É digno de nota que, no mesmo dia, quinta-feira passada, duas das mais importantes instituições do País, o Exército e a Igreja Católica, tenham se manifestado a respeito das eleições vindouras, cruciais diante da enorme crise política e moral que o País enfrenta. As profundas incertezas que cercam o pleito decerto motivaram essas declarações oficiais, pois o quadro atual, de crispação e virulência, não recomenda otimismo. Talvez por esse motivo, tanto os militares como os bispos salientaram a necessidade de forjar alguma forma de união e pacificação, superando-se minimamente as diferenças, pois é a própria democracia que, em sua visão, estaria em risco.
Em nota lida por ocasião do Dia do Exército, o comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, disse que os brasileiros não podem “ficar indiferentes aos mais de 60 mil homicídios por ano, à banalização da corrupção, à impunidade, à insegurança ligada ao crescimento do crime organizado e à ideologização dos problemas nacionais”. Esses fatores, segundo o general, são “as reais ameaças à nossa democracia”.
Ao destacar como principais riscos para as instituições democráticas a banalização da corrupção, a impunidade e a transformação dos problemas nacionais em questões ideológicas, o comandante do Exército foi ao cerne da crise. A corrupção aprofunda a desigualdade e intoxica as relações sociais ao dar vantagens indevidas a quem detém o poder econômico e político, castigando aqueles que cumprem a lei.
Quando a corrupção contamina todo o Estado, como parece ter acontecido no Brasil, dissemina-se a sensação de que todos estão nela envolvidos, gerando descrença generalizada na política e esperança na ação de algum messias demagogo.
Já a “ideologização dos problemas nacionais”, como descreveu o general Villas Bôas, tem sido em grande medida responsável pelo crônico atraso do País. Decisões importantes, como as reformas econômicas, são adiadas ou descartadas depois de serem demonizadas pelas corporações que, a pretexto de defender os “direitos sociais”, se apoderaram do Estado e resistem a qualquer mudança desse status.
Tudo isso somado cria uma atmosfera de cizânia e desencanto, desautorizando qualquer otimismo com as eleições. Por isso, o general Villas Bôas enfatizou em sua mensagem que, “nas eleições que se aproximam, caberá à população definir, de forma livre, legítima, transparente e incontestável a vontade nacional”, e que, “definido o resultado da disputa, unamo-nos como nação”.
Um tom semelhante foi adotado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em sua 56.ª Assembleia-Geral. Sob o título Eleições 2018: compromisso e esperança, a entidade diz que, “neste ano eleitoral, o Brasil vive um momento complexo, alimentado por uma aguda crise que abala fortemente suas estruturas democráticas e compromete a construção do bem comum, razão da verdadeira política”. Por esse motivo, diz a nota, é necessário “discernimento e compromisso de todos os cidadãos e das instituições e organizações responsáveis pela justiça e pela construção do bem comum”.
Para a CNBB, a própria política tem sido responsável pelo seu descrédito, “devido à corrupção e à falta de boas políticas públicas”. E a entidade igualmente se mostrou preocupada com a polarização e a radicalização, “que produzem posturas antidemocráticas, fechadas a toda possibilidade de diálogo e conciliação”. Nesse cenário, as eleições de outubro têm de servir, diz a CNBB, “para que o Brasil reafirme a normalidade democrática” e “supere a crise institucional vigente”, pois só assim será possível restabelecer “a confiança e a esperança tão abaladas do povo brasileiro”. Deve-se perseguir “o bem maior do País, para além de ideologias e interesses particulares”.
Ambas as mensagens, do Exército e da Igreja, são poderosos documentos sobre a gravidade da crise que o País atravessa. Em igual medida, porém, são expressões de esperança na política como único mecanismo capaz de superar democraticamente os agudos impasses nacionais.
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