Chefe do Congresso defende respeito às manifestações, mas diz que anseio por ruptura há de ser coibido, e revela contato com Forças Armadas
Julia Lindner, Paulo Cappelli e Thiago
Bronzatto / O Globo
BRASÍLIA - O presidente do Senado, Rodrigo
Pacheco (DEM-MG), cancelou a participação em um evento em Viena, na Áustria,
para monitorar em Brasília as manifestações de 7 de setembro, insufladas pelo presidente Jair Bolsonaro. Caso seja
necessário, ele vai se pronunciar em defesa das instituições, em uma prática
que já virou rotina. Pacheco, que na semana passada arquivou um pedido de
impeachment apresentado pelo chefe do Executivo contra o ministro Alexandre de
Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), também virou alvo de críticas, mas
prefere não apresentar resposta.
Em entrevista ao GLOBO, ele afirma que não
admitirá qualquer retrocesso no sistema democrático e acrescenta que esse
também será o papel das Forças Armadas, com as quais tem mantido contato.
O senhor disse que a rejeição
do pedido de impeachment do ministro do STF Alexandre de Moraes seria um “marco
do restabelecimento da relação entre os Poderes”. No dia seguinte, Bolsonaro
criticou a sua decisão e atacou Moraes. Como será possível retomar a harmonia?
São duas situações. Primeiro, a crítica do
presidente da República à decisão de arquivamento do processo de impeachment é
natural. Ele teve uma pretensão resistida e indeferida. A segunda parte, que é
a manutenção de críticas muito ostensivas à Suprema Corte e aos seus
integrantes, realmente não contribuem. Isso dificulta o processo de pacificação
institucional que buscamos.
Acha que está isolado ao
insistir em uma nova reunião entre os Poderes?
Não. Tenho absoluta certeza de que o
pensamento do deputado Arthur Lira (presidente da Câmara) é o mesmo, de
apaziguar. Sei também da disposição do ministro Luiz Fux (presidente do STF) de
fazer o mesmo. Há uma comunhão de vontades nesse sentido.
Por que não citou o
presidente Bolsonaro entre as autoridades dispostas ao diálogo?
O presidente Bolsonaro tem falado e agido
no sentido de afirmar suas próprias convicções. Espero que ele possa contribuir
para esse processo de pacificação, porque há inimigos batendo à nossa porta,
que não somos nós mesmos, mas a inflação, o aumento do dólar, o desemprego, o
aumento da taxa de juros e a crise hídrica e energética, que pode ser
avassaladora. É importante que tenhamos um freio naquilo que não interessa para
cuidar do que importa ao Brasil.
Quando falou com o presidente
pela última vez?
Estive com ele (Bolsonaro) muito
rapidamente no Dia do Soldado, em um evento no Exército. Falei com ele na
véspera do dia do desfile das viaturas e dos tanques. Pessoalmente, foi um
pouco antes disso. Então, já há algum tempo que não sentamos à mesa para tratar
dos problemas do país. Acho até que isso precisa acontecer mais rapidamente.
O senhor teme que as
manifestações de 7 de setembro saiam do controle?
Manifestações são próprias da democracia. Temos que respeitá-las, mas manifestações que tenham como objetivo retroceder a democracia, pretender intervenção militar ou a ruptura institucional ferindo a Constituição devem ser repelidas no campo das ideias.
Como vê a mobilização de PMs
em torno das manifestações pró-Bolsonaro?
Se eu disser que conheço todas as Polícias
Militares, vou estar mentindo, mas conheço algumas, em especial a de Minas
Gerais e a de São Paulo. Sei que são corporações absolutamente conscientes,
muito respeitadas pela sociedade, cumpridoras dos seus deveres e defensoras da
democracia.
Há algum risco de ruptura
institucional por parte de militares? Qual é a sua percepção dos encontros que
teve com integrantes das Forças Armadas?
São instituições maduras, com um
patriotismo muito forte e com obediência absoluta ao estado democrático de
direito. Nesta semana, estarei no comando da Aeronáutica novamente para
conversar com os brigadeiros, a convite do Alto Comando da Aeronáutica. Tenho
mantido esse contato constante com essas instituições e vejo nelas uma
obrigação de defesa do Brasil. Nós não admitiremos qualquer retrocesso e tenho
certeza que também esse será o papel das Forças Armadas.
A participação do presidente
em um desfile de blindados em frente à Praça dos Três Poderes não gera ruídos?
São episódios desnecessários, que deveriam
ser evitados, especialmente neste momento em que há esses rumores. Mas não faço
deles algo mais importante do que verdadeiramente são. O que vale é que temos
as Forças Armadas conscientes do seu papel e muito bem comandadas por pessoas
que têm esse compromisso com o país e que não se aventurarão em disputas
ideológica e política.
Os ataques constantes do
presidente ao sistema eleitoral podem colocar as eleições em 2022 sob algum
risco?
Os ataques ao sistema eleitoral, sem
fundamentos, são muito ruins, porque jogam em descrédito um sistema que, até
pouco tempo atrás, era dado por nós como um orgulho nacional. Mas não considero
que isso seja capaz de deslegitimar o resultado eleitoral. As eleições de 2022
vão acontecer, porque elas são fundamentais para a democracia.
Quais são as pautas
prioritárias no Senado até o fim deste ano?
Todas são prioritárias. Nesta próxima
segunda-feira, terei uma reunião com o ministro Paulo Guedes. Quero fazer uma
conversa de compreensão sobre o que são as prioridades do governo como alguém
que possa ser colaborativo e, ao mesmo tempo, crítico daquilo que não se deva
ter. Por exemplo, eu não posso permitir que haja, a pretexto de uma reforma
tributária, um projeto que pura e simplesmente aumente impostos para o
contribuinte. Isso é muito ruim. Devemos evitar isso. Na próxima semana, terei
uma conversa com o ministro Bento Albuquerque, de Minas e Energia, sobre um
problema gravíssimo que nós temos: precisamos de um planejamento para as crises
hídrica e energética. O que nós não podemos definitivamente fazer é interromper
o diálogo. Se isso ocorrer, vai ser muito nocivo para o Brasil.
Como avalia a retomada das
coligações partidárias nas eleições proporcionais, aprovada pela Câmara?
Sou a favor do sistema proporcional sem
coligações partidárias e com imposição da cláusula de desempenho. Vamos
submeter ao Senado para que a maioria decida, mas a volta ao modelo anterior é
um retrocesso.
O senhor defende que o
senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) paute a sabatina de André Mendonça, ex-chefe
da AGU, para o STF?
É importante que o Senado dê uma resposta e
que haja sabatina, a submissão do nome ao plenário do Senado para o escrutínio
dos senadores. Não só no caso do ex-ministro André Mendonça mas também em todas
as demais indicações.
Como o senhor vê a iniciativa
do governo Bolsonaro de turbinar o Bolsa Família?
O programa social é uma prioridade. É
inegável que ele tem que existir, em razão da pobreza que temos. Ressinto a
falta de um Ministério do Planejamento independente da Economia, para termos um
planejamento nacional de políticas dos ministérios, políticas públicas.
Política econômica é algo muito amplo, que deve ser feito por especialistas,
mas que não possam ser despidas de sensibilidade social.
As pesquisas apontam uma
polarização entre Bolsonaro e o ex-presidente Lula. É possível emergir desse
cenário um candidato de centro?
Várias hipóteses podem acontecer, mas
considero que vai depender muito do andamento do Brasil nos próximos meses. O
cenário eleitoral vai ser definido em 2022. Neste momento, o Brasil não precisa
de candidatos à Presidência. O Brasil precisa do presidente buscando unificar o
país para os problemas imediatos que nós temos.
O senhor se vê como potencial
candidato do centro?
Não considero essa hipótese de candidatura
neste instante em que se recomenda ter um presidente do Senado que possa
enfrentar os problemas. Disputa eleitoral é inoportuna no momento, em especial
para o presidente do Senado.
O senhor dizia ser contra a
abertura da CPI da Covid. Agora, avalia que a comissão tem desempenhado um
papel importante?
Temos que avaliar o retrato do momento em
que decidi não abrir a CPI. Naquele momento, tínhamos mais de 4.000 mil
brasileiros morrendo todos os dias só pela Covid-19. Era um momento muito
crítico, de muita desunião. Não tínhamos uma escala de vacinas. Eu achava que a
CPI, naquele momento, poderia ser um fator de desagregação maior e de
insegurança jurídica para a estabilização do combate à doença. Mas eu não nunca
desvalorizei a CPI e o seu papel. Nem nunca disse que ela não seria aberta. Eu
apenas discuti o momento da abertura. A minha esperança é que a CPI possa
cumprir o seu papel de apurar responsabilidades, autoria, materialidade,
tipicidade de fatos e que aqueles que tenham praticado qualquer tipo de ação
antijurídica possam ser responsabilizados.
O presidente da Câmara
criticou o andamento de algumas pautas no Senado como a privatização dos
Correios e o licenciamento ambiental. O senhor acredita que Arthur Lira espera
que o Senado passe a aceitar decisões da Câmara, sem alterações?
Eu não recebo essa ponderação do presidente Arthur Lira como uma crítica ao Senado, mas apenas como um exercício de pretensão de que aquilo que foi aprovado na Câmara também o seja no Senado Federal. Nós também temos um uma porção de projetos aprovados no Senado que, ao longo de anos, estão na Câmara aguardando uma definição. Nem por isso eu digo que a Câmara está deixando de cumprir o seu papel. O que temos no Senado é a preocupação de aprofundar as matérias, de não ter açodamento, de termos a reflexão necessária por meio das comissões e do plenário. Cada um tem o seu perfil. Eu tenho um aspecto mais moderado. Não significa que eu seja lento. Mas eu gosto de refletir, de aprofundar, de submeter aos pares uma discussão realmente mais duradoura dos projetos de lei. Cada um tem o seu perfil e ambos se complementam e prestam um bom papel de unificação no Congresso Nacional.
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