Centro
já descartou Huck e Moro como presidenciáveis
Vamos
tratar aqui de três presidentes: pela ordem, Juscelino Kubitschek, Tancredo
Neves, e Jair Bolsonaro. Este passou recibo, com firma reconhecida, de que
sentiu a mão fria do “impeachment” roçar-lhe as costas na semana passada,
quando o colegiado pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) desferiu-lhe duas
bordoadas: confirmou a ordem de instalação da CPI da pandemia, e o
restabelecimento dos direitos políticos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva.
A
CPI da pandemia, se não tem o impedimento do presidente como alvo, provocará
enxaquecas palacianas. Lula, por sua vez, desponta hoje como a principal ameaça
à reeleição de Bolsonaro. Mas, remarque-se que a política muda como as nuvens -
ou como o humor presidencial.
Bolsonaro
está mal humorado, e deixou o azedume transparecer na “live” de quinta-feira,
quando o STF sacramentou a investigação contra seu governo, e a elegibilidade
de Lula. “Só Deus me tira da cadeira presidencial, e me tira, obviamente,
tirando a minha vida", vociferou.
Em recado velado, porém, audível, ao Congresso, ao STF e à oposição, acrescentou, com ênfase, que salvo a prerrogativa divina, “o que nós estamos vendo acontecer no Brasil não vai se concretizar, mas não vai mesmo. Não vai mesmo, tá ok?” Nesse trecho cifrado, Bolsonaro aludiu à ameaça de “impeachment”.
O
temor do impedimento ronda o Planalto há meses, e vai e volta em ondas, como o
mar. Ou como a pandemia, para ser exata. A primeira onda deu-se em junho do ano
passado, quando Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro
(Republicanos-RJ), foi preso, o que acendeu a luz amarela no Palácio. O
episódio teve o condão de suspender a sucessão de atos antidemocráticos pelo
fechamento do Congresso e do STF, que Bolsonaro, e sua militância, estimulavam.
A
segunda onda se consumou há algumas semanas, quando o Centrão redobrou a
pressão pela saída do chanceler Ernesto Araújo, em paralelo ao recrudescimento
da pandemia. Para não passar recibo, Bolsonaro improvisou uma ampla reforma,
aproveitando-se para se livrar do incômodo ministro da Defesa Fernando Azevedo
e dos três comandantes das Forças Armadas, que, pela sua percepção, não o
respeitavam como comandante-em-chefe, conforme prescreve a Constituição
Federal.
Nessa
ampla reforma o medo do “impeachment” ganhou nome e sobrenome: Flávia Arruda, a
elegante e discreta ministra da Secretaria de Governo, cuja nomeação selou a
aliança de Bolsonaro com o Centrão raiz: o PP de Ciro Nogueira e Arthur Lira, e
o PL de Valdemar Costa Neto.
Quando
os generais Luiz Eduardo Ramos e Braga Netto decidiram finalmente ceder e
entregar a articulação política para o Centrão, uma semana antes do domingo de
Páscoa, o primeiro nome lembrado foi o do senador Eduardo Gomes (MDB-TO), que
tinha o padrinho mais forte do mercado: o senador Flávio Bolsonaro
(Republicanos-RJ).
Mas
toda a força de Flávio empalidece diante da caneta de Arthur Lira (PP-AL), que
despacha os requerimentos de “impeachment”. Por isso, os dois generais
concluíram que o novo ministro tinha de ser egresso da Câmara, e abençoado por
Lira. Ontem Flávia admitiu em uma “live” promovida pela XP Investimentos, que
recebeu o convite de Bolsonaro para assumir o cargo, mas tratou do assunto com Lira,
e com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
Com
Flávia Arruda, Bolsonaro reforçou a blindagem contra o “impeachment” com uma
segunda camada. A primeira camada é o vice-presidente, Hamilton Mourão. Num
cenário de instabilidade quase permanente, nenhum deputado ou senador calejado
de crises quer apear um ex-deputado do poder para passar a caneta para um
general. “Ele não inspira confiança”, reconheceu um cacique do Centrão em
conversa com a coluna.
Um
cacique do Centrão é categórico ao rechaçar qualquer risco de “impeachment”, a
começar porque falta o elementar: povo na rua. “Impeachment” depende de dois
motivos: o político e o jurídico. A pandemia complica o elemento “povo na rua”,
mas isso não basta para revisar a fórmula basilar dos impedimentos
presidenciais: motivo político, primeiro; depois, o jurídico. “O motivo
jurídico se arruma, no [Fernando] Collor foi o Fiat Elba, com a Dilma
[Rousseff], foram as pedaladas, mas tem que ter o ingrediente da sociedade
cobrando”, explica o líder do centro.
Nessa
quadra, cresce a corrida pela terceira via capaz de quebrar a iminente
polarização entre Lula e Bolsonaro. A novidade é que embora ainda figure nas
pesquisas, o nome do apresentador Luciano Huck foi alijado das conversas de
bastidores no Centrão. Com Lula no jogo, a convicção unânime é de Huck refugou.
Por ora, o ex-juiz Sergio Moro também não é levado a sério como presidenciável,
apesar da boa performance nas pesquisas.
Sem
Huck e Moro, o nome que mais empolga no momento é o do ex-ministro da Saúde
Luiz Henrique Mandetta, do DEM. Na pesquisa Ipespe realizada no Estado de São
Paulo, encomendada pelo Valor,
Mandetta alcançou 6% no cenário com o governador Eduardo Leite, do Rio Grande
do Sul, disputando, sem João Doria.
Entretanto,
o DEM também já colocou no radar de presidenciáveis o nome do presidente do
Senado, Rodrigo Pacheco, que larga com alguma vantagem em relação ao
correligionário: ocupa cargo de visibilidade nacional, e é mineiro,
representante do segundo maior colégio eleitoral, berço de presidentes da
República, desde a política café-com-leite, até Tancredo neves e Itamar Franco.
Para citar os mineiros, faz falta a Bolsonaro um conselheiro político do quilate de Tancredo Neves, que serviu a Juscelino Kubitschek. Tancredo ajudou o poeta Frederico Schmidt a redigir para JK um pronunciamento que se tornou famoso ao repelir uma rebelião militar. A frase mais forte proclamava: “Deus poupou-me do sentimento do medo”.
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