sexta-feira, 11 de maio de 2018

César Felício: A conspiração a favor de Jair Bolsonaro

- Valor Econômico

Desarrumação política pode levar deputado ao 2º turno

O mundo político brasileiro parece conspirar a favor de Jair Bolsonaro. O candidato da extrema-direita tem teto baixo, está empacado nas pesquisas na faixa de 20% há algum tempo, trafega em uma faixa muita estreita de diálogo com a sociedade, mas os movimentos das forças adversárias o tornam competitivo.

A variável Bolsonaro começou a existir na onda de inconformismo desencadeada em 2013 e foi cevada pela eleição presidencial que dilacerou o país, em 2014. Não foi a troco de nada que teve na ocasião 464 mil votos, três vezes e meia superior à votação obtida em 2010. Foi a terceira maior do país, atrás de Celso Russomanno e Tiririca e um pouco à frente do pastor Marco Feliciano. Cada um em um partido, cada história muito própria, mas todos resultando em um samba único. Outras notas iriam entrar, mas a base era uma só: uma espécie de voto de protesto desideologizado.

O andamento da Operação Lava-Jato e o aprofundamento da crise econômica aguçou o anti-esquerdismo. O envolvimento do presidente Michel Temer e do senador Aécio Neves em denúncias de corrupção sedimentou um clima de falência da democracia, que culminou na aceitação por parte da população de um golpe militar em determinadas circunstâncias, como mostrou nesta semana o repórter Ricardo Mendonça ao relatar resultado da pesquisa do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia, coordenada por quatro universidades brasileiras. Deslegitimou-se tanto o sucessor de Dilma quanto a alternativa ao PT em 2014.

A prisão fez com que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o senhor de todos os caminhos do PT, ficasse emparedado no sentido literal e figurado. A carta que destinou à presidente nacional petista, senadora Gleisi Hoffmann, deixa claro que é preciso manter a pseudocandidatura presidencial para que possa usar a vestimenta de preso político. Sua condição pessoal conspira contra a construção de um projeto de poder para a esquerda. Todos os nomes deste campo estão sem chão para se firmar.

A porta para um "outsider" foi fechada com a renúncia de Joaquim Barbosa a exercer este papel. Ele se queixou em entrevista a Maria Cristina Fernandes de que há um sistema para cercear escolhas, ainda que este sistema estivesse aberto para acolher a ele, uma vez que havia encontrado guarida em um partido de porte considerável, não um nanico qualquer. A maneira como Barbosa optou em ausentar-se da disputa, questionando a representatividade da democracia, aumenta ainda mais o desprestígio do regime que vigora no Brasil desde 1985.

Sobra Alckmin. A aposta de Geraldo Alckmin e de todos os partidos do Centrão, aí incluídos o MDB e do DEM, é que nada disso - a Lava-Jato, a crise econômica, a desmoralização das instituições - será levado em conta na hora do voto. É uma profissão de fé em uma visão estruturalista do processo, imune à conjuntura, em que a eleição se resolve como uma equação matemática. Se o candidato consegue somar o maior tempo na televisão a um exército de governadores, deputados e prefeitos a seu serviço, tudo regado com muito dinheiro do fundo partidário, pode sustentar o fogo que a vitória é certa.

O problema é que estas forças não conseguem se unir para proporcionar o passeio do tucano e a resiliência do establishment. No momento este setor está dividido em nada menos que sete candidaturas: além da de Alckmin, ainda há Henrique Meirelles, Flávio Rocha, Rodrigo Maia, Guilherme Afif Domingos, Paulo Rabello de Castro e Alvaro Dias.

Quadro pulverizado, ausência de nomes novos e enorme desgaste do PSDB e do PT são todos fatores que atenuam as fragilidades da candidatura do ex-capitão. Se seu teto é baixo, tudo indica que seu piso é alto. Bolsonaro avança com o tropeço dos demais. "Eu não sou bom, os outros é que são ruins", gracejou o deputado ontem, em Belo Horizonte.

Ele ganha chances reais de ir ao segundo turno. Pode-se argumentar que aí estará uma barreira eficaz contra sua candidatura, uma vez que a necessidade de maioria absoluta visa justamente a bloquear a ascensão de radicais. É algo a conferir, a depender de quem terçará armas contra ele. Por enquanto, o segundo turno é arma poderosa contra o presidenciável do PSL.

De acordo com o último Datafolha, 31% do eleitorado rejeita Bolsonaro, ante 29% que o faz em relação a Alckmin, 23% recusa Ciro, 22% rechaça Marina. Nas simulações de segundo turno, Bolsonaro só suplantaria o eventual plano B do PT, seja Fernando Haddad ou Jaques Wagner.

Renovação malaia
A resposta eleitoral de um país a um escândalo de corrupção pode adquirir contornos surpreendentes. Na Malásia, as eleições da quarta-feira deram pela primeira vez em 60 anos a vitória à oposição, representada por Mahathir Mohamad, que aos 92 anos, tornou-se o primeiro-ministro mais velho do mundo. Ele já havia ocupado a chefia do governo entre 1981 e 2003, mas rompeu com o então primeiro-ministro em 2015 e formou seu próprio partido político. De acordo com o jornal "The Guardian" está na agenda de Mohamad dar um indulto a um outro opositor, o ex-ministro de Finanças Anwar Ibrahim, que cumpre pena por sodomia. O novo primeiro-ministro foi explícito em dizer que indultará Ibrahim para que ele possa substitui-lo como primeiro-ministro em futuro próximo. A mulher de Ibrahim foi a parceira de Mohamad na chapa.

A vida política da Malásia entrou em convulsão há três anos por causa de um grande escândalo financeiro, em que US$ 2,6 bilhões foram desviados do fundo estatal de desenvolvimento estratégico, conhecido pela sigla 1MDB, bastante sugestiva em português, mas cujo significado é primeiro fundo malaio de desenvolvimento. Parte do dinheiro teria beneficiado, segundo as acusações, o próprio primeiro-ministro derrotado na eleição de quarta, Najib Razak. A escolha do eleitorado da Malásia não foi por algo novo, muito menos por um outsider, mas nem por isso o escândalo deixou de cobrar seu preço na história local.

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