Não haverá mais dinheiro para Saúde ou Educação sem enfrentar a voracidade da máquina pública
Para quem acompanha a situação dramática das contas públicas, não há surpresa na proposta orçamentária que circula por Brasília, prevendo para 2021 cortes de 13% na Saúde e 5% na Educação — pasta que, pela primeira vez, receberia menos dinheiro que a Defesa (também cortada em 5%).
É compreensível a revolta com um governo que tira dinheiro de onde ele é mais necessário. A Saúde teve de receber neste ano, em virtude da pandemia, mais de R$ 40 bilhões além dos R$ 135 bilhões orçados originalmente — e não há sinal de que o coronavírus dará trégua no ano que vem. A Educação também terá de compensar o atraso decorrente de um ano peculiar no ensino — no caso de muitos, um ano perdido —, para não falar nas deficiências históricas.
Governos estaduais também têm recorrido a propostas que ofendem a necessidade. Exemplo é o projeto do governo paulista que, se aprovado, resultará em cortes de pesquisas necessárias, entre tantas missões, ao combate à pandemia.
Se a revolta é compreensível, é essencial que ela se projete na direção correta. Qualquer orçamento — federal, estadual ou municipal — reflete as distorções do Estado brasileiro. A principal é o engessamento das despesas obrigatórias — desde 2010, elas cresceram de 75% para 94% do total, no caso federal.
Para espanto dos críticos contumazes do teto de gastos, as despesas sociais têm crescido consistentemente desde 2016, quando ele foi implantado, segundo uma análise do economista Alexandre Schwartsman com base em dados do Tesouro. Comparando 2019 a 2016, a Saúde recebeu 7% a mais em recursos, e a Educação manteve-se no mesmo patamar. A rubrica Proteção Social cresceu 7,6%. Tudo isso num período em que, em virtude do teto, o total gasto pelo governo federal caiu.
Para destinar mais dinheiro à Saúde e à Educação, é preciso entender a origem do problema. A raiz da falta de recursos não é o teto. São os gastos obrigatórios, em especial a folha de pagamentos do funcionalismo, que corresponde a quase 14% do PIB brasileiro e tem crescido sem parar. Dos R$ 127 bilhões da Saúde na proposta do ano que vem, mais de R$ 110 bilhões são destinados a pessoal e gastos obrigatórios. O quadro se repete para onde quer que se olhe: Educação, Defesa, Judiciário, Ministério Público, universidades — em todos os setores da máquina pública há distorções que só podem ser resolvidas pela reforma administrativa.
O serviço público federal reúne 300 planos de carreira, com 22 mil cargos e 131 mil postos com gratificações. Os salários médios para uma função de nível superior equivalem a 3,5 vezes os pagos no setor privado. Dois terços dos funcionários estão entre os 10% mais ricos. É desse universo de emprego vitalício, promoções automáticas, quinquênios, licenças-prêmio e aposentadorias generosas que derivam as distorções no Orçamento. Não haverá dinheiro para gastar onde é necessário sem enfrentar a voracidade da máquina pública.
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