Valor Econômico
Com morte da Lava- Jato, velha guarda quer
voltar a Brasília
No primeiro episódio do podcast “Minuto
Roraima”, você fica sabendo como milhares de pessoas que trabalharam nos
ex-territórios de Roraima, Rondônia e Amapá foram transformados em servidores
públicos federais. Na sequência, conhece a história da Polícia Militar do
Estado, e de como uma lei aprovada pelo Congresso em 2016 equiparou seus soldos
com os do Distrito Federal, os maiores do país. No último programa, são
apresentadas as políticas sociais e de transferência de renda da prefeitura da
capital, Boa Vista.
O apresentador do podcast se diz responsável por todas essas benesses. Sumido dos holofotes desde o final de 2018, ele ressurge com a imagem renovada, tentando explorar as mídias modernas (está também no YouTube e nas principais redes sociais). Até o famoso bigode foi abandonado.
A audiência de Romero Jucá ainda é baixa,
mas o movimento é claro. O “resolvedor-geral da República” quer voltar ao
Senado, para a cadeira que ocupou de 1995 a 2018 - quando terminou as eleições
num humilhante terceiro lugar, atrás de Chico Rodrigues (aquele do dinheiro no
feofó) e do ex-deputado estadual Mecias de Jesus.
2018 foi um ano duro para os políticos
tradicionais. Uma onda de indignação popular começou a se formar com os
protestos de 2013, ganhou impulso com o impeachment de Dilma Rousseff e se transformou
num tsunami com a Operação Lava-Jato. A então chamada “velha política” foi
dizimada nas urnas.
Os índices de reeleição ou de obtenção de
um novo cargo em 2018 foram os mais baixos do passado recente: apenas 58,3%
entre os deputados e míseros 28,6% no caso dos senadores - e olha que eram duas
vagas em disputa naquele ano.
Jucá, portanto, não caiu do cavalo sozinho.
Outros nomes relevantes da política brasileira também ficaram sem mandatos, de
todas as correntes ideológicas, envolvidos ou não em processos criminais. Jorge
Viana, Lindbergh Farias, Delcídio do Amaral, Vanessa Grazziotin, Cristovam
Buarque, João Capiberibe, Edison Lobão, Eunício Oliveira, Garibaldi Alves,
Armando Monteiro, Magno Malta, Roberto Requião, Ricardo Ferraço, Valdir Raupp -
para ficar só no “alto clero” do Senado de então.
Na Câmara, a lista de quem ficou a ver
navios também é longa, com muitas figuras que ocupavam os cadernos de política
dos jornais (e alguns deles também as páginas policiais): José Carlos Aleluia,
Benito Gama, Mendonça Filho, Carlos Melles, Cristiane Brasil, Alberto Fraga,
Heráclito Fortes, Antônio Imbassahy, Janete Capiberibe, Lúcio Vieira Lima,
Leonardo Picciani, Luiz Carlos Hauly, Marco Maia, Marcos Pestana, Osmar
Serraglio, Paes Landim, Saraiva Felipe, Ronaldo Lessa, Sarney Filho e Zeca do
PT, entre outros.
À época, a carreira de muitos desses
políticos foi dada como encerrada. Passados quatro anos, aparentemente a maré
virou.
Com a morte da Lava-Jato, dezenas de
condenações foram extintas. A decisão do STF de transferir processos de
corrupção para a Justiça Eleitoral, menos estruturada do que a Federal, atrasou
investigações. E a nova Lei de Impunidade, ops!, de Improbidade Administrativa
também vai ajudar a limpar a ficha de muita gente.
Afora esse processo de recuperação judicial
de biografias políticas, as condições da competição eleitoral deste ano também
favorecem o retorno de velhas raposas.
De um lado, o caótico governo Bolsonaro
sinalizou ao eleitorado que esse papo de “nova política” pode não ser tão
positivo assim.
Além disso, os partidos chegam a 2022
turbinados com R$ 6 bilhões dos fundos partidário e eleitoral. Esse volume
inédito de dinheiro público para fazer campanha é controlado pelos diretórios
dos partidos - e essa velha guarda, mesmo sem cargos, ainda tem muita
influência em seus redutos eleitorais.
Livres dos processos judiciais e com
fartura de recursos para gastar, muitos conseguirão voltar a Brasília - e
ditarão as condições de governabilidade do próximo presidente da República.
Para o bem ou para o mal, seja quem for
ocupar o Palácio do Planalto a partir de 01/01/2023, é bom ir se preparando
para negociar com um Congresso com menos novatos e mais “políticos
tradicionais”.
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Bolsonaro editou na semana passada o
Decreto nº 10.948/2022, abrindo um escritório do Ministério da Economia em
Washington. O cargo já tem dono: Carlos da Costa, fiel escudeiro de Paulo
Guedes desde os tempos do mercado financeiro.
A nomeação marca o início da temporada da
distribuição de boquinhas que acontece todo final de mandato - quando
presidentes e ministros premiam seus apoiadores mais fiéis com temporadas no
exterior à custa do contribuinte.
Atualmente existem 86 postos de adidos e
auxiliares militares, 28 adidos agrícolas e 4 adidos tributários, além de
dezenas de representações em organismos internacionais; todos com funções pouco
claras e quase nenhuma prestação de contas do trabalho exercido.
Num país que já tem um corpo diplomático
muito bem selecionado, capacitado e remunerado para tratar de questões
econômicas, geopolíticas e comerciais, essas sinecuras para os mais chegados
deveriam ser extintas, não ampliadas.
*Bruno Carazza é mestre em economia e doutor em direito, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”.
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