Atravessamos um tempo em que assistimos sistematicamente ao desmonte das políticas públicas. Sem que se coloque nada no lugar.
Gostaria de começar este texto falando de
todas as formas de empenho adotadas para a retomada dos processos educacionais
em salas de aula por esse país afora.
Era o que esperávamos, mas não é o que está
acontecendo.
Numa sociedade midiática como a nossa,
podemos acompanhar ao vivo as situações mais variadas sobre o que vem ocorrendo
em todo o país com o anunciado retorno às aulas, que foram paralisadas no seu
formato presencial em março de 2020.
Escolas públicas, sobretudo as municipais,
não têm as condições básicas exigidas pelos protocolos de saúde para a retomada
das aulas presenciais. Muitos alunos não voltaram para as salas de aula e é
preciso mobilizar esforços para que as famílias enviem novamente os seus filhos
para as escolas.
A pandemia do novo coronavírus foi capaz de interromper de forma drástica o rumo da nossa educação já cambaleante, situação essa expressada durante alguns anos seguidos através dos sistemas de avaliação da aprendizagem, sobretudo o IDEB, sob responsabilidade do INEP, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, o mesmo responsável pela realização do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) que habilita os alunos para o ingresso nas universidades públicas no país.
Além de interromper o curso do ano letivo,
a pandemia evidenciou a incapacidade das nossas escolas – sobretudo as públicas
estabelecidas nas periferias das grandes cidades e nas regiões mais longínquas
do país – no desenvolvimento de metodologias de ensino de longa distância e até
mesmo em lidar com a tecnologia em aulas presenciais.
Os professores foram tomados de surpresa
diante da responsabilidade de proporcionar aos alunos, em suas casas, as aulas
com conteúdos básicos compatíveis com o desenvolvimento cognitivo.
As aulas presenciais foram paralisadas, mas
havia a necessidade de manter os alunos conectados à sua capacidade de
aprendizagem, para que os conteúdos trabalhados, sem a continuidade devida, não
se perdessem no tempo.
Segundo alguns estudiosos, é urgente que se
pense em mudanças que possam ajudar o país na reformulação de sua política
educacional, porque a Educação tem um papel preponderante no desenvolvimento
das pessoas, no crescimento da economia, nos processos de equilíbrio social e
equidade.
Doravante é preciso se pensar
na escola pública cada vez mais abrangente e democrática, com funções que
ultrapassem as salas de aula e estabeleça diálogos com a sociedade e o
cotidiano das famílias.
Vivemos num país com muitas diferenças e
muitas desigualdades. As escolas públicas devem cumprir um papel diferenciado
para aqueles que estão em condição de pobreza, podendo ser o elo que gere as
formas de aproveitamento das oportunidades geradas pela sociedade, para
encaminhamento na vida.
As escolas devem estabelecer maior
interação com as tecnologias, fugindo da trivialidade das aulas pouco
criativas, suprindo essa necessidade com cursos de formação para professores e
gestores e instrumentos necessários, inclusive aos alunos que não dispõem de
recursos financeiros.
Mais importante em tudo isso
é valorizar o trabalho dos professores criando as condições para que os mesmos
tenham tempo disponível para melhorar sua capacidade de estudo e melhor
interação com os meios acadêmicos, culturais, necessários ao fortalecimento do
seu trabalho.
É preciso redefinir o currículo, fugir do
seu enquadramento em verdadeiras grades que não estimulam a capacidade criativa
dos alunos e não agregam valor às suas buscas no horizonte de suas vidas.
Uma nova escola é necessária e urgente. É
responsabilidade da União, dos estados e dos municípios. Também é
responsabilidade da sociedade, dos pais e mães, das instituições da sociedade
civil. De outros organismos dos poderes públicos como o Parlamento e da
Justiça.
Atravessamos um tempo em que
assistimos sistematicamente ao desmonte das políticas públicas. Sem que se
coloque nada no lugar.
O Governo criou um auxílio aos pobres para
chamar de seu e anunciou o fim do Bolsa Família, que era um programa, na sua
origem, criado pelo ex-governador de Brasília Cristovam Buarque para apoiar às
famílias na permanência de seus filhos na escola. No entanto, o novo auxílio só
tem um ano de vida, até a data do fim do seu mandato, ou seja, um truque
eleitoreiro.
Temos um governo no comando da nação que
aposta sempre no caos e se fortalece na sua capacidade de fazer maldade,
apoiado ainda por um pequeno contingente de aliados que se alimentam da
ganancia e da banalidade do mal.
Segundo Hannah Arendt, a banalização do mal
está, justamente, no fato de que as pessoas optam por não pensar criticamente e
nada fazem para impedir o mal; elas fingem que acontecimentos relevantes para a
sociedade não lhes dizem respeito, isto é, pensam apenas em si. Para ela, são
as pessoas banais que se omitem ou fazem as piores atrocidades. O mal não é
sedutor nem monstruoso, como a mitologia representa, mas banal, comum,
ordinário. (Manoelito Soares, professor de filosofia)
No mundo moderno, a banalidade do mal está
no populismo, no clientelismo político, nos orçamentos secretos, nas rachadinhas
que são as formas mais intensas de corrupção, no uso da máquina pública, no
pensamento dos terrivelmente religiosos. Também na inércia…
O governo federal tem acertado no desmonte
das políticas públicas. Inventou um orçamento secreto para poder repassar
dinheiro para os aliados sorrateiramente. Sonega informações sobre a destruição
da Amazônia e promove o abandono das populações indígenas, tal qual vem
acontecendo com os Yanomamis, como foi documentado e publicado em canal aberto
de televisão.
Embora sempre desminta no dia seguinte o
que falou no dia anterior, não se pode perder de vista que o governo não se
desgruda dos aspectos ditatoriais do golpe militar de 1964.
Um governo que quer um Enem com a sua cara
não aceita que escolas e professores estejam sintonizados com o pensamento de
Paulo Freire. Quer pessoas no seu governo vazias de pensamento, porque facilita
a imposição de ações desprovidas de ética, o suporte maior para a garantia dos
direitos humanos.
A Educação ainda é o caminho, não depende
de um único ser humano e é tarefa de todos.
A Educação não é responsabilidade somente
das escolas. A Educação abrange processos formativos que se desenvolvem
no seio da sociedade e pode ser vivenciada nas famílias, nas escolas, nos
movimentos sociais, nos locais de trabalho e sobretudo nas relações entre nós,
seres humanos.
*Mirtes Cordeiro é pedagoga.
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