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- Revista IstoÉ
Os infortúnios do Brasil são positivos. Não que eu seja masoquista ou sádico. O sofrimento faz parte do crescimento das nações
Seria viável dizer que existe um lado bom nos infortúnios? Para Nietzsche, sim. Segundo Alain de Botton, ele “viu nas dificuldades um pré-requisito decisivo de satisfação e concluiu que as formas açucaradas de consolação eram, em sua essência, mais cruéis do que úteis”. Seria a velha máxima das academias de ginástica: “No pain, no gain”?
Os infortúnios do Brasil são positivos. Não que eu seja masoquista ou sádico. O sofrimento faz parte do crescimento das pessoas e das nações. Para nascer, o pinto faz um esforço sobre-humano para quebrar a casca do ovo. O bebê também sofre ao sair do útero da mãe. O mundo não cresce por meio de cesarianas facilitadoras.
O Brasil sofre como parte natural do amadurecimento das nações. E as nações fortes, assim como os pitares de navio, aprendem com as dificuldades. Coreia do Sul e Japão floresceram após guerras trágicas. A Europa pós-Segunda Guerra Mundial se uniu. Os desastres do mundo foram pedagógicos para as nações.
O Brasil foi poupado pelas circunstâncias dos desastres que assolaram outras grandes nações. Não temos desastres naturais recorrentes, como terremotos e furacões. Nem temos vizinhos hostis com projetos de expansão à nossa custa. Não temos nazistas nem norte-coreanos por perto.
A maioria esmagadora dos desastres em nosso meio são de produção nacional. De nossa própria autoria. Nesse ponto, somos muito parecidos com os argentinos. O Rio de Janeiro está como está por conta das decisões de suas elites, onde se incluem a mídia, os intelectuais e os empresários que restaram.
São Paulo teria todas as condições para estar em situação pior que a do Rio de Janeiro. Não está porque as decisões tomadas pelos paulistas foram bem melhores que as decisões dos cariocas e dos fluminenses nos campos político, cultural e enconômico. Simples assim.
O Rio de Janeiro vai renascer lindo e forte. Como um Japão pós-explosão nuclear. Mas não agora. Terá de sofrer muito ainda para fazer a sociedade tomar pé da situação e se organizar. Não a partir de velhos chavões de uma esquerda conservardora ou de uma direita corrupta — ambas clientelistas. Novas forças devem emergir.
Mas melhor do que crescer com os desastres é escapar deles. Na linha do que disse o genial Gustavo Cerati: “Electrizado le escapé (…) De que desastre me salvé (…) En buena hora me solté.” Meus filhos me deram essa música de presente em uma situação difícil. Foi uma lição “nietzschiana” de filho para pai que muito me serviu.
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Murillo de Aragão é cientista político
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