Valor Econômico
Lições de 2014 para uma terceira via em
2022
A única vez em que se vislumbrou a
possibilidade real de uma “terceira via” chegar ao segundo turno aconteceu em
2014. Faltando um mês para os brasileiros irem às urnas naquele ano, o
Datafolha indicava Dilma Rousseff e Marina Silva tecnicamente empatadas, com
35% a 34% das intenções de voto. O tucano Aécio Neves vinha bem atrás, com
apenas 14%.
As eleições de 2014 foram as mais
surpreendentes e disputadas de nossa história recente. Marina Silva teve o
registro do seu partido - a Rede Sustentabilidade - negado em 2013 e por isso
decidiu se aliar a Eduardo Campos (PSB), assumindo o posto de vice. Em 13 de
agosto, porém, um trágico acidente aéreo tirou a vida do ex-governador
pernambucano. Marina foi então alçada à cabeça de chapa a uma semana do início
oficial da campanha.
Marina Silva tinha recall: em 2010, havia impressionado ao terminar em terceiro lugar com quase 20 milhões de votos (19,3% do total) concorrendo ao Palácio do Planalto pelo minúsculo PV. Além disso, com uma longa trajetória ligada a pautas sociais - havia sido vereadora, deputada estadual e senadora pelo PT e ministra do Meio Ambiente de Lula - e tendo na retaguarda André Lara Resende e Eduardo Giannetti pregando responsabilidade fiscal e reformas econômicas, Marina tinha tudo para furar a polarização histórica entre PT e PSDB.
Em um mês, contudo, sua candidatura
derreteu. À medida em que a disputa esquentava, Marina foi perdendo apoio a
cada pesquisa, enquanto Dilma e Aécio cresciam. Computados os votos em 5 de
outubro, a petista terminou na frente com 41,6%, seguida por Aécio com 33,5%.
Marina obteve somente 21,3% dos votos dos brasileiros.
Marina Silva e Sergio Moro têm muitas
diferenças - de origem social, de história e inclinação políticas, além de
visões de mundo. A experiência vivida pela acreana em 2014, entretanto, tem
algumas lições que podem ser úteis ao paranaense em seu projeto de tentar ser
uma alternativa viável em 2022.
A primeira delas é que estrutura de
campanha importa muito para uma terceira via. A coligação Unidos pelo Brasil
(PSB, PPS, PSL, PHS, PPL e PRP) proporcionava 2min03s em cada bloco de
propaganda eleitoral no rádio e na TV para Marina, menos da metade dos 4min35s
do Muda Brasil de Aécio (PSDB, DEM, PTB, SD, PMN, PEN, PTN, PTC e PTdoB) e um
quinto do tempo angariado pela coligação “Com a Força do Povo” de Dilma
(10min24s). Dinheiro também conta. A campanha de Marina arrecadou no primeiro
turno cerca de R$ 103 milhões, contra R$ 215 milhões da candidata petista e R$
240 milhões do tucano.
Com mais dinheiro e tempo no rádio e na TV,
Dilma e Aécio trataram de promover uma intensa campanha de difamação contra
Marina, numa estratégia que seria um prenúncio dos golpes baixos e fake news
que marcariam a eleição de 2018. Bombardeada à esquerda e à direita, Marina
perdeu votos tanto nos extratos mais pobres do eleitorado (pelo boatos
alimentados pela propaganda petista de que iria acabar com o Bolsa Família),
quanto junto ao eleitor de mais alta renda e nível educacional (pelo sentimento
antipetista incentivado por Aécio).
Outra mensagem vinda da disputa de 2014 é
que o eleitor de centro é muito volátil, e tende a migrar para um dos polos ao
pressentir que seu candidato preferencial perde força. Na reta final de
campanha, percebendo que Marina caía nas pesquisas, seus apoiadores de
centro-esquerda migraram para Dilma, enquanto os de centro-direita fecharam com
Aécio.
No caso de Sergio Moro, há um desafio
adicional. Como pode foi captado pela pesquisa Quaest/Genial Investimentos
(tabela abaixo), as preferências políticas do eleitor “nem Lula nem Bolsonaro”
estão muito mais próximas do grupo que apoia o petista. Moro, por sua vez, tem
uma base potencial de eleitores mais identificada com as visões dos
bolsonaristas.
Para chegar ao Palácio do Planalto,
portanto, Moro precisará alargar sua base pela centro-esquerda para derrotar
Bolsonaro no primeiro turno e recorrer ao sentimento antipetista contra Lula no
segundo.
Para não ser dragado pela polarização como
aconteceu com Marina Silva em 2014, além do recall da Lava-Jato e de uma
excelente equipe econômica, Moro precisará de um programa de governo abrangente
e de uma ampla aliança de partidos. Não é uma missão fácil.
*Bruno Carazza é mestre em economia e doutor em direito, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”.
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