O Globo / O Estado de S. Paulo
O
Brasil nunca elegeu um extremista para a Presidência — até que aconteceu, em
2018. A não ser que algo de muito improvável ocorra, pela primeira vez desde o
início da reeleição, o ocupante do terceiro andar do Planalto não ganhará um
segundo mandato. Não importa o vencedor, por si só já é uma boa notícia. Não há
muito o que desejar para 2022. Teremos a mais agressiva eleição presidencial da
Nova República. Derrotado, com ainda dois meses de mandato, não podemos esperar
civilidade de Jair Bolsonaro. Mas podemos sonhar com 2023. Meu desejo para o
Brasil é que a esquerda encare enfim uma de suas maiores contradições. É gostar
de empresário grande, mas ter horror a empreendedores.
Para sair do buraco em que nos metemos faz uma década, precisaremos muito de novas ideias.
O
Brasil está em 80° lugar no ranking de competitividade global de talentos. Não
é que não tenhamos cérebros qualificados. É que eles estão fugindo para o
exterior. Um governo de esquerda não teria dificuldade de investir em
universidades e, portanto, reter nossas melhores cabeças. Só que conhecimento
vira riqueza quando negócios são criados a partir dele. E empreender é nosso
fraco. Somos o 124º país do mundo em facilidade para fazer negócios, de acordo
com a OCDE.
Políticas
econômicas defendidas pela esquerda despejam dinheiro para turbinar empresas
gigantes. Se é para grandes empresários, aqueles mais afeitos aos corredores
palacianos que aos debates sobre inovação, aí os preconceitos desaparecem. A
contradição parte de uma incompreensão. A esquerda acha que um bom negócio
nasce da força bruta do dinheiro despejado, não do capital humano, das ideias e
capacidades de quem o ergue.
Quem
sofre mesmo com as dificuldades de erguer um negócio no Brasil é quem está na periferia.
É quem tem um diploma, uma ideia estupenda nascida da ciência, mas não os
contatos. Quem sofre é quem está muito distante de Brasília e excessivamente
preocupado em construir.
O
problema é o seguinte: noutros tempos, quando as regras que valiam eram as da
Era Industrial, a política de jogar dinheiro público em quantidade para
construir do zero um setor até funcionava. Às vezes. Mas o principal caminho
para o Brasil encontrar seu lugar no século será pela economia verde. Esse é um
setor novo, e nele as regras ainda não estão dadas. Que tecnologias serão
revolucionárias? Não sabemos. Em que áreas encontraremos nossas maiores
vocações? Temos pistas, mas nenhuma precisão. O método para o século XXI, este
em que o futuro é incerto, é o do Vale do Silício.
Produz-se
conhecimento e se cria um ambiente onde abrir e fechar empresa é muito, muito
fácil. Onde pequenos financiamentos para testar modelos são estimulados com a
consciência de que, para cada cem apostas, 90 darão errado, oito serão empresas
bacanas, e duas se tornarão extraordinárias.
No
Vale, parte-se de gente com ph.D. ou de quem trocou o título pelo negócio. Mas,
nas periferias brasileiras, também fervilham ideias que podem movimentar outros
setores, como a economia criativa.
O Estado deve estar presente em políticas sociais. Por aqui, é fundamental que esteja. Mas, caso se livre de preconceitos e compreenda que não precisa controlar cada passo da sociedade, a esquerda descobrirá que nossa criatividade não se limita aos esportes e às artes. Basta deixar o brasileiro tentar, errar — acertar. Todos nos beneficiaremos do PIB criado.
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