Ao se
engajar nas candidaturas de Russomanno e Crivella, em vez de manter distância
regulamentar, Bolsonaro corre o risco de ser o grande perdedor das eleições
municipais
Eleições
municipais nunca foram uma amostra grátis do que virá depois, nas eleições
gerais, mesmo na época do regime militar. Por exemplo, em 1974 a oposição (MDB)
obteve uma espetacular vitória nas urnas; em 1972, fora massacrada. Em 1976,
sofreu nova derrota para o governo (Arena), mas em 1978, o MDB virou o jogo: o
resultado das urnas sinalizou o fim da ditadura, iniciando-se a transição que
resultou na anistia (1979), nas eleições diretas de governadores (1982) e na
eleição de Tancredo Neves no colégio leitoral (1985) . Tirando São Paulo e Rio
de Janeiro, as capitais mais cosmopolitas — em Brasília não há eleição —, é
muito difícil captar tendências no processo eleitoral que sinalizem o que virá
depois nas eleições gerais. Além disso, estamos vivendo um cenário a típico,
sem debates e grandes comícios, o que faz o processo eleitoral se desenvolver
em “home office”, para usar a expressão que representa a forma predominante de
trabalho durante a pandemia.
Sim,
as fábricas estão voltando a funcionar, o comércio também, mas não há o
burburinho das ruas, nas padarias, nos barbeiros, nas filas das lotéricas e dos
caixas dos supermercados, os sintomas de engajamento da grande massa de
eleitores na disputa eleitoral. O embate se desenvolve nas redes sociais e,
principalmente, nas listas de WhatsApp, subterrâneos nos quais as pessoas se
organizam como “tribos”. São as listas da família, dos colegas de escola, dos
amigos do futebol, dos parceiros de baralho, dos colegas de trabalho etc. As
pessoas se relacionam por afetos e interesses; é assim, de forma
compartimentada, segmentada, confinada, em bolhas, que o processo eleitoral
hoje ganha a escala da democracia de massas. Somente as urnas eletrônicas
poderão nos revelar os mistérios do voto popular.
Destacam-se
São Paulo, onde o pleito está se polarizando entre o prefeito Bruno Covas
(PSDB), que tenta a reeleição, e Celso Russsomano (REP), que começou na frente
e está derretendo, mais uma vez; e Rio de Janeiro, onde o ex-prefeito Eduardo
Paes (DEM) se mantém na liderança, faturando o desgaste do prefeito Marcelo
Crivella (REP), que fez uma gestão “terrivelmente evangélica” e queimou o filme
dos pastores. Guilherme Boulos (PSOL) e a delegada Marta Rocha(PDT) correm por
fora, nas duas capitais, respectivamente.
Em
São Paulo e no Rio de Janeiro, há engajamento do presidente Jair Bolsonaro nas
candidaturas de Russomanno e Crivella. Embora venha mantendo distância
regulamentar da maioria das disputas municipais, até porque não conseguiu
formar um partido para disputá-las, nos dois casos o presidente da República
corre o risco de ser o grande perdedor das eleições. Sua alternativa será jogar
todo o seu prestígio e mobilizar seus aliados nas disputas de segundo turno,
não só nessas capitais mas também nas demais cidades, o que será uma manobra de
alto risco.
Bolsonaro correria o risco de perder seu favoritismo nas eleições de 2022. É preciso uma administração muito desastrada na politica para inviabilizar a reeleição, porém, um estado de calamidade financeira pode tornar a tarefa do gestor uma missão impossível, como aconteceu com Saturnino Braga (PDT), no Rio de Janeiro, cuja falência decretou em 1988. Com a dívida pública igual a 100% do PIB, esse risco também existe para Bolsonaro, se fracassar na economia. Aliás, o fracasso financeiro vem sendo o carma dos governantes gaúchos, que não conseguem se reeleger, como se houvesse uma maldição de Borges de Medeiros no Palacio Piratini, construído para ser o mais belo do Brasil, com esculturas de Paul Landowski, criador do Cristo Redentor, telefone folheado a ouro, réplicas dos lustres do Palácio de Versalhes e murais de Aldo Locatelli. O caudilho gaúcho foi presidente do Rio Grande do Sul de 1898 a 1908 e de 1913 a 1928, quando passou o poder a Getúlio Vargas, porque o Acordo de Pedras Altas (1923) proibira a reeleição.
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