sexta-feira, 31 de maio de 2019

PIB recua e sinaliza outro ano de baixa expansão: Editorial / Valor Econômico

As estatísticas sugerem que pior que os resultados do Produto Interno Bruto do primeiro trimestre (-0,2%), só os do próximo. A economia brasileira está atolada na rota do baixo crescimento há nove trimestres, depois de uma recessão brutal por outros 11 trimestres, que produziu uma redução de 8,1% do PIB. Com essa performance medíocre, fatos negativos internos ou externos podem tornar esse desempenho ainda mais modesto. Em apenas cinco meses, o que parecia ser o piso do crescimento para o ano, de 1%, tornou-se um teto - que pode sequer ser atingido.

2019 já foi atingido pelo baixo carregamento estatístico de 2018, quando, no último trimestre, ficou claro que a economia estava perdendo fôlego. Com o recuo de 0,2% em relação ao fim do ano passado, o PIB precisará crescer 0,5% nos próximos três trimestres para atingir pífio 1%. Desde o fim da recessão, porém, no quarto trimestre de 2016, a média de expansão é de 0,4% (Gilberto Borça Jr., Valor, 26 de abril). Tanto pelo lado da oferta como do consumo, não há fatores visíveis de estímulo que deem impulso a maior expansão.

A produção industrial desacelera desde o terceiro trimestre de 2018, como boa parte dos setores econômicos, após a greve dos caminhoneiros. Nos primeiros três meses do ano, caiu 0,7% em relação ao trimestre anterior. A indústria extrativa, com um tombo de 6,3% em relação ao fim de 2018, influiu muito no resultado. Este número pode ser pior diante da perspectiva de rompimento de novas barragens em Minas Gerais. Em seguida, entre os comportamentos ruins, está a indústria da construção, com -2%, em uma sequência de cinco anos sem resultados positivos. A indústria de transformação também vai mal, jogando para baixo o desempenho de parte dos setores de serviços que dela dependem, como transporte, armazenagem e correio, que encolheram 0,6% neste trimestre contra o imediatamente anterior.

O consumo das famílias, com peso de 64,3% no PIB, dá sinais de perda de força. Cresceu 0,3% agora, mas tinha avançado 0,6% e 0,5% nos dois trimestres anteriores. O desemprego de 13,1 milhões de pessoas (12,4%) impede avanço expressivo da massa de salários. O aumento temporário da inflação, provocado por alimentos, enterrou a pequena variação real positiva dos salários que ainda se observava no último trimestre de 2018. Incertezas quanto à permanência no emprego e endividamento excessivo ajudaram a frear o consumo. No acumulado de quatro trimestres, ele consumo recuou de 1,9% para 1,5%.

Diante da demanda estagnada e da alta capacidade ociosa seria demais esperar uma boa reação do investimento. Após ensaiar expansão vigorosa no terceiro trimestre (5,7%), voltou a ficar negativo em 2,4% no fim de 2018 e um pouco menos negativo agora, -1,7%. Além disso, o setor externo, com avanço das exportações menor que o das importações, passou a retirar pontos do PIB. Apenas expectativas positivas não serão capazes de mover os investimentos (FBCF), hoje de 15,5% do PIB, para cima no curto prazo. O que move a expectativa hoje é a reforma da previdência, cuja aprovação se prevê apenas para o início do terceiro trimestre.

Uma diferença relevante entre a lenta recuperação de agora e as rápidas respostas a intervalos recessivos desde pelo menos 2000 está na ausência de estímulos contracíclicos da política fiscal. A União perdeu toda a capacidade de fazê-lo, imersa que está em déficits altos há cinco anos - e com a perspectiva de eliminá-los, com algum otimismo, só em 2022. O consumo do governo (19,7% do PIB) em quatro trimestres é de -0,1%. Diante da penúria de recursos, os investimentos públicos foram comprimidos pelos gastos obrigatórios, mais uma vez, e com muito mais força do que antes.

Nenhum dos instrumentos que estão sendo manejados pelo governo têm efeitos a curto prazo - nem as reformas nem os ajustes microeconômicos que trazem ganhos de produtividade. O investimento privado em infraestrutura pode ter força contracíclica, mas depende de regulação e licitações que têm demorado. O crédito público está encolhendo no bolo total, especialmente os do BNDES.

O ministro Paulo Guedes, diante do PIB decepcionante, acena com liberação de FGTS e Pis-Pasep, que têm bons efeitos sobre a demanda, mas de curta duração. Pode ser uma forma de o governo mostrar que não está passivo diante da letargia econômica, cuja responsabilidade está sendo lentamente transferida para seus ombros e para a popularidade do presidente. Quanto ao crescimento, o ano parece perdido.

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