Por Vandson Lima, Fabio Murakawa e Malu Delgado | Valor Econômico
BRASÍLIA - A consolidação de Renan Calheiros como o mais provável candidato do MDB à presidência do Senado provocou ontem uma reação de partidos de centro e esquerda, com protagonismo do PSDB, para apresentar uma candidatura capaz de derrotar o senador alagoano. O movimento contou com a participação direta do governador de São Paulo, João Doria (PSDB).
A articulação pode resultar no afunilamento da disputa, hoje com 10 nomes colocados, para três candidaturas: de Renan, Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Davi Alcolumbre (DEM-AP). Se este quadro se confirmar, é possível que o Senado tenha uma disputa em segundo turno, o que nunca aconteceu.
Doria atuou para dissuadir o PSD de uma aliança com Renan. O governador convenceu o ex-ministro Gilberto Kassab, a quem convidou para comandar a Casa Civil em São Paulo, a assegurar a liberação da bancada.
O partido de Kassab tornou-se a segunda maior bancada do Senado, com 10 parlamentares, após as filiações de dois senadores eleitos pelo PTB. Renan acenava ao PSD com postos de peso na Casa, como a vice-presidência, caso sua chapa contemplasse a "proporcionalidade" dos partidos no Senado. Doria procurou bloquear essas tratativas.
Na sequência, Doria procurou Tasso. A leitura dos tucanos foi de que Simone Tebet (MS), adversária de Renan na eleição interna do MDB, perdeu terreno após a reunião da sigla, na terça-feira.
O PSDB havia garantido a ela que, caso superasse Renan, teria o apoio tucano na eleição da presidência do Senado. Mas ela se indispôs com boa parte da bancada após defender que a eleição do Senado seja com voto aberto - o regimento diz que o voto é secreto e o MDB defende manter as regras como estão. Isolada, Simone renunciou à liderança do partido.
Completando sua articulação, Doria ligou ontem para Simone. Disse que os tucanos ainda veem a candidatura dela com simpatia, mas que a decisão do MDB, que só será dada após reunião da bancada hoje, no fim da tarde, a menos de 24h da eleição, obrigava outras correntes políticas a buscar alternativas.
Na manhã de hoje, pelo menos oito prováveis candidatos devem participar de uma reunião em um hotel de Brasília para definir que candidaturas devem sobreviver e qual delas é mais forte e capaz de derrotar Renan.
Tasso, segundo interlocutores, aceita ser candidato, mas apenas se estiver seguro de que soma votos para vencer Renan em qualquer circunstância, seja com voto aberto ou fechado. Além dos oito votos do próprio partido, ele buscaria os 10 do PSD e 14 do bloco dos partidos à esquerda - exceto o PT (Rede, PPS, PDT e PSB). Com estes 32 votos encaminhados, Tasso trabalharia na sequência para angariar insatisfeitos do MDB, como a própria Simone, que não votarão em Renan; e apoios de senadores com viés mais governista. Com isso, Tasso e Doria acreditam poder alcançar uma margem suficiente para desbancar Renan Calheiros na eleição à Presidência do Senado.
O senador eleito Cid Gomes (PDT-CE) disse que o bloco formado por PDT, Rede, PPS e PSB tem "conversas adiantadas" com o PSDB de Tasso e admitiu a possibilidade de apoio ao tucano, um ex-aliado que se converteu há muitos anos em adversário político local dos Ferreira Gomes no Ceará.
Segundo Cid, uma decisão só deve ocorrer amanhã ou até mesmo na sexta, poucas horas antes da eleição. "O adiamento da escolha do MDB acaba provocando indefinições nos outros partidos também", afirmou.
A união de várias forças políticas para derrotar Renan Calheiros é justificada, segundo os senadores envolvidos nas articulações, como uma resposta concreta da classe política aos eleitores que consideram que Renan encarna a "velha política" e as negociatas do poder.
O alagoano, que agora se define como "o novo" e liberal, passou a dizer publicamente, por exemplo, que não acha procedente uma investigação contra Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), senador eleito e filho do presidente Jair Bolsonaro, no Conselho de Ética do Senado.
Flávio e outros 27 deputados estaduais do Rio de Janeiro são investigados pelo Ministério Público por improbidade administrativa, suspeitos de integrar um esquema de corrupção na Assembleia Legislativa do Estado (Alerj). "A vitória de Renan dificultaria ainda mais o caminho do Senado em busca de recuperar a credibilidade e a institucionalidade", definiu ao Valor um dos pré-candidatos ao comando da Casa. As negociações para derrotar a simbologia da velha política encrustada em Renan Calheiros são impulsionadas por uma renovação parlamentar histórica na Casa.
Das 54 cadeiras que estavam em disputa em outubro, o Senado renovou seus nomes em 46 delas. "Será uma votação muito discutida, que vai testar se a renovação do Senado foi ou não de postura, ou só de idade. Será uma grande prova de fogo, e vamos ver se os novatos querem, de fato, dar publicidade a seus atos", afirmou o novato Rodrigo Cunha (PSDB-AL), ex-deputado estadual, adversário local de Renan em Alagoas e uma das principais apostas do PSDB na nova geração de políticos.
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