Nascido em uma família judia de classe média
baixa, em 1945, criado no Brooklyn’s Oriental, em Nova Iorque, estudando em
escolas públicas, Arthur Finkelstein conquistou os diplomas em economia e
ciências políticas na Universidade de Columbia, em 1967. Depois de uma rápida
experiência como produtor de programas de rádio, ele montou sua empresa com
especialidade em pesquisas, estratégia, mensagens, mídia, publicidade e
aconselhamento sobre gerenciamento de campanhas políticas. Com esse perfil,
passou 40 anos assessorando o Partido Republicano, com destaque para as
campanhas e os governos de Nixon e Reagan. Assim, ele torna-se uma lenda no
mundo conservador americano e o mais notável spin doctor (manipulador de
notícias) da sua geração, refinando uma técnica que se tornaria eficaz na
política americana e, posteriormente, decisiva nas eleições de George W. Bush e
Donald Trump.
Em 1996, depois da morte violenta de YItzhak Rabin, o establishment de Israel preparava-se para eleger, como substituto do antigo líder, o Prêmio Nobel da Paz Shimon Peres. Respeitado mundialmente, moderado, acreditava-se que obteria uma vitória fácil nas urnas. Foi, nesse cenário, que Finkelstein desembarcou em Tel Aviv para fabricar a vitória do, até então, pouco conhecido Benjamin Netanyahu. O bruxo americano impôs uma inédita campanha difamatória no mundo político de Israel, colocando Peres como um traidor da pátria. Finkelstein convenceu os israelenses que Peres queria dividir Jerusalém, dando a metade da cidade sagrada aos palestinos. Netanyahu venceu e consolidou uma liderança, nesse padrão, só interrompida há poucos dias num famoso mar de lamas.
Lendário mago da nova direita nacionalista no
mundo, o acreditado spin doctor da América leva seu estilo para o Leste
Europeu. Depois de deixar sua marca na República Tcheca, na Ucrânia, no
Azerbaijão e na Áustria, Finkelstein foi ao encontro, em 2009, de Viktor Orbán,
na Hungria. Construiu-se ali a primeira grande cunha contra a União Europeia.
Orbán, na linha de Finkelstein, fez brotar no imaginário do seu povo que os
inimigos da Hungria são a Europa, Bruxelas e os imigrantes.
Planejada pelo arquiteto Bernardo Buontalenti,
na última década do século XVI, Livorno é uma das pérolas da Toscana e ficou
conhecida durante a Renascença Italiana como a “cidade ideal” por sua beleza e
harmonia. Foi ali, num camarim do Teatro Goldoni, em abril de 2004, que Beppe
Grillo ouviu, pela primeira vez, a voz pausada e consistente de Gianroberto
Casaleggio. O encontro da comédia com o gênio da tecnologia distópica das redes
sociais, nas margens do Mediterrâneo, marcaria o início do fim do Estado
Moderno italiano pensado por Maquiavel, no século XVI. “Ele estava bem seguro
do que dizia. Imaginei que fosse um gênio do mal ou algum tipo de São Francisco
de Assis que falava de internet em vez de dissertar sobre lobos e pássaros”,
disse Grillo ao comentar sua primeira impressão sobre Casaleggio.
“A política não me interessa. O que me
interessa é a opinião pública”, conceituava Casaleggio ao criar, em 2005, o
blog de Beppe Grillo que, em poucos dias, tornou-se o blog italiano mais
visitado do país. Quatro anos depois, sob a liderança de Beppe Grillo, surgiu o
hoje poderoso e paradigmático MoVimento 5 Stelle – M5S. Populista, eurocético,
fora dos padrões ideológicos clássicos, o M5S tem como suas cinco prioridades:
água pública, ambientalismo, transporte sustentável, direito à Internet e
desenvolvimento sustentável. Fruto direto da internet e das redes sociais, o
M5S se contrapõe a todo o sistema político clássico, italiano em particular e
europeu de um modo geral, e joga na cena pública personagens bizarros. Matteo
Salvini, quando ministro do Interior com a expressiva vitória eleitoral do
Movimento em 2018, passava a maior parte do seu tempo a tuitar medo e ódio.
Luigi Di Maio, nomeado vice-presidente do Conselho de Ministros da Itália, em
2018, não tinha curso superior, sua única experiência profissional tinha sido
como guia do estádio de San Paolo, de Nápoles, e notabilizou-se pela produção
de gafes e fake news em série.
Mas é para Steve Bannon que devemos voltar o
nosso mais atento olhar. Com um currículo notável – exército, Virginia Tech,
Georgetown, Harvard Business School, Goldman Sachs, Hollywood e Washington –, inteligência e ousadia raras, articulação e
relações pessoais com a desabrida elite conservadora mundial, Bannon é contra a
globalização, a União Europeia e a consequente fragilização dos Estados-Nação.
Com uma aversão notória à intelligentsia liberal, que sempre reinou em
Washington pelo menos desde a Segunda Guerra Mundial, de quem pretende se
apropriar da evidente hegemonia cultural, foi fundamental na improvável vitória
de Donald Trump (2016) e dos, ainda desconcertantes, Brexit e o escândalo da
Cambridge Analytica. Claro, Bannon esteve também presente na, ainda pouco
compreendida, campanha de Jair Bolsonaro à presidência da República.
Toda esta reflexão, com mais vigor e detalhes, pode ser lida nos livros recentes: “Os Engenheiros do Caos – Como as fake news, as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições” – de Giuliano Da Empoli e “O povo contra a democracia – porque nossa liberdade corre perigo e como salvá-la" – de Yascha Mounk. São textos esclarecedores diante da realidade convulsiva que se anuncia, onde Bolsonaro, seu “Exército” e suas diatribes constituem apenas uma das peças deste inquietante desafio do nosso tempo.
*Jorge Henrique Cartaxo, jornalista, cientista político e historiador
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