- Folha de S. Paulo
O que mais preocupa no atentado contra Jair Bolsonaro é a possibilidade de o episódio consolidar no país um ciclo de violência política. Nos últimos anos, temos visto seguidos episódios de violência ameaçarem o funcionamento regular da democracia brasileira. Esse funcionamento “regular” nunca foi desprovido de violência política, mas ela parecia restrita ao interior do país, ao chamado Brasil profundo.
Em 2007, a jornalista Natália Viana mapeou os assassinatos políticos no livro “Plantados no chão” (Ed. Conrad), que mostrava que o fim da ditadura não tinha posto fim à violência política, sobretudo no campo. Foi também no Brasil profundo onde aconteceu a maior parte dos assassinatos de jornalistas compilados nos relatórios anuais da ONG “Repórteres sem fronteiras”. Pois é esse padrão de violência política circunscrita a regiões afastadas que parece ter mudado.
Desde o início do processo de polarização, vimos suceder casos de violência política cada vez mais graves nas grandes cidades: vários atentados a bomba contra sedes do PT em São Paulo e Curitiba, a agressão a um empresário antipetista em frente ao Instituto Lula, os tiros disparados contra a caravana do ex-presidente Lula no Paraná, os tiros disparados contra o acampamento pró-Lula em Curitiba, a agressão a jornalistas no sindicato dos metalúrgicos em São Bernardo e o assassinato de Marielle Franco, crime gravíssimo que ainda não foi esclarecido.
Se a simples enumeração desses episódios não assusta, convido o leitor a olhar em volta, na nossa região e refletir sobre os ciclos de violência consolidados na Venezuela, na Colômbia e no México. A grande dificuldade de interromper esses ciclos é que, a cada volta, eles se reforçam num processo de retroalimentação. Cada novo episódio é um revide a um episódio anterior e cada lado acusa o outro de ser o responsável por ter dividido o país e começado as agressões.
Está na hora de as lideranças dos dois campos refletirem e controlarem os mais exaltados antes que seja tarde demais.
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