- O Estado de S.Paulo
O vaivém do BC causa ruídos. O Fed adotou uma sinalização firme, concorde-se ou não
A próxima decisão do Copom sobre a taxa Selic se transformou num debate polêmico e acirrado acerca do dilema que a autoridade monetária enfrenta neste momento de crise internacional, deflagrada pelo impacto do surto do novo coronavírus na economia global e pela guerra de preços do petróleo entre Rússia e Arábia Saudita.
O dilema do Banco Central é o seguinte: cortar a Selic, colocando pressão sobre o dólar ao reduzir o diferencial de juros entre o Brasil e o exterior, em particular as taxas praticadas nos Estados Unidos, ou manter os juros inalterados em 4,25% e não desancorar o câmbio, mas deixar de injetar um necessário estímulo em meio à desaceleração da economia global e à resposta coordenada de redução de juros pelos bancos centrais mundiais.
Se há uma disputa ferrenha entre analistas e investidores sobre o Copom cortar ou não os juros, na reunião marcada para o próximo dia 18, a culpa é, em grande parte, do próprio BC, que vem emitindo sinais contraditórios sobre os próximos passos da política monetária, tornando a calibragem das expectativas confusa.
Basta lembrar que, no comunicado da sua última reunião, em fevereiro, o Copom sinalizou que interromperia o ciclo de corte de juros.
Em meio ao pânico com o coronavírus, no dia 3, logo depois que o Federal Reserve (Fed) fez um corte emergencial dos juros americanos em 0,50 ponto porcentual, o BC divulgou uma nota dizendo que “o impacto sobre a economia brasileira proveniente da desaceleração global tende a dominar uma eventual deterioração nos preços dos ativos financeiros”.
Foi a deixa para o mercado interpretar que o Copom cortaria juros em março, ficando a dúvida se a redução seria de 0,25 ou 0,50 ponto. Mas, na segunda-feira, o diretor de política monetária do BC, Bruno Serra, disse ser “importante reforçar que o atual estágio segue recomendando cautela para a política monetária”, o que alguns viram como um recuo da nota emitida na semana passada. Mais tarde, Serra voltou a amenizar o tom ao afirmar que, em relação a outros países, o BC brasileiro tem a vantagem de poder usar a política monetária.
Esse vaivém do BC causa ruídos. O Fed decidiu adotar uma sinalização firme de afrouxamento monetário, concordando-se ou não com a sua decisão.
Os que defendem a manutenção da Selic dizem que um corte de juros vai exacerbar a escalada do dólar, ao reduzir o fluxo de capital externo em busca de retornos mais elevados. E uma depreciação cambial pode colocar pressão de alta na inflação. Até agora, não se viu um repasse cambial indesejável aos preços.
Os que defendem um corte de juros argumentam que o diferencial de juros já está maior desde que o Fed fez o corte da taxa básica, para a faixa entre 1,0% e 1,25%. Além disso, são crescentes as apostas de que o Fed vai reduzir os juros em 1 ponto, para zero, na sua reunião também no dia 18.
Essa corrente de analistas diz que a redução do diferencial de juros explica apenas uma pequena parte da recente alta do dólar, com fatores domésticos (como a frustração no crescimento do PIB e o embate entre Jair Bolsonaro e o Congresso, minando as perspectivas para as reformas) e externos (valorização global do dólar) tendo influência maior.
Um renomado economista diz que sua projeção atual de crescimento do PIB brasileiro neste ano, de 1,5%, deve ser revisada para baixo por conta do impacto do coronavírus. Ele não descarta um crescimento de apenas 0,5% neste ano. Para ele, um corte da Selic, de 0,5 ponto, se faz necessário, uma vez que o governo não tem espaço fiscal para estimular a economia.
O choque do coronavírus, com a queda nos preços de commodities, em especial o tombo do petróleo, terá um efeito desinflacionário, ou até deflacionário, para o Brasil. Sem falar que, desde que a crise se agravou, houve um aperto considerável nas condições financeiras do País, o que pode contaminar os canais de crédito.
Se o Copom não cortar a Selic, estará endossando esse aperto num momento de desaceleração da economia. Quanto à disparada do dólar, a culpa não é dos juros: o BC precisa agir mais energicamente e anunciar uma intervenção cambial mais ampla.
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