- O Estado de S.Paulo
Estaria no Planalto a ferramenta para romper o impasse da governabilidade
Na gestão Jair Bolsonaro, por incrível que pareça, ainda existem pessoas que pensam estrategicamente. Isto significa, na crise permanente em que prefere atuar o chefe do Executivo, isolar no campo da propaganda eleitoral sua maneira excêntrica de exercer o poder. É indispensável evitar que a falta de lógica transborde e contamine a todos.
Enquanto o presidente faz política (a seu modo), enfrenta delírios persecutórios e arremessa bombas verbais nas instituições, sua retaguarda precisa oferecer condições objetivas de trabalho.
Retaguarda na política e, em especial, no Palácio do Planalto, pois a economia segue orientada. A urgência está em construir um canal de diálogo para votar as reformas enquanto o presidente se comporta como quiser. Estaria no Palácio do Planalto a ferramenta para romper o impasse da governabilidade.
Todos já sabem como atua o presidente e não adianta pensar em mudanças de personalidade. Por exemplo: ano passado, nesta mesma época, mas com epicentro em maio, o presidente convocou seus eleitores a irem às ruas, também contra o Legislativo e o Judiciário. Foram momentos decisivos do primeiro ano de mandato que ele repete agora e certamente triplicará no ano que vem, mais perto da campanha de reeleição.
Bolsonaro funciona testando limites. Este ano disputa com o coronavírus o título de quem pode mais. Se seus apoiadores destemidos enfrentarem aglomerações, o presidente colherá êxito total. Para não desestimular a tropa, já está, inclusive, provocando o adversário por exageros do alarme.
Sem base no Congresso, fortalecer o Palácio é a solução buscada para este momento.
A demissão do deputado Onyx Lorenzoni da Casa Civil foi um dos primeiros resultados dessas reflexões. Segue-se uma limpeza da equipe que o agora ministro da Cidadania levou para o Palácio. Com sua substituição pelo general Braga Netto (deu conta da intervenção no Rio, espera-se que dê conta da intervenção no Planalto), a expectativa é de que a Casa Civil adquira densidade administrativa e traquejo político para somar na negociação com o Congresso.
O sucesso do novo general do Planalto dependerá do tamanho da corda que o presidente lhe der. Seu currículo de sucesso nada valerá (o general Santos Cruz pagou para ver e perdeu), se o vereador Carlos Bolsonaro, derrubador de ministros, tiver algum dos seus interesses contrariados.
O general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, está vivendo uma espécie de crise, não identificada publicamente, a cuja existência seus próximos se referem quando os rompantes causam estranheza, como foi o ataque recente a deputados e senadores. Mas não vai sair. Visto como um estabilizador de humor de Bolsonaro, explode antes do presidente, neutralizando as reações do chefe. Permanecerá com o mesmo papel.
O general Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, está desequipado para realizar a tarefa que lhe cabe oficialmente, a de articulador político. Caiu na rede de Carlos Bolsonaro, de um lado, e ficou com fama de descumpridor de acordo, do outro. Sua situação no Planalto já é de sobrevivente. Se ficar, deve aumentar a equipe política que o assessora.
O Planalto tem hoje um homem forte, que permanecerá: o ministro Jorge Oliveira, da Secretaria-Geral. Ele coordena, por dentro, a Presidência e boa parte do governo. Tem acesso a Bolsonaro, já trabalhou no Congresso. É, hoje, quem melhor responde às expectativas das partes em conflito.
Mesmo com as mudanças pontuais em cogitação, continuará faltando o maestro, um coordenador dos coordenadores. Está aí o nó da reforma do Planalto. A questão é que Bolsonaro é permanente, não suscetível de substituição, e não gosta do papel que lhe cabe, com exclusividade.
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