- Folha de S. Paulo
Presidente quer dinheiro extra para 'fazer algo'; Guedes e Maia dizem não, por ora
Jair Bolsonaro pediu mesmo a seus economistas que estudem a revisão do teto de gastos. O presidente insinuou a ideia, na manhã desta quarta-feira (4), confirmada de tarde por seu porta-voz e por gente do Planalto.
Qualquer que seja a solução que o governo encaminhe, haverá risco de tumulto, do político ao financeiro. A primeira tentativa será a de acelerar as medidas de contenção de despesa obrigatória, que não devem entrar em vigor a tempo de evitar penúrias.
Até uma meia dúzia de economistas-padrão (“ortodoxos” etc.) aceita a hipótese de rever o teto antes de 2026, data prevista na lei. Mas essa autorização de gasto extra, dizem, deveria ser limitada ao aumento da despesa em obras e reavivar o crescimento, não em gastos correntes do governo.
Dado o limite constitucional para o crescimento da despesa total, o crescimento da despesa obrigatória (Previdência, salários etc.) deixa cada vez menos dinheiro para investir em estradas ou pagar a conta de luz dos quartéis, no comentário característico de Bolsonaro.
O ministro Paulo Guedes (Economia) e companhia como de costume responderam que é possível evitar a paralisação de partes do governo a partir de 2020 com medidas que evitem o crescimento das despesas obrigatórias. Bolsonaro retrucou que é preciso não apenas limitar o gasto obrigatório mas também abrir um espaço para o “governo poder fazer alguma coisa”.
Guedes quer diminuir o tamanho do funcionalismo federal, na prática algo muito difícil de fazer hoje em dia, e reduzir o gasto com salários. Para facilitar o expediente, precisa de uma emenda constitucional, que dificilmente passaria neste ano, se tanto.
A esse respeito, é instrutivo notar que uma economia radical com servidores ainda seria insuficiente, dado o tamanho da penúria.
A despesa com folha (ativos e aposentados, civis e militares) está crescendo ao ritmo anual de R$ 16 bilhões. É o dinheiro que o pessoal da Economia está catando neste ano apenas para evitar desastres como não haver dinheiro para universidades ou pagar o serviço de tecnologia de informação para o governo.
Para que houvesse economia relevante, seria preciso congelar a despesa com folha de pessoal por uns três anos, sem aumento nem pela inflação. Difícil.
Guedes quer acabar com o reajuste obrigatório de qualquer despesa, como se sabe. Por exemplo, o gasto federal mínimo com saúde e educação é reajustado pela inflação. Para dar cabo disso, quer propor em breve outra emenda constitucional.
O governo não consegue fazer superávit primário (receita maior do que despesa, afora juros) desde 2014 e tão cedo não conseguirá. O teto foi uma espécie de moratória do superávit. Estava fadado a ser furado, sabia-se desde 2016, mas o fracasso da reforma da Previdência em 2017 e o fiasco do crescimento anteciparam a hipótese de desabamento.
“Um dia, chega-se lá, ao superávit, paciência, temos o teto, um método de ajuste de contas gradual, mas obrigatório”, era a ideia vendida aos credores, que a aceitaram (tanto que as taxas de juros ficaram comportadas). Se o governo propuser um furo no teto, o que vai se passar com juros e câmbio?
Rodrigo Maia, presidente da Câmara, “premiê” das reformas, aliado de Guedes no assunto, diz que vai recusar a revisão do teto, embora lideranças do Congresso tenham ficado animadas com a ideia.
A dúvida é: se essa conversa continuar, Guedes e equipe vão rever a posição ou vão embora?
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