Os
americanos têm nos arquivos cada trumpice de Bolsonaro, por mais ínfima e
secreta
Lisboa,
no verão de 1975, devia ser a cidade mais excitante do mundo para um
jornalista. Era o auge da Revolução
dos Cravos, que, no ano anterior, derrubara uma ditadura de 48 anos. O
governo do premiê Vasco Gonçalves, na prática comunista, estava sendo
pressionado pela extrema esquerda a radicalizar e, com isso, deu-se um festival
de tomada de empresas, ocupação de fábricas e nacionalização dos bancos.
Dizia-se que Portugal sairia da Otan (Organização do Tratado do Atlântico
Norte), liderada pelos EUA, e se juntaria ao Pacto de Varsóvia, dominado pela
URSS.
Morando e trabalhando lá, fui ao Pabe, botequim dos correspondentes estrangeiros, encontrar um bem informado repórter americano. "Os russos não têm interesse em Portugal", ele disse. "Imagine um país comunista na Europa, de porta para o Atlântico! Isso só lhes traria problemas com os EUA. O que eles querem é Angola". Referia-se à ainda colônia portuguesa, às vésperas da independência depois de longa guerra contra a metrópole recém-encerrada pelo governo Vasco. "Assim que Angola ficar formalmente livre, os russos irão em busca de seu petróleo e deixarão Portugal falando sozinho", completou.
No
dia 11 de novembro, Portugal e os grupos de guerrilha assinaram a independência
de Angola, e o MPLA (Movimento pela Libertação de Angola, pró-URSS) tomou o
poder. Duas semanas depois, no dia 25, um golpe liquidou a Revolução dos
Cravos. O repórter sabia o que dizia. Claro, seu informante era a CIA.
Se
os americanos sabem até o que vai acontecer, imagine como não são seus
arquivos. De Jair Bolsonaro, por exemplo, eles têm cada trumpismo, por mais
ínfimo. De Ernesto Araújo, ministro do Exterior, e Ricardo Salles, do Meio
Ambiente, cada ato público ou secreto, legal ou ilegal —e tudo em assuntos de
seu interesse.
Em Washington, a carta de Bolsonaro ao presidente Joe Biden foi lida às gargalhadas.
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