Folha de S. Paulo
Ainda falta dar dose 2 a quase 35 milhões,
o equivalente a três cidades de SP
Em janeiro, faz um ano da primeira
vacinação da campanha contra a Covid no Brasil. A
primeira dose foi para a enfermeira Mônica Calazans.
A gente então meio que ria e meio que chorava de ver o sorrisão da mulher vacinada,
de pensar que era possível vencer a peste. Apesar de tudo, e bota
"tudo" nisso, o SUS mostrou sua conhecida capacidade de vacinar, um
raro motivo de orgulho nacional.
Depois de muito combate contra a criatura do inferno que ocupa o poder e suas falanges de demônios, conseguimos vacinas bastantes. Agora dá certa tristeza de ver que elas sobram.
Falta
dar a segunda dose para 34,9 milhões de pessoas com 12 anos ou mais,
aquelas que ora podem tomar a vacina, pois o coisa ruim quer negar o remédio às
crianças. É quase a população do Canadá. É metade da população da França ou do
Reino Unido.
No Brasil, pouco mais de 80% dos maiores de
12 anos já tomaram a segunda injeção. Não é pouco. Mas não basta. Os números americanos
indicam que a variante ômicron consegue driblar as defesas dos vacinados,
embora seja muitíssimo menos letal entre quem se imunizou do que entre aqueles
sem vacina.
O ritmo de vacinação com a dose 2 caiu. Em
parte, é compreensível. Há agora muito mais gente vacinada do que não vacinada.
A redução do número de mortes induz algum relaxamento. A criatura das trevas
continua sua campanha
contra a vacinação. Ainda assim.
Em dezembro, até dia 29, a média diária de
aplicação de dose 2 ou única caiu para 324,5 mil injeções por dia. Em novembro,
eram 600 mil por dia. Em setembro, 962 mil.
Em dezembro, a média de aplicação de doses
de reforço foi maior que a de dose 2 ou única: 327,6 mil por dia. Mesmo com
essa rapidez relativa, menos de 15% dos maiores de 12 anos já tomaram a dose de
reforço.
Precisamos de uma campanha nacional
estridente para levar os invacinados para os postos de saúde: propaganda e
"busca ativa" daqueles com vacinação incompleta (procurar em casa
quem não tomou a dose 2). "Leve seus parentes para o ‘postinho’"
("postinho", como ouço tanta gente chamar as unidades básicas de
saúde). Leve seu amigo, seu vizinho, seu colega de trabalho.
Mas há relativo silêncio no país, fora o
barulho do capeta antivacina que ocupa a cadeira de presidente da República.
Herodes Bolsonaro e seu capacho da Saúde atrasam o quanto podem a vacinação das
crianças de 5 a 11 anos, cerca de 20,5 milhões de pessoas. Com um pouco de boa
vontade, seria possível dar a primeira dose para meninas e meninos em 50 dias,
por aí. Em março, quase todas as crianças poderiam ter completado a imunização.
No meio do caminho dessa campanha pela
vida, cada vez menos crianças estariam carregando o vírus por aí, quase sempre
sem sintoma algum. Seria uma proteção extra para mães, pais, avós e para quem
cuide de crianças. A rede de infecções teria mais uma barreira, haveria menos
sofrimento e mortes em geral.
Talvez já seja tarde para que a vacinação
extra contenha o impacto da ômicron, que pode ser muito intenso e breve, como
diz a África do Sul. Mas é difícil saber; cada região tem sua epidemia
particular.
Enfim, na dúvida, evite-se a proliferação
de coronavírus; limite-se o risco de que essa coisa se transforme em variante
psi, tau ou chi.
Na falta de governo federal, os estados
poderiam coordenar uma campanha nacional. As criaturas do inferno fazem as
suas: a cruzada contra a vacinação das crianças, o tipo no ministério da
Educação que quer banir a exigência de vacina nas universidades, deputados
bolsonaristas que querem impedir a obrigação de máscaras para crianças nas
escolas.
Este jornalista volta a escrever no dia 9.
Que o ano novo acabe bem para as pessoas de boa vontade. O meio do caminho vai
ser uma pedra.
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