Denúncias de malfeitos, comprovadas ou não, são arma conhecida na disputa partidária
"Eu também sou réu no Supremo, e daí?" —assim reagiu o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), a informações publicadas por esta Folha acerca das relações de sua futura ministra da Agricultura e a JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista.
Quando ocupava uma secretaria do governo de Mato Grosso do Sul, a deputada Tereza Cristina (DEM) concedeu incentivos tributários à empresa, para a qual também arrendava uma propriedade.
A partir de delação da JBS, a política estadual de benefícios está no centro de uma apuração sobre pagamento de propina, mas a parlamentar não é alvo de inquérito.
Mais reveladora foi a declaração de Bolsonaro diante de questionamentos sobre o escolhido para a pasta da Saúde, também motivados por reportagem deste jornal.
"Nem é réu ainda", disse, a respeito de Luiz Henrique Mandetta, também do DEM sul-mato-grossense, investigado por suspeita de fraude em licitação, tráfico de influência e caixa dois em um projeto de informatização no estado.
O presidente eleito —que responde a ação por incitação ao estupro no Supremo Tribunal Federal— experimenta o inevitável conflito entre a pregação moralizadora da campanha eleitoral, quando prometia cadeia a adversários, e as condições objetivas para a formação da equipe de governo.
Entre citados em delações, investigados, réus e condenados, nomes de quase todo o espectro partidário nacional estão envolvidos nas operações de combate à corrupção deflagradas nos últimos anos.
Bolsonaro, que explorou com habilidade o sentimento de indignação popular, tem agora a ingrata tarefa de distinguir a gravidade e as circunstâncias de cada caso.
Nem mesmo o principal ícone da Lava Jato, o ex-juiz Sergio Moro, escapou de tal destino. Na condição de próximo ministro da Justiça, teve de minimizar o fato de seu futuro colega de gabinete, Onyx Lorenzoni (Casa Civil), ter recebido dinheiro da JBS pelo caixa dois.
Denúncias de malfeitos, comprovadas ou não, são arma conhecida na disputa partidária nacional. O PT —cujo candidato ao Planalto, Fernando Haddad, acaba de se tornar réu sob acusação de corrupção— destacava-se no uso de tal expediente nos anos 1980 e 1990.
Mais tarde, a legenda culparia o sistema político pelos crimes cometidos no governo. Por frágil que se mostre a desculpa, será instrutivo ver como o neófito Bolsonaro vai lidar com o mesmo sistema.
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