a raiz da crise econômica é a corrupção dos políticos.

A pesquisa quantitativa foi realizada com 2006 entrevistas entre 15 de novembro e 15 de dezembro de 2017. A margem de erro é de 2,3%. A Locomotiva não faz pesquisa de intenção de voto, mas produz cenários políticos para clientes, entre eles Coca-Cola, Unilever, Facebook e Ibmec.

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