EDITORIAIS
Emendas obscuras
Folha de S. Paulo
Decisão do STF joga luz sobre barganha de verbas do Orçamento sob Bolsonaro
A magistrada apontou possível
inconstitucionalidade dessa categoria de emendas ao Orçamento, dimensionadas em
R$ 16,9 bilhões neste ano, por não atender aos princípios de transparência e
impessoalidade na gestão pública.
Ao contrário do que ocorre com as emendas
individuais e de bancada, nas de relator não há vinculação entre o requerente e
o beneficiário da despesa —o que é grave.
A falta de transparência já havia sido alvo
do Tribunal de Contas da União, mas aparentemente não suscitou resposta do
Executivo. Em seu despacho, a ministra menciona o descaso do Congresso e de
órgãos da administração com os mecanismos de governança e aponta para a
perplexidade com o uso de dinheiro do contribuinte por vias informais e
obscuras.
Daí a determinação de que haja ampla
publicidade dos documentos que embasam a distribuição de emendas de 2020 e 2021
e de que todas as demandas apresentadas por parlamentares sejam registradas em
plataforma eletrônica.
O problema da captura do Orçamento não é recente, por certo. A história inclusive se repete —o célebre escândalo dos anões, em 1993, se deu justamente a partir do uso das emendas de relator, que depois caíram em desuso, mas foram reativadas a partir de 2020.
O processo é complexo e mistura razões
legítimas com maus incentivos. De um lado, há o interesse do Congresso em ter
voz ativa na gestão dos recursos, algo que ganhou corpo nos últimos anos.
De outro, o avanço parlamentar tende a
ocorrer de forma descontrolada e sujeita a distorções quando o ocupante do
Planalto é fraco, caso de Jair Bolsonaro.
O roteiro vem desde 2015, quando o
Congresso deu caráter impositivo às emendas individuais. Em 2019, a mesma
lógica foi estendida às emendas de bancada. O passo seguinte foi permitir que
essas duas rubricas pudessem ser direcionadas a estados e municípios sem
vinculação a programas.
O ponto culminante foi o retorno das
emendas de relator, que passaram a ser o instrumento principal de cooptação
política.
As três categorias de emendas somam R$ 34
bilhões em 2021. A quantia representa 15% de toda a despesa discricionária e
cerca de metade do investimento federal.
Se o protagonismo do Congresso na feitura
do Orçamento é desejável na democracia, cabe reconhecer que o processo se
desvirtuou e carece de responsabilidade e transparência. Qualquer que venha a
ser a decisão do STF sobre o tema, os próprios parlamentares deveriam rever os
procedimentos.
Carvão e dinheiro
Folha de S. Paulo
Apesar de avanços, cúpula do clima em
Glasgow arrisca tropeçar nas finanças
Seria precipitado dizer que a cúpula do
clima em Glasgow teve coisas boas e novas na primeira semana, mas que as coisas
boas não são novas e as coisas novas não são boas. Há notícias animadoras, como
a interrupção de investimentos em carvão, ainda que nada garanta desfecho
satisfatório até o fim da COP26, na sexta-feira (12).
A Declaração de Transição do Carvão Global
para Energia Limpa tem uma única página e fixa o compromisso de interromper
licenças para novos projetos de energia com esse combustível fóssil e o
financiamento de usinas em outros países. Assinam pesos pesados como EUA, Alemanha
e Reino Unido.
Ficam de fora China (50% do consumo) e
Índia (10%). A potência chinesa já havia prometido descontinuar o apoio a
termelétricas no exterior, mas seguirá aumentando o consumo até 2030,
prazo-limite para o mundo cortar em 50% a emissão de CO2 e ter chance de
limitar o aquecimento global a 1,5ºC.
Outra boa nova veio com o Compromisso
Global sobre Metano, gás do efeito estufa dezenas de vezes mais potente que o
CO2. Um grupo de 96 países, entre eles o Brasil, prometeu reduzir em 30% as emissões
em nove anos.
A delegação brasileira também concordou com
a Declaração de Florestas, ao lado de 123 nações. Outra página genérica, para
facilitar "produção e consumo de commodities sustentáveis (...) que não
conduzam ao desmatamento e à degradação da terra" —ironia para um país
onde desmatamento e emissões estão em alta.
Houve movimento ainda no setor financeiro,
este sim capaz de tirar da inércia a questão do clima. Aí surgiram novidades,
como a coalizão de instituições financeiras que administram US$ 130 trilhões e
se comprometem a custear a transição energética. Mas esta pode custar até US$ 3
trilhões ao ano, por três décadas.
Os países ricos não cumpriram nem a
promessa feita em 2009 de carrear R$ 100 bilhões anuais para projetos
sustentáveis nas nações em desenvolvimento. Estas falam agora em obter
US$ 1,3 trilhão ao ano de financiamento.
China e Índia estão à frente da demanda ambiciosa, as mesmas que, na condição de primeira e terceira maiores emissoras de carbono, não abrem mão do carvão. Novo impasse se desenha.
A demora absurda para julgar os réus da
Boate Kiss
O Globo
Foi enfim marcado para 1º de dezembro, em
Porto Alegre, o julgamento de quatro acusados de homicídio no caso da Boate
Kiss. A decisão deveria motivar um debate sobre a morosidade da Justiça e sobre
uma legislação penal que, sob o argumento nobre de garantir o pleno direito de
defesa — princípio que norteia a ala “garantista” do Supremo Tribunal Federal
—, acaba exageradamente desequilibrada em favor de quem é acusado de crimes. Os
réus encararão o júri depois de oito anos, dez meses e quatro dias do incêndio
que matou 242 pessoas e deixou mais de 600 feridas. Um absurdo.
Na madrugada de 27 de janeiro de 2013, a
boate de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, sediou uma festa organizada por
universitários. Um dos integrantes da banda Gurizada Fandangueira disparou um
fogo de artifício. O artefato atingiu a espuma acústica no teto e espalhou fogo
pela boate. Foi um deus nos acuda.
Quatro acusados serão julgados: Elissandro
Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann (sócios da boate), o músico Marcelo de
Jesus dos Santos e o produtor Luciano Bonilha Leão. O julgamento contará com
aparato de segurança especial e deverá se estender por cerca de duas semanas,
período em que 19 testemunhas, dez sobreviventes e os quatro réus deverão ser
ouvidos. Na semana passada foi pré-selecionado um grupo de 150 cidadãos, e dele
serão sorteados os jurados.
Independentemente das sentenças e das
penas, o julgamento representa um alívio para familiares das vítimas e
sobreviventes. Muitos já duvidavam que os acusados um dia seriam colocados à
frente do juiz e do júri. Usando todas as brechas sem fim que a lei brasileira
oferece aos acusados, desde 2013 não faltaram questionamentos de competência,
recursos, pedidos de arquivamento, debates sobre a presença do público nos atos
processuais, pedidos de afastamento dos promotores, transferência do julgamento
de Santa Maria para Porto Alegre, mais recursos e uma série de adiamentos. Tudo
para evitar que os acusados enfrentassem a Justiça.
Não causa surpresa que o Brasil ocupe a
vergonhosa 133ª posição entre os 139 países que fazem parte do ranking
organizado pela ONG World Justice Project, sediada em Washington, para medir a
eficácia e a rapidez de decisões da esfera criminal. O mais desanimador é que a
Justiça estadual do Rio Grande do Sul não é um exemplo de lentidão quando
comparada à de outros estados brasileiros. Pelo contrário.
Isso pode ser constatado no compêndio
Justiça em Números, organizado anualmente pelo Conselho Nacional de Justiça. Um
dos indicadores do levantamento é o Índice de Produtividade Comparada da
Justiça, que leva em conta quantidade de processos, dados sobre recursos
humanos disponíveis e também os recursos financeiros. Em 2019, o último ano
antes da pandemia, a Justiça gaúcha foi a segunda mais eficiente em primeiro
grau e a primeira em segundo grau — ambas na categoria de tribunais de grande
porte. O problema não parece, portanto, ligado à gestão, mas a uma legislação
penal exageradamente permissiva e leniente para quem tem acesso a bons
advogados.
Isso precisa mudar — e logo. Com os jovens
voltando a frequentar boates após a queda nas mortes por Covid-19, também seria
recomendável que as prefeituras aumentassem a fiscalização de medidas contra
incêndio. Boate Kiss, nunca mais.
Com retomada de aulas presenciais, desafio
é combater a evasão escolar
O Globo
Não deixa de ser estranho que estudantes
estejam voltando em massa às salas de aula quando faltam menos de dois meses
para terminar o ano. Mas, considerando a razia provocada no ensino pela
pandemia — agravada por inércia, incompetência e falta de planejamento de
gestores nos três níveis da administração pública —, é sem dúvida boa notícia.
Embora ainda haja escolas fechadas país afora, onde até estádios foram
liberados para receber a capacidade máxima de público, é louvável que São
Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, cujas redes de ensino estão entre as
maiores do país, tenham retomado as aulas presenciais. Que sirvam de exemplo.
A volta tardia à sala de aula embute uma
série de desafios. O Brasil foi um dos países que mais tempo permaneceram com
escolas fechadas, um dos muitos desatinos que marcaram a gestão trôpega da
pandemia — em parte pela falta de uma coordenação central, já que o governo
federal abriu mão de seu papel. Os prejuízos ao aprendizado são inequívocos. O
ensino remoto, quando existiu, só fez ampliar as desigualdades existentes. Como
esperar que alunos acompanhem aulas on-line se não têm sequer acesso à
internet? Mas os estragos vão muito além da óbvia questão pedagógica. O
afastamento do convívio social causou sérios danos que ainda precisarão ser
avaliados — o aumento da violência doméstica é uma realidade.
Entre tantas demandas, uma das mais básicas
é trazer todos os alunos de volta. Muitos abandonaram os estudos durante o
longo apagão no ensino. Um relatório do Banco Mundial concluído no primeiro
trimestre deste ano mostrou que o número de estudantes fora da escola cresceu
12% em 2020. Segundo o levantamento, 172 mil crianças e adolescentes de 6 a 17
anos pararam os estudos no primeiro ano da pandemia. O contingente dos que
largaram a escola subiu de 1,3 milhão para 1,5 milhão no país. Não foram apenas
as condições econômicas as responsáveis pela evasão, mas principalmente as
peculiaridades do ensino remoto.
Registre-se que muitas cidades buscam
formas de trazer os estudantes de volta, às vezes batendo de porta em porta,
noutras contando com a ajuda dos próprios alunos, que tentam localizar os
colegas pelas redes sociais. Há casos em que o empobrecimento das famílias fez
crianças e adolescentes abandonar o estudo para trabalhar. Mas, para evitar
isso, existem os programas sociais, que devem condicionar o pagamento dos
benefícios à frequência escolar. O propósito deve ser ajudar a família e, ao
mesmo tempo, manter as crianças em sala de aula.
Há ainda muitas questões a resolver para
recuperar o estrago provocado pelo longo fechamento das escolas no Brasil.
Reprovar ou não reprovar? Como repor o conteúdo perdido, principalmente para
aqueles que não conseguiram acompanhar as aulas remotas? Como adaptar as
dependências às novas exigências sanitárias? Eis apenas algumas. Acima de tudo,
é preciso reconquistar os alunos que abandonaram o ensino. Mostrar-lhes que
ainda existe futuro é o grande teste para os gestores.
A diferença que a vacina faz
O Estado de S. Paulo
O novo surto de covid-19 na Europa lança
luz sobre a importância da vacinação, único meio de acabar com a pandemia
A Europa voltou a preocupar as autoridades
sanitárias por causa do aumento expressivo do número de casos de covid-19 no
continente. Beira o inacreditável a esta altura, mas se trata de uma alarmante
realidade. De acordo com Hans Kluge, diretor da Organização Mundial da Saúde
(OMS) para a Europa, departamento que também abrange países da Ásia Central,
houve um aumento de 55% no número de casos diários de covid-19 na região em
outubro. “Estamos, mais uma vez, no epicentro de uma onda de covid19”, disse
Kluge. Segundo ele, sobre a região paira “uma ameaça real de ressurgimento da
doença.”
Não custa lembrar que, essencialmente, uma
pandemia só será extinta, ou ao menos estará controlada, quando todos os países
afetados tenham adotado as medidas voltadas para esse fim dentro de seus
limites. Vírus, por óbvio, desconhecem fronteiras, sobretudo em um mundo
hiperinterligado como hoje.
Há duas causas para o retrocesso europeu. A
primeira é a desigualdade da cobertura vacinal, não obstante a facilidade de
acesso a vacinas na região. Tanto
entre países como entre cidadãos de um
mesmo país, ainda é muito significativa a diferença entre vacinados e não
vacinados. Por razões que vão desde crenças pessoais à manipulação política da
informação, ainda há muitas pessoas que duvidam da segurança e da eficácia das
vacinas contra a covid-19, a despeito de robusta produção científica e da
observação empírica atestando o exato oposto. Além disso, epidemiologistas
avaliam que o relaxamento de medidas de segurança sanitária autorizado por
governos de diferentes países europeus pode ter sido prematuro ou desordenado.
A Alemanha, um dos países que têm
registrado aumento recorde no número de casos de covid-19, é um caso que
desafia a compreensão. A despeito de ser o país mais rico da Europa e ter um
dos povos mais bem educados do mundo, a cobertura vacinal naquele país está
muito abaixo de seu potencial. A resposta para o enigma? “Estamos vivendo uma
pandemia de não vacinados e a quarta onda avança com força total (entre nós)”,
disse recentemente o ministro da Saúde alemão, Jens Spahn. Apenas 66,5% dos
alemães estão totalmente imunizados contra a covid-19, porcentual muito abaixo
do de outros países europeus, como Portugal (90%) e Espanha (80%).
A situação não é muito diferente na Itália,
país que foi devastado no início da pandemia. Na cidade portuária de Trieste,
onde houve aguerridos protestos contra o “passaporte da vacina” determinado
pelo primeiro-ministro Mario Draghi, o número de casos de covid19 tem crescido
perigosamente. “É o momento de dizer com clareza: chega de idiotice”, disse o
governador de Friulivenezia Giulia, Massimiliano Fedriga, sobre os cidadãos que
se recusam a receber o imunizante.
Na era da desinformação, o óbvio precisa
ser dito: vacinas salvam vidas. A única saída para debelar a pandemia é a
vacinação maciça da população. Nos Estados Unidos, onde também se observa
grande número de não vacinados por vontade própria, o presidente Joe Biden
determinou há poucos dias que as empresas com mais de 100 funcionários deverão
exigir o certificado de vacinação de seus colaboradores ou submetê-los a testes
semanais para detecção do coronavírus.
Em São Paulo, onde 94% da população adulta
já está totalmente imunizada, os números de casos, internações e mortes
decorrentes de covid-19 despencaram. Entre os dias 3 e 4 deste mês, a capital
paulista registrou apenas uma morte por covid-19. “É um fato fantástico, que
mostra o controle da pandemia
(na cidade) e a eficácia das vacinas”,
disse ao Estado o secretário municipal de Saúde, Edson Aparecido.
Brasil afora, o quadro positivo não é muito
diferente. A cultura vacinal da população prevaleceu sobre o negacionismo e a
desídia do governo de Jair Bolsonaro. Basta dizer que até hoje a coordenação do
Programa Nacional de Imunizações (PNI) segue acéfala, mas tão valoroso é seu
quadro funcional, e tão forte é o desejo da maioria dos brasileiros de receber
a vacina, que a vacinação avança no País – e a sociedade volta a experimentar
uma certa normalidade após muitos meses de luto e apreensão.
Transparência não é concessão do Estado
O Estado de S. Paulo
A obstinação em ocultar e distorcer dados
mostra que o governo não quer que os brasileiros conheçam a verdade e sejam
libertados por ela
Apesar das advertências dos especialistas,
o governo negou por meses as subnotificações no Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados, até as últimas revisões revelarem que o saldo de vagas com
carteira assinada em 2020 caiu pela metade. O benefício da dúvida presumiria
uma falha técnica – já grave –, mas os renitentes esforços do Planalto para
distorcer e ocultar dados lhe tiraram esse benefício.
A transparência não é concessão do Estado,
mas um dever constitucional crucial para erigir a confiança e a
responsabilidade essenciais ao funcionamento da democracia e da economia de
mercado. Um dos cinco princípios da administração pública, a “publicidade” é
chave para fiscalizar a aplicação dos demais, garantindo que as leis estão
sendo cumpridas (“legalidade”) e os recursos e serviços públicos estão sendo
bem geridos (“eficiência”) de maneira equitativa (“impessoalidade”) e ética
(“moralidade”). Indispensável à formulação de políticas públicas, a
transparência é o principal instrumento de combate à corrupção e promoção da
participação popular nos negócios públicos.
Se há que preservar informações pessoais ou
imprescindíveis à segurança nacional, na gestão pública o sigilo é a exceção, e
a transparência, a regra. Mas a intenção do governo de subverter essa lógica é
indisfarçável. Emblematicamente, a sua primeira derrota, logo no primeiro mês,
foi a revogação de um decreto que ampliava a discricionariedade de servidores
para classificar documentos como sigilosos.
A exemplo do que fez o Exército com o
inquérito sobre a participação ilegal do intendente Eduardo Pazuello em atos
políticos, o Executivo decretou sigilo de “cem anos” sobre os crachás de acesso
dos filhos de Jair Bolsonaro ao Planalto, sobre sua carteira de vacinação e até
sobre a matrícula escolar de sua filha. A Presidência mantém sob sigilo os
pareceres técnicos que a orientam a vetar ou sancionar leis, e instrui os
ministérios a avaliar o “risco político” nas respostas a pedidos via Lei de
Acesso à Informação.
Segundo levantamento do Globo,o governo tem
a menor taxa de pedidos concedidos – 64,9%, enquanto na gestão Temer foram
67,5% e na gestão Dilma, 71,1%. A Controladoria-geral da União aponta que, de
930 bases de dados indevidamente mantidas sob sigilo pelo Executivo, 349
estavam previstas para ser veiculadas pela atual gestão.
Quando os dados contrariam o governo, ele “mata” o mensageiro. Após a divulgação de dados sobre desmatamentos do Inpe, seu diretor foi exonerado sob a alegação de que estaria manchando a reputação do Brasil “a serviço de alguma ONG”. O governo tentou ocultar pesquisas da Fiocruz sobre drogas e retirar dados de violência policial do anuário sobre direitos humanos, além de ter cortado verbas para o Censo do IBGE.
Na pandemia, tentou suspender os prazos
para as respostas a pedidos de informação e ocultar dados sobre a doença,
forçando a imprensa a criar um consórcio para garantir informações confiáveis.
Valendo-se das emendas de relator, imunes ao
monitoramento e aos critérios que determinam a distribuição de emendas
parlamentares, Bolsonaro criou um orçamento secreto para comprar apoio
parlamentar.
A cultura do sigilo é seletiva. Bolsonaro vetou o trecho da Lei Geral de Proteção de Dados que assegurava proteção de dados das pessoas que apresentassem pedidos de acesso a informações; é investigado pelo Supremo Tribunal Federal por vazar uma investigação sigilosa da Polícia Federal; e seu filho Carlos é suspeito de negociar a aquisição de sistemas de espionagem para o Planalto.
É discutível que a verdade seja “a primeira
vítima da guerra”, mas é fato que a verdade é a primeira vítima das
autocracias. Bolsonaro afirma como um princípio de seu governo a máxima bíblica
“Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. Mas a frequência com que se
desmente, oculta e distorce dados, dissemina desinformação e agride a imprensa
revela o seu verdadeiro apreço pela liberdade dos brasileiros.
Com leilão bem-sucedido, 5G favorece alta
da produtividade
Valor Econômico
A disputa eleitoral que se avizinha pode
tumultuar o mercado de câmbio e trazer muita volatilidade às cotações
Demorou, mas saiu: o leilão para exploração
da tecnologia 5G no Brasil, realizado na semana passada, foi bem-sucedido. O “valor
econômico” do leilão chegou a R$ 47,2 bilhões, segundo a Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel). Este conceito considera não apenas os valores
outorgas que as companhias vencedoras do certame pagarão e os investimentos a
serem realizados ao longo do prazo de vigência dos contratos, mas também o que,
potencialmente, outros setores da economia investirão para atender, por
exemplo, a demanda das operadoras de 5G por equipamentos.
O uso da nova frequência é uma revolução
tecnológica que promete mudar de maneira ampla a vida das pessoas, a chamada
“internet das coisas” (IoT, na sigla em inglês) e a comunicação entre máquinas
(M2M). Com capacidade e velocidade de transmissão de informações
incomparavelmente maiores que as tecnologias existentes, espera-se que a
tecnologia 5G crie chance histórica para o aumento da produtividade das
economias.
No caso do Brasil, onde os custos de
produção só aumentam devido ao tamanho e à ineficiência do Estado, a chegada da
tecnologia será muito bem-vinda. Por essa razão, como o diabo mora nos
detalhes, toda atenção quanto à regulamentação dos serviços e ao cumprimento,
pelas concessionárias, das cláusulas dos editais de licitação é necessária para
evitar o impensável - a disposição plena e viável da nova tecnologia apenas
para grandes empresas e consumidores de alta renda.
Na indústria, onde o impacto potencial da
tecnologia 5G foi batizada de “indústria 4.0”, a novidade é muito bem-vinda. O
setor enfrenta no país estagnação de mais de uma década, devido à paralisação das
reformas, à complexidade do sistema tributário e à imposição, pelo setor
público de elevada carga tributária - de 34% do Produto Interno Bruto (PIB) -,
as maior dos países em desenvolvimento. Isto, sem falar na baixa qualidade da
mão de obra, nos gargalos de infraestrutura e no elevado custo financeiro, que
impedem as empresas brasileiras de competir em igualdade de condições com seus
concorrentes multinacionais.
Com a tecnologia 5G, máquinas
automatizadas, robôs e todo sistema vão comunicar-se por meio de redes
privadas. Nas residências, geladeira, fogão, torneira, câmeras de vigilância e
outros dispositivos terão “chips” para executar funções programadas com o uso
de redes 5G. O controle de estoque dos itens na geladeira, a função de ligar ou
desligar um forno micro-ondas, a medição do consumo de água, tudo poderá ser
realizado de maneira automática. Fornecedores dos equipamentos poderão ser
informados de problemas e consertar eventuais problemas remotamente Trata-se de
cenário de filmes de ficção científica que as gerações anteriores ao surgimento
da internet, na década de 1990, jamais sonharam conhecer.
O mesmo conceito pode ser levado a portos,
aeroportos, usinas e outros negócios. No agronegócio, colheitadeiras e tratores
autônomos vão poder se conectar por 5G. Sistemas recolherão em tempo real dados
dos “chips” implantados em rebanhos. A tecnologia estará presente nas rodovias,
transmitindo informações dos veículos e de cargas em trânsito. Nas cidades,
impulsionará os dispositivos de inteligência, com monitoramento de tráfego,
drones, gestão de ambulâncias etc.
Médicos poderão fazer cirurgias de maneira
remota, com o auxílio de robôs na outra ponta, sem problema da latência. A
manipulação de hologramas, na realidade virtual e aumentada, ajudará os estudos
de medicina. As pessoas poderão se inserir virtualmente em um jogo de futebol e
assistir às partidas de vários ângulos, posicionando-se ao lado de seus ídolos,
como se estivessem presentes nos campos de futebol.
Tudo isso tem custo e não será uma realidade
implantada da noite para o dia. Com o leilão concluído, haverá processo de
homologação dos vencedores e a assinatura dos contratos, com as outorgas
liberadas para as empresas vencedoras no começo de dezembro. As redes serão
implantadas e ativadas a partir de 2022. Nas capitais, estará disponível para
toda a população até 31 de julho de 2022. O consumidor precisará ter paciência.
Não bastará ter uma operadora com 5G - será preciso comprar outro “smartphone”,
este, compatível com as novas frequências. Do contrário, a navegação será feita
em 4G.
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