- O Globo
Ao promulgar a Constituição de 1988,
Ulysses Guimarães disse que a corrupção era o “cupim da República”. O Senhor
Diretas não conhecia Jair Bolsonaro, na época um obscuro candidato a vereador.
Três décadas depois daquele discurso, o
capitão se tornou presidente. Eleito pelo voto, exerce o poder como um cupim da
democracia. Corrói suas instituições por dentro, como insetos que devoram um
armário lentamente até levá-lo ao chão.
Em dois anos e meio, o cupim Bolsonaro já
roeu parte dos pilares do edifício erguido pelos constituintes. Aparelhou os
órgãos de controle, danificou o sistema de freios e contrapesos, corrompeu a
confiança no sistema eleitoral.
Em sua marcha autoritária, o capitão domesticou a Polícia Federal, a Receita e a Abin. Subjugou o Exército para proteger um general de estimação. Transformou o Ministério da Justiça numa usina de processos contra adversários políticos. Estimulou grupos extremistas a pregarem o golpe e o fechamento do Supremo.
O projeto de desconstrução envolve a captura de órgãos públicos para atuarem na contramão de suas missões institucionais. O Ministério do Meio Ambiente virou bunker de aliados do desmatamento. A Fundação Palmares, criada para promover a igualdade racial, foi entregue a um provocador que nega a existência de racismo no país.
Ao mesmo tempo em que desmancha estruturas
do Estado, Bolsonaro monta aparatos clandestinos para defender seus interesses.
A rede reproduz a lógica da milícia. Atua à margem das instituições e abaixo do
radar de quem deve fiscalizá-las.
Assim surgiu o orçamento secreto, que
reservou bilhões de reais para a barganha de apoio parlamentar. Assim opera o
gabinete do ódio, que difama e persegue críticos do governo. O grupo se camufla
atrás de robôs e perfis falsos para disparar mensagens que não podem aparecer
na comunicação oficial.
A CPI da Covid revelou outra estrutura
subterrânea: o gabinete paralelo que sabotou o combate à pandemia. O conselho
de negacionistas ajudou a derrubar dois ministros da Saúde. Estimulou o boicote
às vacinas e a distribuição de remédios sem eficácia contra o coronavírus.
A exemplo de outros demagogos, o presidente
se apoia na retórica contra o comunismo e a corrupção. “Não temos nada no
tocante à corrupção no governo, nada”, repetiu, na quinta-feira. Para seus
seguidores fanáticos, não importa que os fatos indiquem o contrário.
O primeiro-filho comprou uma mansão de R$ 6
milhões. A primeira-dama recebeu depósitos sem explicação. O ministro do Meio Ambiente
é investigado por suspeita de facilitar o contrabando. O ex-secretário de
Comunicação responde a inquérito por negócios com empresas que receberam verba
federal.
Nos últimos dias, documentos enviados à CPI mostraram que Bolsonaro atuou pessoalmente como lobista de laboratórios que fabricam cloroquina. Se seguir o caminho do dinheiro, a comissão pode virar um inseticida contra o cupim do Planalto.
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