sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

Militares são moderadores na crise do PSL

Por Andrea Jubé, Carla Araújo e Fernando Exman | Valor Econômico

BRASÍLIA - A cúpula militar interveio na crise envolvendo o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, como um "poder moderador". A ideia é impedir que uma "filhocracia", com o presidente da República sujeito à instabilidade familiar, possa pôr em risco a credibilidade do governo.

Enquanto os militares se movimentam nos bastidores para acalmar os ânimos, o ministro da Justiça, Sergio Moro, tenta mostrar que Bolsonaro não teme o avanço das investigações sobre denúncias de desvios de R$ 400 mil do fundo partidário do PSL para financiar candidaturas laranjas nas eleições de 2018.

A bancada do PSL na Câmara está dividida sobre o desfecho das divergências entre Bebianno e o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente. Uma ala dos deputados acha que ele deveria ser demitido. Outra, teme que o ministro, um dos principais aliados de Bolsonaro na campanha, possa "cair atirando".

Militares alertam para risco de demissão de Bebianno
A cúpula militar interveio na crise envolvendo o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, como um "poder moderador", a fim de alertar para os riscos de que um governo que pretende promover reformas estruturantes, como a previdenciária, seja reduzido a uma "filhocracia", com o chefe do Executivo sujeito à instabilidade familiar. Com o governo dividido em alas que defendem a permanência de Bebianno no cargo, e outras que exigem sua saída imediata, um grupo de generais atua para arrefecer os ânimos e tutelar as ações do presidente Jair Bolsonaro. Há preocupação na caserna, também, com os riscos políticos da demissão de Bebianno.

Enquanto os militares se movimentam nos bastidores, coube ao ministro da Justiça, Sergio Moro, mostrar que o presidente Bolsonaro não teme o avanço das investigações sobre denúncias de desvios de pelo menos R$ 400 mil do fundo partidário do PSL para financiar candidaturas-laranjas nas eleições de 2018.

Ontem, Moro confirmou a determinação do presidente para que a Polícia Federal investigasse as acusações que miram seu partido. "O presidente proferiu uma determinação e a determinação está sendo cumprida. Os fatos serão apurados e eventuais responsabilidades, após a investigação, serão definidas", disse Moro, após participar de um evento com juízes em Brasília.

No esforço para continuar no cargo, Bebianno divulgou uma nota de esclarecimento ontem à noite. Afirmou que o presidente Bolsonaro nunca ocupou cargo de direção no partido, e não tem nenhuma relação com outras candidaturas. Afirma que seu trabalho foi executado com transparência e lisura. Ele ressalva que não era sua atribuição fazer contatos com fornecedores, a não ser aqueles relativos à campanha presidencial. Explica que os repasses às supostas candidatas laranjas foram feitos pelo Diretório Estadual do PSL em Pernambuco, sobre o qual ele não teria ingerência. Ao fim, reafirma seu compromisso com a "ética e o combate à corrupção".

Um militar de alta patente que despacha no Palácio do Planalto reconheceu que é preciso dar limites aos filhos do presidente, especialmente pelo fato do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) ter o controle sobre as redes sociais do presidente. Segundo essa fonte, Bolsonaro precisa respeitar a liturgia do cargo, enquanto Carlos deveria ter "a boca costurada" e "os dedos amarrados" para evitar novos episódios como o que culminou na crise em torno da possível demissão de Bebianno. Carlos chamou Bebianno de mentiroso, e horas depois Bolsonaro foi a público endossar a acusação do filho ao seu auxiliar.

"É uma situação desagradável que precisa ser resolvida", admitiu ontem ao Valorum general da cúpula do governo. Ele afirmou que o momento pede atenção a temas mais relevantes e produtivos. Outro auxiliar do presidente, que tem proximidade com a família Bolsonaro, pondera que caberá ao presidente, dentro de casa, impor limites aos filhos. A avaliação de que "roupa suja se lava dentro de casa" é consenso na caserna.

Para interlocutores do presidente, o ideal era que a crise tivesse seu desfecho ainda na quarta-feira, para que o retorno de Bolsonaro a Brasília não fosse marcado pela turbulência política. A cúpula militar pondera que a demissão de um ministro envolvido em suspeitas de corrupção não é fato inédito em governos, mas a resistência de Bebianno deu sobrevida à crise.

Expor Bebianno à fritura pública foi um erro, alegam integrantes da ala militar. Agora, demiti-lo e abandoná-lo à própria sorte pode trazer consequências piores. Um oficial que já conviveu com Bolsonaro e tem experiência parlamentar pondera que seja "quase certo" que as contas do partido tenham erros e eventualmente ilícitos. "Bebianno é um homem que sabe demais."

Ontem Bebianno cancelou os dois principais compromissos, que estavam confirmados desde a semana passada: a solenidade de posse do novo chefe do Centro de Comunicação Social do Exército (CComsex), general Richard Fernandez e a participação na reunião para discutir a crise na Venezuela com os ministros da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, do GSI, general Augusto Heleno, da Secretaria de Governo, general Santos Cruz, um representante do Ministério das Relações Exteriores, e William Popp, encarregado de negócios da Embaixada dos Estados Unidos.

A exemplo do que já tinha feito na noite de quarta-feira, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) saiu ontem em defesa de Bebianno, no Recife. "Eu tenho uma ótima relação com o ministro Bebianno, acredito que ele tem muitas condições de ajudar não apenas na Previdência, mas na articulação do governo com o parlamentares e outros segmentos da sociedade", disse.

Maia, entretanto, negou que tenha conversado com o ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre um possível prejuízo ao andamento da reforma no caso da eventual demissão de Bebianno. "Só vamos votar a Previdência lá para o final de maio início de junho. Tenho certeza que com o retorno do presidente à Brasilia vai organizar nem sua articulação política na aprovação de um texto que garanta justiça social e segurança jurídica", disse depois de conversa com o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB) sobre reforma da Previdência. (Colaboraram Isadora Peron, de Brasília e Marina Falcão do Recife)

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