sábado, 26 de setembro de 2020

Cristina Serra - As mentiras de Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Na ONU, presidente desfia seu rol de mentiras como se estivesse no cercadinho do Alvorada


 Bolsonaro fez um discurso histórico na ONU. Sim, histórico, pela quantidade de mentiras nele contidas. E acanalhou o palco mais importante da comunidade internacional, no momento em que o mundo mais precisa de líderes verdadeiramente empenhados em combater um mal que a todos assola.


A ONU foi criada há 75 anos, após o mundo ter passado por uma pandemia (a gripe espanhola) e sobre os escombros de duas guerras mundiais, uma quebradeira econômica planetária, genocídios e outros flagelos. Como disse o secretário-geral, Antonio Guterres, os fundadores "sabiam o custo da discórdia e o valor da unidade".

O presidente desfiou seu rol de mentiras como se estivesse no cercadinho do Alvorada. Eximiu-se de qualquer responsabilidade pelo inconcebível número de 140 mil mortos pelo coronavírus no Brasil. Falseou os números do auxílio emergencial. Disse que combateu o contágio, quando sabotou os esforços de governadores e prefeitos em estabelecer a quarentena.

Mas foi ao falar de meio ambiente —seu tendão de Aquiles no exterior— que Bolsonaro chegou ao paroxismo da construção ficcional. O embuste maior foi culpar indígenas e caboclos pelos incêndios na Amazônia e no Pantanal. Num caso como no outro, no ano passado e neste, a polícia investiga donos de grandes fazendas como mandantes e autores dos incêndios criminosos. Que ele despeje suas mentiras no cercadinho, vá lá... Mas na ONU? Fica por isso mesmo?

Infelizmente, teve gente que fez pior que Bolsonaro, o que não é nenhum consolo. Trump, com a mesma disposição de escrachar tudo o que toca, aproveitou a Assembleia Geral para fustigar a China, acusando-a de espalhar o coronavírus. Antonio Guterres insistiu no multilateralismo e disse que é preciso evitar a todo custo que os Estados Unidos e a China dividam o mundo em uma "grande fratura". Pena que seus apelos tenham caído em ouvidos moucos.

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