segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Ana Cristina Rosa - O Brasil quer ser um país decente?

Folha de S. Paulo

Comissão de juristas negros nasceu da violação cotidiana de direitos da maioria da população

No mesmo dia em que uma comissão de juristas negros entregou à Câmara dos Deputados, em Brasília, relatório contendo propostas de alterações legislativas com vistas a um Brasil antirracista, um homem negro foi algemado a uma moto da PM de São Paulo e arrastado por uma avenida da maior capital da América Latina em explícita demonstração da violência policial racializada no país.

A imagem foi comparada pelo ouvidor da própria PM aos castigos outrora aplicados a escravizados e um inquérito foi aberto. Em outra esfera, houve autoridade que não viu ilegalidade no ato da prisão. Os fatos ilustram a urgência da implementação de mecanismos efetivos de promoção da equidade racial no maior território negro fora da África.

A própria comissão de juristas nasceu da violação cotidiana de direitos da maioria da população, que se autodeclara preta e parda segundo o IBGE. O grupo foi instituído após a morte de João Alberto Freitas, assassinado por seguranças do Carrefour na véspera do Dia da Consciência Negra, em 2020, em Porto Alegre.

Entre as propostas do relatório consta a renovação do período de validade da lei das cotas nas universidades, ação afirmativa responsável pelo ingresso de estudantes negros nas instituições públicas de ensino superior, coisa rara há uma década, cuja vigência expira em 2022.

O documento recomenda também a implementação de mecanismos de avaliação perene das políticas de combate ao racismo, criação de um protocolo de promoção da igualdade a ser cumprido por todos os órgãos da administração pública nacional, e o aumento do orçamento para a política de combate ao racismo institucional.

Nas palavras do relator, jurista Silvio Almeida, é necessário pensar a política pública a partir da perspectiva do racismo estrutural e institucional. "O Brasil jamais será um país decente se não enfrentar a questão racial", disse na entrega do documento.

A questão é: O Brasil quer ser um país decente?

 

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