Com ou sem fator Lula, quadro econômico está longe de ser confortável
- O Estado de S. Paulo
Pelo tom e pelo conteúdo das manifestações, seja qual for o lado, a impressão que passa é que a economia do País vai mudar radicalmente depois desta quarta-feira, 24 de janeiro. Alguém desavisado pode até concluir que os grandes problemas serão instantaneamente resolvidos ou, o inverso, ficarão insolúveis, dependendo da decisão do TRF-4, de Porto Alegre. Com a provável condenação de Lula em segunda instância, a grande dúvida está centrada no placar e na sua influência sobre a manutenção da candidatura à Presidência. Conforme algumas interpretações, um resultado de três a zero pela condenação pode dificultar a sobrevivência do Lula-candidato, ainda que se projete um cenário de resistência petista até onde for possível, aproveitando toda e qualquer brecha jurídica.
Nos mercados e nos meios empresariais, só se pensa nisso. Tanto é que a Bolsa e o real resistiram ao rebaixamento da nota de crédito do Brasil pela agência S&P, que em outros tempos balançaria os mercados por vários dias. Até o destino da reforma da Previdência, quase obsessão para esses mesmos setores, e as condições do governo para levar adiante sua programação na economia foram momentaneamente deixados de lado.
É verdade que a permanência de Lula em primeiro lugar nas pesquisas eleitorais justifica a tensão pré-TRF. Com base nesses números, fica claro que, afastado oficialmente ou não da disputa, ele terá papel crucial nas eleições. Mas o que isso significa, na prática, é quase um mistério.
Mercados/empresas querem saber se haverá possibilidade real de sustentar a candidatura de Lula ou se a insistência do PT será uma aposta no “vamos até o fim, porque não há outra saída”. Por via das dúvidas, tentam se informar sobre o figurino com que Lula se apresentará ao eleitorado. Segundo reportagem publicada pelo [BOLD]Estado[/BOLD], “indiferente” ao julgamento, a equipe do candidato prepara uma nova edição da Carta aos Brasileiros, que dirigirá o foco para a classe média – e não para os mercados, como na versão de 2002 – e tentará apartar Lula do desastre econômico de Dilma.
Jogo político à margem, o fato é que, no dia seguinte da decisão do TRF, a vida na economia continuará como ela é. E não será uma vida fácil, independentemente do resultado. Turbulências nos mercados podem agravar – e muito – o quadro, mas as dificuldades, principalmente nas finanças públicas, já estão presentes e não são poucas. Há obstáculos para fechar a agenda essencial ao corte de gastos, notadamente para negociar, votar e aprovar a reforma da Previdência. E, em consequência, há incertezas sobre o cumprimento do teto de gastos, sobretudo a partir de 2019.
Mesmo em 2018, não se pode dizer que a situação das contas públicas seja confortável. Segundo relatório de janeiro da Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado, o conjunto de medidas em tramitação no Congresso que fazem parte do Orçamento de 2018, com impactos tanto nas receitas como nas despesas, representaria R$ 23,3 bilhões no resultado primário do período – e, nem bem o ano começou, quase um quarto desse valor já deve ser abatido das contas do governo. Ou porque não se encerrou a votação no Congresso de algumas medidas, como a cobrança de Imposto de Renda nos fundos de investimentos fechados, ou porque o Judiciário suspendeu a aplicação de outras, como o adiamento dos reajustes dos servidores públicos.
Além disso, alerta o IFI, há o risco de frustração da receita de R$ 12,2 bilhões prevista com a privatização da Eletrobrás, em razão do provável acirramento das reações contra a venda da estatal. A assinatura do decreto de privatização, na sexta-feira, está sendo vista mais como um sinal de determinação a ser exibido aos investidores presentes em Davos, na falta da reforma da Previdência. Mas daí a dizer que seu trajeto será sem atropelos, vai uma longa distância.
Convenhamos que é difícil fazer qualquer prognóstico sobre as votações de interesse do Planalto, tendo em vista o início de ano mais do que conturbado, marcado pelo impasse no preenchimento da vaga no Ministério do Trabalho, arrastado até o fim de semana, e pelo escândalo resultante do aparelhamento político da Caixa.
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